E agora? Depois do que afirmou ontem o senador Cristovam Buarque, em seu discurso no Senado: O Governo está 'desorientado, quebrado e cínico' -.
Um governo cínico, disse o senador!... O que fazer?
Passo aos leitores do blog uma ampla reportagem da BBC BRASIL sobre o problema.... É um texto longo, sei disso!... Mas leiam:
Três perguntas sobre o déficit no Orçamento federal
Diante da arrecadação em queda e da dificuldade de cortar
gastos e elevar impostos, o governo federal enviou nesta segunda-feira para o
Congresso uma proposta de Orçamento para 2016 que prevê um déficit de R$ 30,5
bilhões.
De acordo com o Ministério do Planejamento, essa é a
primeira vez que o governo planeja um déficit orçamentário desde que a atual
metodologia para contas públicas foi adotada no governo de Fernando Henrique
Cardoso (1995-2002).
A administração Dilma Rousseff tentou contornar essa medida
com a proposta de recriação da CPMF, um imposto sobre transações financeiras.
Sem apoio no Congresso e sob críticas do empresariado, foi obrigada a recuar da
ideia.
Para 2015, a previsão é de pequeno saldo positivo (superavit
primário) de R$ 5,8 bilhões. Em 2014, o resultado ficou vermelho em R$ 32,53
bilhões.
Dois economistas renomados ouvidos pela BBC Brasil
concordaram que a previsão de déficit é ruim, mas defenderam soluções
diferentes para o problema.
Para Paul Singer, economista ligado ao PT e que hoje é
secretário de Economia Solidária do Ministério do Trabalho, a saída é elevar
impostos, evitando assim cortar gastos sociais.
Já Carlos Langoni, ex-presidente do Banco Central
(1983-1985) e atual diretor do Centro de Economia Mundial da FGV, defende que o
governo reduza os gastos.
Entenda melhor abaixo o que significa o déficit anunciado
nesta segunda-feira.
Por que o governo está prevendo déficit no Orçamento?
O governo procura todo ano fazer uma economia para pagar
juros da dívida pública, o chamado superavit primário, com objetivo de evitar
um aumento descontrolado desse débito.
O superavit é o que sobra da diferença entre receitas e
despesas não financeiras, ou seja, essencialmente a arrecadação com tributos
subtraídos os gastos com funcionamento dos serviços públicos (como saúde e
educação), benefícios sociais (Bolsa Família, seguro-desemprego,
aposentadorias), subsídios (com programas como o Minha Casa Minha Vida e os
juros mais baixos do BNDES), investimentos em obras públicas, entre outros.
Na proposta de Orçamento enviada nesta segunda-feira ao
Congresso, o governo prevê que terá receita líquida (receita total menos
transferências para Estados e municípios) de R$ 1,18 trilhão em 2016. Já as despesas
devem somar R$ 1,21 trilhão.
O descompasso é reflexo da dificuldade do governo em evitar
o aumento de gastos num cenário de queda na arrecadação federal devido à
recessão econômica.
Os números divulgados pelo Ministério do Planejamento
indicam que a receita líquida do governo federal recuará de 19% do PIB neste
ano para 18,9% em 2016, enquanto a despesa subirá de 19% do PIB para 19,4%.
Já a previsão para o PIB é de queda de 1,8% nesta ano e de
pequeno crescimento de 0,2% em 2016. O salário mínimo vai subir de R$ 788 para
R$ 865,50 no ano que vem, implicando em aumento de gastos públicos com
aposentadorias pagas pelo INSS.
Diante da queda na arrecadação, o governo teria que cortar
gastou e/ou elevar impostos. Isso já começou a ser feito, mas não tem sido
suficiente para gerar superávit. Como a ampliação dessas medidas é impopular, o
Congresso resiste a aprovar novos cortes de despesas ou aumentos de taxas.
O governo optou, então, por um saída que classificou como
"realista" e assumiu que não será capaz de economizar no próximo ano.
A expectativa era que a volta da CPMF pudesse gerar cerca de
R$ 80 bilhões em receita. Mas após o recuo na recriação da cobrança, o governo
anunciou nesta segunda-feira a elevação de alguns impostos pontuais, que devem
aumentar a arrecadação em R$ 11,2 bilhões em 2016.
"Acho que esse Orçamento com déficit é uma forma de
pressão que o governo está colocando para que o Congresso seja mais generoso e
apoie os cortes de gastos", acredita Langoni.
Para Singer, o ajuste fiscal adotado pelo governo neste ano
acabou agravando a situação na medida em que os cortes de gastos contribuíram
para a recessão econômica. Na sua avaliação, o governo deveria ter feito um
ajuste mais gradual.
"A própria classe dominante que queria esse ajuste
votou completamente contra o governo. Aprovaram projetos que aumentam as
obrigações (gastos). Enfim, ninguém ajudou. Agora vamos ter que aguentar as
consequências", disse.
Por que o déficit preocupa?
A dívida pública é uma dívida que nunca será totalmente paga
– o que os governos de diversos países fazem é gerenciar seus débitos, pagando
seus credores ao mesmo tempo que contraem novas dívidas.
O crescimento da dívida em si não é considerado um problema
por economistas e investidores – o que preocupa é o crescimento da relação
entre a dívida pública e o tamanho da economia, o PIB (Produto Interno Bruto).
Dessa forma, quando a economia está crescendo, a dívida pode
até aumentar em valores nominais e sua proporção em relação ao PIB ficar
estável ou recuar.
Essa relação é importante porque a arrecadação do governo
também costuma variar de acordo com o crescimento do PIB. Dessa forma, se a
economia aumenta, o governo também arrecada valores maiores e, assim, pode
arcar com débitos maiores.
Por exemplo, em julho de 2002, a dívida líquida do setor
público (governos federal, estaduais e municipais) somava R$ 826,2 bilhões e
representava 58,71% do PIB. Treze anos depois, em julho de 2015, essa dívida
cresceu para R$ 1,9 trilhão, mas em proporção ao PIB caiu para 34,2%.*
Um déficit significa que o governo terá que aumentar mais
sua dívida e, como o PIB está diminuindo, haverá um aumento na proporção entre
as duas coisas. Isso eleva a percepção de risco dos investidores, que passam a
cobrar juros mais altos para continuar financiando o Tesouro Nacional.
"O problema é saber se as agências de risco vão tolerar
e aceitar essa realidade de que o ajuste vai ser feito de uma forma muito mais
lenta, moderada e mais gradual do que se imaginava", destaca Langoni.
As agências de classificação de risco dão notas segundo a
expectativa de que o país pague suas dívidas. O Brasil ainda possui grau de
investimento, um selo de bom pagador, mas a deterioração das contas públicas
tem aumentado as chances de que a nota seja reduzida.
Se isso acontecer, o país perde acesso a algumas fontes de
financiamento mais baratas, como fundos que só aplicam em países com grau de
investimento.
Ministros Levy e Barbosa entregam plano de orçamento a Renan
Calheiros, presidente do Senado; para economista ouvido pela BBC Brasil,
"é uma forma de pressão do governo espera que o Congresso apoie os cortes
de gastos".
Qual deve ser o tamanho do Estado?
Por trás do debate do ajuste fiscal, há uma questão de fundo
importante: qual deve ser o tamanho do Estado brasileiro e de sua carga
tributária?
Por um lado, é comum os brasileiros reclamarem que pagam
muitos impostos. De outro lado, há uma demanda na sociedade, que foi
consolidada na Constituição de 1988, por benefícios sociais e serviços públicos
gratuitos de qualidade.
A redução dos impostos implica em ter um Estado menor. Já o
fornecimento de benefícios sociais e serviços públicos exige um Estado maior e,
portanto, uma carga tributária mais alta.
"O governo precisa aumentar os impostos para colocar as
contas públicas em ordem, não vejo outra saída. A não ser que a economia volte
a crescer, mas eu não estou nem um pouco otimista", afirma Singer.
"Não tem onde cortar mais (gastos) a não ser cometendo graves injustiças.
Qualquer coisa que signifique reduzir o gasto social do governo é uma injustiça."
Langoni, por sua vez, acredita no oposto disso. Ele defende
o combate ao desperdício e uma reforma da Previdência que reduza os gastos do
governo com aposentadoria.
"Eu acho que sempre há espaço para cortar. A gente
conhece a ineficiência do Estado brasileiro, em todos os níveis: municipal,
estadual e federal. É lógico que há sim possibilidade de cortes de
gastos", defendeu. "Nós estamos falando de um déficit de R$ 30
bilhões, não é um número absurdo para o tamanho da economia brasileira. É só
procurar que vai achar (onde cortar os R$ 30 bilhões)."
Mas em uma coisa ambos concordam: a situação fiscal está
ruim, mas o Brasil está muito longe de virar uma Grécia. A dívida bruta
brasileira está hoje em 65% do PIB, enquanto a grega supera 160%.**
O problema, nota Singer, é que o Brasil paga juros muito
altos - e a taxa básica Selic vem sendo elevada ainda mais para tentar conter a
inflação.
"Não há comparação do problema fiscal brasileiro com o
problema enfrentado em alguns países europeus nos últimos anos. Mas quanto mais
a gente adia a hora de enfrentar esse problema, maior o custo econômico e
social", argumenta Langoni.
*Esses valores disponibilizados pelo Banco Central são
correntes, ou seja não são atualizados pela inflação. Isso vale tanto para o
valor da dívida quanto para o valor do PIB usado no cálculo.
**A dívida líquida é a diferença entre os débitos e os
investimentos do setor público, enquanto a dívida bruta (indicador mais usado
para comparações internacionais) é o valor total da dívida.
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