Rubens Valente
Brasília - Portal Uol
Um dos executivos da Camargo Corrêa que fez acordo de
delação premiada na Operação Lava Jato, Luiz Carlos Martins, afirmou que a
empreiteira usou uma microempresa sediada em Santana de Parnaíba (SP) para
pagar R$ 2 milhões ao senador Edison Lobão (PMDB-MA).
O depoimento foi prestado em março à Polícia Federal, em
Brasília, por ordem do STF (Supremo Tribunal Federal).
O pagamento, segundo Martins, estava relacionado à
construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, no Pará. Conforme o delator,
que foi diretor da Camargo, o repasse foi feito porque Lobão "teria
ajudado a montar os consórcios e para que ele não impusesse obstáculos ao
andamento da obra".
O depoimento consta de inquérito aberto em março pelo
ministro do STF Edson Fachin como um desdobramento da Lava Jato a pedido da
Procuradoria-Geral da República.
Em 2015, a Lava Jato já havia colhido a acusação da Camargo,
em delação, de que Lobão havia recebido propina, mas agora a investigação
recebeu os primeiros indícios do "caminho do dinheiro".
Segundo Martins –o que foi confirmado por documentos que a
empreiteira entregou à PF–, os pagamentos da Camargo para a AP Energy
Engenharia e Montagem ocorreram entre 2011 e 2012, quando Lobão era o ministro
de Minas e Energia no primeiro mandato de Dilma Rousseff.
Os serviços da AP eram "fictícios" e nunca foram
prestados, disse o delator. As notas fiscais indicam pagamentos de R$ 1,22
milhão e R$ 1,26 milhão. Cerca de R$ 583 mil ficaram com os responsáveis da AP
a título de "comissão" pelo trabalho de intermediação dos repasses,
segundo o delator.
Em fevereiro de 2011, a Norte Energia, concessionária de
Belo Monte, assinou o contrato com um consórcio de dez empreiteiras para a
realização das obras da hidrelétrica. A Andrade Gutierrez assumiu a liderança
do consórcio, com 18% das ações, seguida por Camargo e Odebrecht, com 16% cada
uma.
Martins foi escolhido pela Camargo para ser o representante
da empresa nas reuniões do conselho do CCBM (Consórcio Construtor de Belo
Monte). No segundo semestre de 2011, segundo Martins, ele ouviu do
representante da Andrade no consórcio, Flávio Barra, que "1%" do
valor total das obras deveria ser pago "em partes iguais para os partidos
PT e PMDB".
As obras estavam estimadas em R$ 13,4 bilhões, o que projeta
uma propina de R$ 134 milhões, valor dividido entre as diversas empreiteiras
envolvidas no projeto. Pelos cálculos de Martins, a cota da Camargo era de R$
21 milhões.
Surgiram, porém, problemas no acerto. O delator disse que
Barra afirmou que "algumas das construtoras não haviam feito o pagamento
devido" e que "o então ministro Lobão estava fazendo a cobrança em
nome do PMDB".
Martins levou o assunto ao seu superior, Dalton Avancini,
que hoje também é delator. Avancini respondeu, segundo o delator, que
"resolveria o problema do PT" e incumbiu Martins de "resolver o
problema do PMDB".
Martins declarou que, embora "não se conformasse"
com a cobrança, passou a tratar de encontrar "um caminho" para o
envio do dinheiro. Segundo ele, "a remessa de valores ao Maranhão ficou ao
encargo da AP Energy ou de outras empresas ligadas a ela ou até mesmo de seus
sócios". O delator não soube dar detalhes de como o dinheiro teria chegado
a Lobão, mas afirmou ter "a convicção" de que houve a entrega porque
"cessaram as cobranças".
Barra, o executivo da Andrade, também fechou delação. A
Folha apurou que ele prestou, em março, um longo depoimento sobre Belo Monte,
ainda sob sigilo.
OUTRO LADO
O advogado do senador Edison Lobão (PMDB-MA), Antonio Carlos
de Almeida Castro, o Kakay, afirmou que seu cliente "não conhece a empresa
AP Energy nem os sócios dela".
"Só isso já demonstra a completa mentira e
irresponsabilidade da delação. É lamentável que as palavras dos delatores
tenham foro de verdade, pois no caso concreto são absolutamente falsas",
afirmou Kakay.
Localizado por telefone pela Folha nesta quinta-feira (9),
um dos sócios proprietários da AP, Fernando Mendes Brito, afirmou que não se
recordava do pagamento total de R$ 2,5 milhões recebido pela sua empresa, entre
2011 e 2012, da Camargo Corrêa.
Brito primeiro afirmou que já trabalhou com a Camargo Corrêa,
"mas em coisas pequenas". "Esse valor que o senhor falou,
sinceramente, desconheço totalmente." Minutos depois, porém, entrou em
contradição: "Nunca trabalhei com a Camargo Corrêa, nunca com eles".
Brito disse que a AP está desativada "há alguns anos"
e que não conhece o senador Edison Lobão. "Nem sei quem é,
sinceramente", disse.
Ele afirmou que iria procurar seu advogado, que entraria em
contato com a Folha, mas isso não havia ocorrido até a conclusão desta edição.
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