Silvia Caetano
Lisboa - A arquiteta e urbanista Ana Pinho, Secretaria de
Estado da Habitação em Portugal, que chegou ao governo em 2017 e que quase ninguém conhecia, foi capaz de,
em apenas nove meses, montar um programa destinado a resolver o problema da
falta de moradia para a população que vem sendo expulsa dos centros da cidades
pelo turismo descontrolado e para os sem
abrigo nas capitais e no interior.
Idéias simples que podem resolver questões complexas. Uma
iniciativa que valeria a pena ser implantada no Brasil, possivelmente, custaria
menos do que a construção de novas moradias do programa Minha Casa Minha Vida,
com vantagens para os mais pobres. Poderiam ter a oportunidade de residir nas
áreas mais centrais das cidades e não no fim de mundo, penando horas em ônibus
caindo aos pedaços, entre sua casa e o trabalho, como é a regra brasileira.
Especialistas no assunto já analisaram os custos das
casas do Programa Minha Casa Minha Vida,
a maioria na periferias das metrópoles,
e concluíram ser mais barato edificá-las em áreas com infra-estrutura existente.
Como nesses locais ermos não há rodovias, saneamento básico, eletricidade,
esgoto, telefonia, escolas, transporte, mercados e demais equipamentos urbanos
indispensáveis ao bem estar das pessoas, em alguns casos, seria mais barato
instalá-las na Avenida Paulista. Mas essa possibilidade, é claro, nem passa
pela cabeça dos nossos dirigentes políticos. Melhor manter os pobres à
distância.
Lisboa |
A idéia de Ana Pinho poderia reduzir o tremendo problema
habitacional brasileiro, colaborando ainda para evitar tragédias como a que
acaba de acontecer em São Paulo. Não adianta agora apontar o dedo aos
movimentos A ou B pela exploração de imóveis desocupados para alojar
desabrigados. A Responsabilidade é do Governo e, quando o Estado não cumpre
suas obrigações constitucionais, abre espaço aos cambistas do gênero que
cobravam 400 reais de aluguel mensal dos
infelizes por um cubículo indigno de qualquer ser humano.
A Secretaria Ana
Pinho realizou levantamento dos imóveis
devolutos do Estado, desocupados e necessitando de reformas. Sob sua
inspiração, foi criado programa intitulado “Nova Geração de Políticas de
Habitação”, que poderia ser resumido numa regulação liberal do mercado, através
de um choque fiscal. O governo renuncia à cobrança de parcela dos impostos
devido pelos proprietários de imóveis que, em troca, cobrariam menos pelos
aluguéis de longo prazo. Tornando esses aluguéis financeiramente mais atraentes, o governo
português busca reduzir sua exploração pelos Airbnbs da vida. E fez mais:
oferece aos proprietários seguro para eventuais inadimplências dos novos
inquilinos.
Ana Pinho |
Às vezes, o que parece simples pode ser complexo. Ana Pinho empenhou-se e foi convincente a ponto de convencer o governo, num momento em que sua prioridade é reduzir o déficit público, a renunciar a parte da receita fiscal em favor dos mais desfavorecidos. Algumas pessoas julgam que, no momento, quando o país ainda não se recuperou da crise, esse considerado equivocadamente gasto, não é a melhor estratégia. Mas a iniciativa da Secretaria de Habitação deve ser vista como investimento, que somente bons retorno produzirá.
A idéia poderia ser adotada no Brasil, onde são inúmeros os
imóveis oficiais que estão desocupados, abandonados e com risco de desabamento,
como o de 24 andares da Polícia Federal em São Paulo. Se houvesse um programa
como a que acaba de ser adotado em Portugal, a maioria dos problemas
resultantes da falta de residência para todos, um direito constitucional,
poderia ser equacionada e, possivelmente, com menos dinheiro, desde, é claro,
que não haja desvio para corrupção.
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