Um juiz do Distrito Federal e uma juíza do Rio de Janeiro concederam liminares nesta quinta-feira para suspender a posse do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na chefia da Casa Civil, em uma nova reviravolta da turbulenta crise que ameaça o mandato da presidente Dilma Rousseff.
No mesmo dia e ao final de uma semana de grande turbulência
política no País, deputados aprovaram a comissão para analisar o processo de
impeachment contra Dilma, acusada pela oposição de ter maquiado contas públicas
em 2014, quando foi reeleita, e no começo de 2015.
Lula chegou a tomar posse em uma cerimônia com clima de
comício, na qual sua sucessora denunciou manobras golpistas. Mas pouco depois,
o juiz Itagiba Catta Preta, do Distrito Federal, concedeu liminar que suspendeu
a posse de Lula para evitar que o ex-presidente (2003-2010) obtivesse foro
privilegiado por sua condição de ministro.
"A posse e exercício do cargo podem ensejar
intervenção, indevida e odiosa na atividade policial, do Ministério Público e
mesmo no exercício do Poder Judiciário, pelo Senhor Luiz Inácio Lula da
Silva", explica o juiz de primeira instância em sua decisão, que ainda
deve ser revista por instâncias superiores. Desta forma, Lula escaparia da
alçada do juiz Sérgio Moro, que investiga o esquema de corrupção na Petrobras.
O advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, apelou da
decisão do juiz. "Não existe demonstração de lesividade em ação e não
existe desvio de poder ou finalidade. O alegado é que a razão da prática do ato
seria a possibilidade de Lula evitar julgamento da Lava Jato, mas a nomeação
não é tentativa de Lula se furtar a uma investigação. O governante nomeia para
um cargo de confiança a pessoa que pode contribuir para o seu governo",
afirmou Cardozo, ex-ministro da Justiça de Dilma.
Mais tarde, a liminar foi derrubada pelo presidente do
Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), Cândido Ribeiro, atendendo ao
pedido da AGU.
Porém, na noite desta quinta-feira (17), a juíza Regina
Formisano, do Rio de Janeiro, concedeu nova liminar para suspender a posse de
Lula.
Manifestações contra o governo voltaram a tomar as ruas em
São Paulo, Brasília e outras cidades.
"A gritaria dos golpistas não vai me tirar do rumo, nem
vai por de joelhos nosso povo", disse a presidente no Palácio do Planalto,
enquanto do lado de fora, a polícia se interpunha entre defensores e críticos
do governo.
"Não vai ter golpe! Não vai ter golpe!" - repetiam
os presentes ao ato dentro e fora do prédio.
Investigado por ocultação de patrimônio, falsidade ideológica
e lavagem de dinheiro no esquema de fraude da Petrobras, Lula deixou a sala sem
dar declarações.
Bala de prata... de festim?
A entrada de Lula no governo é considerada por analistas
como o último recurso de Dilma para evitar a queda do governo via impeachment,
uma ferramenta que muitos legisladores consideram a saída institucional mais
rápida para a crise.
Uma severa recessão econômica sem saída visível e as
revelações da fraude envolvendo empresários e políticos que custaram mais de
US$ 2 bilhões à Petrobras foram minando a coalizão do governo comandada pelo
PT.
Nesta tarde, a Câmara dos Deputados aprovou a comissão
especial de 65 deputados, encarregada de analisar o processo de impeachment da
presidente e submetê-lo ao plenário da Casa.
Se dois terços dos deputados (342 de um total de 513)
votarem pelo julgamento contra Dilma, o processo seguirá para o Senado. Caso
contrário, será arquivado.
Na Câmara alta, serão necessários dois terços dos votos dos
senadores (54 sobre 81) para destituir Dilma. Se a maioria não for alcançada, a
presidente retomará imediatamente suas funções.
Recompor a esgarçada aliança partidária que apoia Dilma será
um dos principais objetivos de Lula para frear o processo de impeachment.
"Conto com sua experiência de ex-presidente, com sua
identificação com o povo deste país, com sua incomparável capacidade (...) de
entender este povo e ser entendido e amado por ele", disse Dilma, que
ocupou cargos de ministra - inclusive a de chefe da Casa Civil - nos dois mandatos
de Lula.
Mas o impacto esperado já tinha sido ofuscado na véspera
pela divulgação de um grampo telefônico em que Dilma diz a Lula que envia seu
termo de posse para "usá-lo em caso de necessidade". A fala avivou a
suspeita de que tratou-se de uma manobra para assegurar o foro privilegiado a
Lula.
Executivo versus Judiciário
A divulgação do telefonema de Dilma a Lula mobilizou
milhares de pessoas à noite em várias cidades para pedir a saída da presidente,
uma reivindicação também feita por deputados no Congresso.
As tensões entre a justiça e o poder executivo se
aprofundaram quando Dilma passou à ofensiva e denunciou o vazamento da conversa
telefônica pelo juiz Sérgio Moro.
"Não há justiça quando as garantias constitucionais da
própria presidente da República são violadas", afirmou na quinta-feira uma
Dilma combativa, despertando o entusiasmo dos presentes ao ato em que Lula
permaneceu em silêncio.
O promotor encarregado da equipe que dirige as investigações
da "Operação Lava Jato", Deltan Dallagnol, foi literalmente às ruas
pedir, com microfone em punho, para que se mantenha a independência do
Judiciário: "Todos somos iguais perante a lei".
A crise vertiginosa se refletiu nos mercados. A Bolsa de São
Paulo fechou em alta de 6,6% e o dólar teve queda de 2,38%, a 3,652 reais.
"O mercado está comemorando o fim deste governo",
resumiu André Leite, da TAG Investimentos.
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