Brasil / RAFAEL GRECA
Prefeito de Curitiba conta uma história emocionante, revelando seu amor verdadeiro pela cidade
Rafael Greca é prefeito da cidade de Curitiba, capital do estado do Paraná.
25/08/2023
Por: Mhario Lincoln / Fonte: Rafael Greca
Do Facetubes
Um pouco da história do Juvevê e do Cabral, contadas por Rafael Greca, para o Jornal do Juvevê em 2012
*Rafael Greca, prefeito de Curitiba, capital do Paraná
Os edifícios atuais do Cabral e do Juvevê foram consumindo a paisagem dos tempos de eu menino. O milagre da memória me recorda o antigo bairro, as casas dos Haupt Groetzner, de José Pereira de Macedo,dos Iwersen, dos Foggiatto, de Fortunatto Lubian, dos Puppi, dos Daros,de Guataçara Borba Carneiro, a residência pré-ecológica telhada de grama de Fani e Jaime Lerner, a casa de dona Sara Hintz Soares Gomes, a casa de meu tios Rosinha e Orlando Greca - ele o médico que me trouxe ao mundo -, a casa de dona Ignez (Fontana) e seu Afonso Tassi, onde foram criadas suas lindas filhas Rosarinho e Maria Angela, a austera casa do bispo dom Geraldo Pellanda, a mansão onde o governador Caetano Munhoz da Rocha viveu. Viúvo duas vezes, muito católico, pai do governador Bento Munhoz da Rocha, Caetano teve 3 esposas, a última, dona Sylvia, ainda conheci.
O nome Juvevê é tão antigo quanto o sagrado nome de nossa amada cidade de Curitiba. Aparece no Termo de Demarcação do Rocio da Vila de Curitiba, datado de 1º de maio de 1693, como um dos limites da nova povoação: " (…) Fica confrontando esse padrão para a parte do noroeste com as nascenças do rio Juvevê e o Capão da Buya. Este local era o bosque no terreno da antiga fábrica de Bolachas Lucinda, hoje parte de um adensado conjunto de apartamentos residenciais.
A notícia das nascentes do rio Juvevê, num capão com imbuias , também aparece nos "Provimentos" do Ouvidor Pardinho, datados de janeiro de 1721. Este Ouvidor Rafael Pires Pardinho era o representando D’El Rey de Portugal em todo o sul do Brasil. Visitou Curitiba para aqui reforçar as leis e implantar a Justiça. Em 1981, encontrei seus manuscritos num precioso livro de pergaminho - documento definitivo da história de Curitiba - jogado dentro de uma caixa de papelão no depósito do elevador do Paço 29 de Março, sede da Prefeitura de Curitiba. Certamente perdido numa mudança de endereço.
O nome Cabral vem do fato destas terras, ao noroeste de Curitiba, terem sido escolhidas para residência da influente família Cabral, que nos meados do século 19, erigiu ali uma pequena capela consagrada ao Bom Jesus da Coluna. A devoção do povo passou a chamar o local de Bom Jesus do Cabral. Isto é referido pelos livros do Tombo da Catedral, pelos registros cartoriais, e pelo historiador Ermelino de Leão no seu Dicionário Histórico e Geográfico do Paraná publicado em 1926. Ali também se lê que "Juvevê é riacho que nasce no bairro do Cabral". O mesmo historiador diz que o nome Juvevê, em língua indígena abanhaem , vem da palavra "Yubebã", que significa "rio do fruto espinhoso".
Os primeiros moradores do Juvevê aparecem nas Cartas de Foro da Câmara Municipal que li no original. Ali um texto de 1745, refere que um João do Couto pediu terras para fazer sua habitação na paragem chamada Jubebê, junto ao sítio do defunto José de Souto…O texto foi redigido pelo escrivão Manoel Borges de S.Payo.
O texto fala numa Estrada da Vila, antigo caminho de traçado coincidente com a Estrada da Graciosa aberta por Gabriel de Lara em 1646, abandonada em 1653, e reaberta por ordens do Ouvidor Pardinho em 1738. Juntos com os caminhos do Itupava e do Arraial, a Graciosa foi a primeira ligação de Curitiba com o Porto de Cima, Morretes, Antonina e Paranaguá. A Graciosa chegou até nossos dias como a trilha das atuais ruas Erasto Gaertner, Munhoz da Rocha, João Gualberto, rua Fontana, Cândido de Abreu, rua do Riachuelo até o Largo da Matriz - hoje praça Tiradentes.
Também em 1860, os livros da Câmara em suas Atas de Vereança guardam registros de pedidos de terra para assentar lavouras no lugar denominado Juvevê, concedidos a José Volt, ao suiço Hanz Jacob Kummer. O crescimento de Curitiba com a imigração européia começava a desenhar o Cabral/Juvevê como um arrabalde - não mais um conjunto de chácaras isoladas na colina da capela Cabral e às margens do riacho.
O Livro do Tombo da Catedral de Curitiba registra a data de 1884 para o erguimento da primitiva Capela do Bom Jesus do Cabral. Ampliada e embelezada pela família de Jarbas Itiberê de Barros, a referida Capela foi consagrada pelo Monsenhor Celso Itiberê da Cunha, no dia 29 de junho de 1901, num animado arraial em honra a São Pedro. O projeto da nova Matriz é de Pedro Maria Bianco, imigrante italiano. Começou em 1914, foi concluído em 1936, a paróquia criada pelo arcebispo D.Ático Euzébio da Rocha, a 15 de dezembro daquele ano. Então a igreja tinha apenas a torre do lado direito.
Em 1955 começou sua ampliação,recomendada aos padres Passionistas pelo arcebispo D.Manuel da Silveira D’Elboux. Todos estes dados estão no importante livro de D.Pedro Fedalto,a Arquidiocese de Curitiba e sua História. Tesouro artístico de Curitiba,o altar mor da igreja do Cabral é entalhado a mão, evangelho em madeira de lei. Foi bento em 1922.
Quando prefeito, busquei revitalizar o bairro com o painel artístico evocativo da Lenda da Gralha Azul, concebido em azulejos por Ida Hanemann de Campos, moldura ao endereço de solidariedade que domina a colina do Cabral, o benemérito Asilo São Vicente de Paulo fundado em 1926 pela freira Antonietta Farani e suas irmãs de caridade. Perto dali faziamos com alegria, a Rua do Natal.
Memórias do bairro, endereços tradicionais geradores de empregos e renda, as antigas Fábricas de Bolachas e Biscoitos Lucinda ( da família Groetzner) e Glória ( da família Vendrametto). Os Acolchoados Michelotto, o Cortume Walter , de Walter Dietrich, Joachim Andrade e Roberto Glasser,a Ferraria de Vitório Gabardo,a Barricaria de João Kalinowski - barricas de pinho eram usadas para exportar erva-mate,a Fábrica de Metros e Correias do austríaco Rodolpho Haltrich.
A Tipographia de Theodoro Locker, a Casa de Pasto - ou restaurante - de João Reboli, o sobrado do Armazém de Secos & Molhados da família Jacó Garib, também o Armazém Milani, o Armazém José Pereira, o Armazém do Bindo, a Mercearia Bonfim, o Armazém Ruppel, o Açougue de Luiz Casagrande,a Padraia de Henrique Piggel, a Farmácia de Afonso Borelli, as sapatarias dos italianos Salvador Palazzo e Galileu Grossi concorriam com a sapataria do árabe Abraão Achcar,e a Barbearia de Tarcísio Borges Pinto - o Zico .
Ele me contou, em fevereiro de 1982, quando escrevi o boletim da Casa Romário Martins sobre o Juvevê, que, em 1932 sua Barbearia, antes de ser da família Borges foi palco de um crime de morte. A vítima, um tal de Ricardo, barbeiro, assassinado pelo ciumento vizinho, o açougueiro Willy Rose que se supunha marido traído pelo "Ricardão do Juvevê".
Notável no bairro, o Hospital São Lucas, prédio modernista traçado pelo arquiteto Villanova Artigas. Quando inaugurou em 1948, fundado pelos médicos Antônio Ribeiro de Camargo, Ruy Santos, e Eugênio Lopes, o São Lucas anunciava-se assim: Cem leitos individuais , rede interna de telefones em todas as dependências. E nos dois extremos do bairro endereços ligados à alegria:
A Fábrica de Pianos Essenfelder, a partir de 1907, fundada pelo prussiano Florian Essenlfelder Senior, o mesmo que trouxe - em 1909- a primeira bola de futebol para Curitiba, criando o Coritiba Foot Ball Club. E, desde 1927, os esplêndidos espaços de estilo normando do Graciosa Country Club, o clube social mais elegante e fechado da cidade. Os atuais gramados de golf já foram as chácaras das famílias Bianco e Balhana.
Termino recordando minhas alegrias no IPPUC, o Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano da nossa cidade, ali instalado pelo prefeito Ivo Arzua em 1965, na casa de Hanz Moeller, gerente do Banco Alemão do Paraná. Na antiga casa que já foi chamada com justiça de a "Sorbonne do Juvevê" aprendi a ser o prefeito que já foi, e o prefeito quero voltar a ser.
Rafael Greca.

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