A partir da redenção conquistada pela morte e ressurreição de Jesus, os cristãos são chamados, pois, a construir sua unidade, enriquecida pelas diferenças.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte – MG
Cristãos todos, de diferentes confissões, precisam
vivenciar o compromisso com a unidade. Essa é a convocação da Semana de Orações
pela Unidade dos Cristãos, preparação para a festa litúrgica de Pentecostes, 15
de maio. Unidade inscrita no compromisso obediente ao mandato do Senhor Jesus
quando ora ao seu Pai e roga a graça “para que todos sejam um”. Eis o princípio
do Evangelho que exige o envolvimento de cada pessoa que testemunha a fé em
Cristo. A súplica de Jesus precisa balizar a conduta de todos os cristãos, a
partir de sua identidade confessional, na construção da unidade. Para além de
qualquer pretensão de uniformidade, o objetivo é fazer valer a força dos
valores do Evangelho nos norteamentos da história e nos rumos novos que a
sociedade precisa trilhar.
A busca dessa unidade foi um dos objetivos centrais do
Concílio Vaticano II. Ainda incomoda muito constatar que os princípios cristãos
ainda não livraram a sociedade dos esquemas de corrupção, dos desmazelos sociais
e das indiferenças que comprometem a paz. Essa realidade é uma vergonha para
quem crê em Jesus, pois os processos de transformação social e político
precisam ser fecundados pela força da fé. Falta a consciência clara de que se
está caminhando para o Reino definitivo. A unidade dos cristãos como força de
articulação que pode colaborar nessa caminhada, pela singularidade dos valores
do Evangelho, é uma meta que, lamentavelmente, ainda não conquistou a
necessária mobilização. Isso pode ser percebido quando se observa a
participação das pessoas nos momentos que integram a programação proposta pela
Semana de Orações pela Unidade dos Cristãos. Poucas confissões religiosas se
interessam e colaboram.
Na contramão desse caminho, o tecido cristão subjacente
na sociedade brasileira vai recebendo matizes e direcionamentos que se
distanciam do sentido e do compromisso da unidade. Está se verificando um
fenômeno que urge a atenção do Estado, com seus governantes, bem como das
Igrejas, com seus líderes, no sentido de parar um preocupante processo de
deterioração da essencialidade do viver cristão. A fé cristã pode contribuir de
maneira determinante e transformadora para o bem da sociedade. Porém, é uma
aberração fazer da fé uma prática para sustentar partidarismos, bancadas nos
âmbitos parlamentares, apoios em troca de interesses específicos, sombreando o
horizonte de uma política que busca, acima de tudo, o bem comum.
Não menos preocupante é a realidade que se configura com
a facilidade para se autodenominar “igreja cristã” e, assim, conseguir isenções
de taxas e impostos, almejando negócios e enriquecimento ilícito. Esse problema
merece atenção das confissões religiosas cristãs, particularmente pede a
abertura para se rever os tratamentos recebidos, em razão de legislações que
favorecem também práticas na contramão do bem comum. A força que impulsiona a
construção e a vivência da unidade dos cristãos deve ser cultivada a partir da
autenticidade e da coerência no âmbito das práticas religiosas, sem medo, sem
proselitismos, sem disputa para arrebanhar mais gente. Assim, os cristãos, em
unidade, poderão enfrentar problemas, a exemplo do que incide sobre a população
jovem, cada vez mais indiferente em relação à vivência da religiosidade. É
oportuno lembrar que a construção de um caminho sem o horizonte dos valores e
princípios cristãos reforça o ciclo de crises existenciais e sociopolíticas.
Também não se pode deixar de pensar na urgência do fortalecimento do tecido da
unidade entre os cristãos para que todos possam melhor cuidar da “casa comum”.
Essa tarefa, é verdade, envolve prioritariamente as
instâncias governamentais e os detentores do poder de decisão. As autoridades
que representam o povo precisam trabalhar para deter as desarvoradas ganâncias
que levam a um desenvolvimento questionável. Mas os cristãos todos também têm
um insubstituível compromisso com a “casa comum”. Pela força da fidelidade ao
Evangelho, devem cultivar hábitos novos, participação cidadã qualificada e,
assim, colaborar na reconstrução da sociedade.
Diante da obra da Criação, a partir da redenção
conquistada pela morte e ressurreição de Jesus, os cristãos são chamados, pois,
a construir sua unidade, enriquecida pelas diferenças. Assim, poderão
protagonizar a cidadania, com o perfil próprio de quem crê em Cristo, dando as
mãos em torno de programas e projetos que balizem o caminho da sociedade sempre
no horizonte da verdade, da justiça e da solidariedade. A Semana de Orações
pela Unidade dos Cristãos, embora tão frágil em publicidade e em participação das
igrejas, das várias confissões denominadas cristãs, é um broto de esperança.
Trata-se de alerta que mostra a importância dos cristãos se unirem para
defender a vida. Deixar para depois o momento dessa união pode ser prenúncio de
um futuro triste, conforme sinaliza significativa parte da juventude de hoje,
indiferente à fonte inesgotável de vida plena: o Evangelho de Jesus Cristo. Que
a Semana de Orações pela Unidade dos Cristãos contribua para que todos, como
discípulos de Jesus, caminhem de mãos unidas.
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