Sebastião Nery
SÃO PAULO – Em 1953, Getúlio Vargas era presidente da
República. Jânio Quadros prefeito de São Paulo, Carvalho Pinto secretário da
Fazenda de São Paulo, Coriolano Góes diretor geral da Cexim (Carteira de
Exportação e Importação do Banco do Brasil).
Uma tarde, aparecem no gabinete do diretor da Cexim, no
Rio, Jânio Quadros e Carvalho Pinto. Precisavam de uma audiência urgente para
uma licença especial do governo federal para importar da Alemanha peças para os
ônibus da CMTC, a empresa municipal de ônibus. O chefe de gabinete, Virgilio de
Góes, filho do diretor, lhes diz que o pai não costumava receber ninguém à
tarde, mas que, evidentemente, tratando-se do prefeito de São Paulo, a exceção
era normal.
Jânio entrou no gabinete, ficou duas horas, saiu
sorrindo, chamou Virgílio, pegou-lhe as duas mãos, encostou-as ao peito,
entortou os olhos, revirou os ombros, dobrou as canelas e lhe disse
pateticamente:
– Meu jovem, devo-lhe a salvação da CMTC.
– Nada disso, prefeito. É apenas dever do governo federal
ajudar a Prefeitura de São Paulo.
– Quero que me diga, qualquer dia em que precisar de
alguma coisa, o que deseja, fa-lo-ei imediatamente.
– Muito obrigado.
Janio foi saindo, voltou-se sobre os calcanhares
retorcidos:
– Aliás, nem precisa telefonar. Pense, apenas pense, que
eu atenderei.
E sumiu.
Hoje já não se fazem Janios como antigamente. Prefeitos e
governadores estão em tais dificuldades que vivem de pires na mão pedindo
socorro ao governo federal, que, também no sufoco, não pode atender.
A CRISE
Administrar a folha de pagamento dos Estados vem sendo a
prioridade dos atuais governadores. A crise estrutural nas finanças públicas
estaduais tornou-se um drama nacional. O desequilíbrio fiscal, que atingiu
níveis recordes na estrutura do governo federal, estende-se praticamente a
todas as unidades federativas. O ciclo de endividamento atingiu o máximo,
agravado pelo populismo do mundo político. Os programas fantasias das
administrações estaduais não resistem mais à realidade.
Acrescente-se o indiscutível despreparo público de vários
governadores. Boa parte está mais preocupada com o seu destino e não com a
população que representam. Em vez de sanearem as contas públicas, enfrentando
os desafios fundamentais para o futuro, preferem o caminho fácil da propaganda
mistificadora. O Estado do Rio é um exemplo de deterioração das finanças
públicas.
E o mais grave, embora não o único:o pagamento de
salários e aposentadorias vem sendo um drama. A origem está na correção das
remunerações maiores do que a capacidade de arrecadação estadual, agravada com
o endividamento dos Estados, tendo o Tesouro nacional como avalista de
financiamentos, em desacordo com a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Governos populistas e submetidos às corporações (a
exemplo do que ocorria no governo federal) adotaram a irresponsável
contabilidade criativa. Agora estão colhendo o fruto.
BRASILIA
O governador Rodrigo Rollemberg, de Brasília, constatatou
que 77% do orçamento é gasto com pessoal e inativos. Eleito pelo PSB, o partido
dos socialistas, em uma coligação de esquerda, ele diz que é fundamental uma
nova esquerda enfrentar o corporativismo dos sindicatos de uma velha esquerda.
Ao assumir o governo, reduziu de 38 para 19 o número de secretarias e cortou 5
mil cargos de livre provimento:
-“O corporativismo está contribuindo para amplificar e
aprofundar as desigualdades sociais. Quando o Estado perde a capacidade de
fazer investimentos nas áreas de infraestrutura, porque os recursos estão sendo
drenados para o pagamento de salários, estamos aprofundando um cenário de
desigualdade social”.
Hoje o déficit dos regimes próprios estaduais está por volta
de R$ 64 bilhões, podendo em 2020 atingir os R$ 101 bilhões. Nos Estados existe
1.440 milhão de servidores aposentados e mais 490 mil pensionistas. Já os
servidores ativos são 2,6 milhões, equivalendo a diferença dos ativos e
inativos a uma proporção insustentável.
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