Doris Madeira Gandres
“Você consegue saber se um homem é inteligente pelas suas
respostas. Você consegue saber se um homem é sábio pelas suas perguntas”.
Naguib Mahfuz (Prêmio Nobel de Literatura de 1988)
Todo espírita sabe que o mês de outubro, no Movimento
Espírita em geral, é dedicado à memória e homenagens a Allan Kardec. Todos de
certa forma conhecem sua biografia, muitas já foram publicadas. Mas quantos de
nós sabemos efetivamente quem é esse Espírito, quantos de nós compreendemos sua
estatura espiritual, condição essa que o fez portador da missão de elaborar e
estabelecer aqui no nosso mundo a Doutrina Espírita, trazendo uma nova visão da
realidade material, intelectual e moral?
Já sabemos, também, ser um espírito há milênios
vivenciando experiências cada vez mais nobres e compromissadas com ideais de
justiça e amor ao próximo, que trouxe para essa reencarnação uma bagagem de
conhecimentos intelectuais e morais de sorte a lhe permitir dar cumprimento à
missão que lhe fora destinada. Temos em Obras Póstumas as mensagens de
Espíritos Superiores e do Espírito Verdade comprovando sua capacidade.
Hippolyte Léon teve uma infância difícil, ficando órfão
aos 3 anos; aos 9 anos foi encaminhado à Suíça, para estudar na escola de
Pestalozzi, iniciador da pedagogia moderna, que preconiza educação para todos,
com aprendizagem estimulante dirigida sobretudo à razão e uma atitude de
pesquisa diante do Universo, buscando transcender à mera realização terrena.
Percebe-se nessa programação reencarnatória, evidentemente vinculada aos
efeitos do livre-arbítrio dos envolvidos, a preparação de Hippolyte para a
independência e o senso humanista que lhe seriam necessários para o cumprimento
de sua missão.
Naturalmente, de retorno à França, vem a se tornar
professor. E, em 1828, com 24 anos apenas, apresenta um Plano para a Melhoria
da Educação Pública, aceito e implantado; em seu discurso nesse ato, o
Professor Rivail declara: “Todo mundo fala da importância da educação; mas,
para a maioria, esta palavra tem um significado extremamente vago, porque
poucas pessoas chegaram a fazer uma ideia precisa de tudo o que ela abarca
(...) A educação é a arte de formar homens, isto é, a arte de fazer eclodir
neles os germes da virtude e abafar os do vício (...) Numa palavra, a meta da
educação consiste no desenvolvimento simultâneo das faculdades morais, físicas
e intelectuais”. (1)
Poucos anos depois, em 1834, aos 30 anos, ao final de seu
discurso numa solenidade de entrega de prêmios, o Professor reafirma: “Disse,
no começo, que a educação é a obra da minha vida, não faltarei à minha missão,
pois penso compreendê-la. Inimigo de todo charlatanismo, não tenho o tolo
orgulho de acreditar cumpri-la com perfeição, mas tenho ao menos a convicção de
cumpri-la com consciência”. (1)
Como não distinguir no Professor Rivail o futuro mestre
espírita Allan Kardec, o Allan Kardec que, segundo José Herculano Pires, nasce
no dia 18 de abril de 1857, data da publicação de O Livro dos Espíritos?
Deolindo Amorim, em seu livro Allan Kardec, declara que “se ele foi o escolhido
para a grandiosa missão de receber os ensinos do Alto e organizar a Codificação
da Doutrina, é óbvio que já tinha em si mesmo a urdidura espiritual do
verdadeiro missionário. O Allan Kardec racionalista, moralista, universalista,
naturalmente se preparou, com a bagagem do passado, para a obra missionária que
realizou. Imprimiu ao trabalho da Codificação os traços do seu Espírito, com
toda a independência, sem subordinação a nenhuma corrente: o racionalismo, a
propensão universalista, a supremacia dos valores morais, a iluminação pela fé,
a exatidão das provas (...) Nesta síntese, portanto, se descobre
inconfundivelmente a personalidade ativa de Allan Kardec”.
É ainda Deolindo Amorim, em seu livro Análises Espíritas,
que nos mostra as qualidades fundamentais do missionário e do homem de espírito
científico: a serenidade com que encara a notícia dos fatos mediúnicos; o
domínio sobre si mesmo para não se entusiasmar com os primeiros resultados; o
cuidado na seleção das comunicações e dos médiuns; a prudência nas declarações,
evitando sempre as publicações precipitadas; e a humildade, que é também uma
condição do espírito científico interessado na procura da verdade, bem como a
do verdadeiro missionário.
Na Revista Espírita de julho de 1869 há uma comunicação
de Allan Kardec Espírito em que ele, comprovando mais uma vez sua elevada
estatura moral, recomenda: “É necessário que a emoção que experimentais
encontre ressonância entre todos os grandes Espíritos que assistem, invisíveis
e enternecidos, à evocação de suas boas ações; é necessário que eles reconheçam
discípulos entre os que fazem reviver o passado”.
Somos nós, espíritas, verdadeiros discípulos de Kardec?
Pode o mestre espírita nos reconhecer? E nós, o conhecemos, o reconhecemos?
Conhecemos a obra colossal que nos deixou, após tanto trabalho, empenho,
seriedade, fidelidade e dedicação? Eis algumas questões para nossa reflexão.
(1) livro Textos Pedagógicos, de Dora Incontri.
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