quinta-feira, 3 de maio de 2018

IDÉIAS SIMPLES PARA PROBLEMAS COMPLEXOS


Silvia Caetano


Lisboa - A arquiteta e urbanista Ana Pinho, Secretaria de Estado da Habitação em Portugal, que chegou ao governo em 2017  e que quase ninguém conhecia, foi capaz de, em apenas nove meses, montar um programa destinado a resolver o problema da falta de moradia para a população que vem sendo expulsa dos centros da cidades pelo turismo descontrolado e para  os sem abrigo nas capitais e  no interior.

Idéias simples que podem resolver questões complexas. Uma iniciativa que valeria a pena ser implantada no Brasil, possivelmente, custaria menos do que a construção de novas moradias do programa Minha Casa Minha Vida, com vantagens para os mais pobres. Poderiam ter a oportunidade de residir nas áreas mais centrais das cidades e não no fim de mundo, penando horas em ônibus caindo aos pedaços, entre sua casa e o trabalho, como é a regra brasileira.

Especialistas no assunto já analisaram os custos das casas  do Programa Minha Casa Minha Vida, a maioria  na periferias das metrópoles, e concluíram ser mais barato edificá-las em áreas com infra-estrutura existente. Como nesses locais ermos não há rodovias, saneamento básico, eletricidade, esgoto, telefonia, escolas, transporte, mercados e demais equipamentos urbanos indispensáveis ao bem estar das pessoas, em alguns casos, seria mais barato instalá-las na Avenida Paulista. Mas essa possibilidade, é claro, nem passa pela cabeça dos nossos dirigentes políticos. Melhor manter os pobres à distância.


Lisboa
A idéia de Ana Pinho poderia reduzir o tremendo problema habitacional brasileiro, colaborando ainda para evitar tragédias como a que acaba de acontecer em São Paulo. Não adianta agora apontar o dedo aos movimentos A ou B pela exploração de imóveis desocupados para alojar desabrigados. A Responsabilidade é do Governo e, quando o Estado não cumpre suas obrigações constitucionais, abre espaço aos cambistas do gênero que cobravam  400 reais de aluguel mensal dos infelizes por um cubículo indigno de qualquer ser humano.

A Secretaria Ana Pinho realizou levantamento dos  imóveis devolutos do Estado, desocupados e necessitando de reformas. Sob sua inspiração, foi criado programa intitulado “Nova Geração de Políticas de Habitação”, que poderia ser resumido numa regulação liberal do mercado, através de um choque fiscal. O governo renuncia à cobrança de parcela dos impostos devido pelos proprietários de imóveis que, em troca, cobrariam menos pelos aluguéis de longo prazo. Tornando esses aluguéis  financeiramente mais atraentes, o governo português busca reduzir sua exploração pelos Airbnbs da vida. E fez mais: oferece aos proprietários seguro para eventuais inadimplências dos novos inquilinos.

Ana Pinho
O programa inclui ainda a reabilitação de imóveis devolutos, ou mesmo a edificação de novos em seu local, quando não for possível recuperá-los, para alugá-los com preços praticamente simbólico aos sem teto. Com isso, mata vários coelhos de uma só vez. Aumenta a oferta de casas para os residentes locais, que estão sendo expulsos das suas moradias pelos proprietários que só querem alugá-las aos turistas. Cria residências para quem não possui e incentiva o retorno ao interior, que está ficando deserto em Portugal. Recupera o patrimônio deteriorado do governo, como o edifício do Policia Federal em São Paulo, que desabou deixando mortos e mais desabrigados.

Às vezes, o que parece simples pode ser complexo. Ana Pinho empenhou-se e foi convincente a ponto de convencer o governo, num momento em que sua prioridade é reduzir o déficit público, a renunciar a parte da receita fiscal em favor dos mais desfavorecidos. Algumas pessoas julgam que, no momento, quando o país ainda não se recuperou da crise, esse considerado equivocadamente gasto, não é a melhor estratégia. Mas a iniciativa da Secretaria de Habitação deve ser vista como investimento, que somente bons retorno produzirá. 

A idéia poderia ser adotada no Brasil, onde são inúmeros os imóveis oficiais que estão desocupados, abandonados e com risco de desabamento, como o de 24 andares da Polícia Federal em São Paulo. Se houvesse um programa como a que acaba de ser adotado em Portugal, a maioria dos problemas resultantes da falta de residência para todos, um direito constitucional, poderia ser equacionada e, possivelmente, com menos dinheiro, desde, é claro, que não haja desvio para corrupção.

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