quinta-feira, 6 de abril de 2017

SEMPRE EXISTE UM COMEÇO


Iris Sinoti






   Todos os povos, em todos os tempos, contam suas histórias sobre o começo das coisas, do caos à criação do primeiro homem, até chegar à percepção do cosmos, palavra que significa “ordem”.

            Na linguagem moderna da física quântica, a física das probabilidades, aprendemos sobre os buracos negros, outras galáxias, dentre outros tópicos complexos que aborda... E até sabemos que existe um universo desconhecido e que o até então percebido pelo homem é uma pequena parte do universo. O homem moderno já não precisa de nenhuma estória mitológica ou teológica para explicar a origem da vida. Não são precisos postulados para se formar uma imagem coerente do nosso mundo conhecido.
            Mas, apesar de tudo isso, existe em nós uma necessidade psicológica profunda de encontrarmos respostas que nos expliquem: de onde viemos, para onde vamos, o que estamos fazendo aqui? E essa necessidade não vem da mente; poderíamos metaforicamente afirmar que vem do coração.

            Algumas religiões antigas preferiram não considerar essas questões, apenas levantavam as mãos para os céus e esperavam que as coisas mudassem. Já para os racionalistas, o caminho do ego sempre foi o mais cômodo: tudo o que podia ser visto era o suficiente, e essas questões eram empurradas para os abismos do inconsciente. Mas as questões essenciais da existência prosseguiram sem respostas, e uma parte nossa continuava buscando as respostas. Na verdade, não estamos conseguindo viver na maneira polarizada e confortável da mente racional – ou isso/ou aquilo – mas buscamos, mesmo que de forma inconsciente, uma integralidade que possibilite compreender a nós mesmos e, consequentemente, compreender o mundo.

            Claro que ao observarmos o mundo da forma como ele nos é apresentado poderemos cair no erro da limitada percepção do nosso ego, pois as lentes colocadas pela cultura, religião e a família interferem diretamente na maneira como vemos e percebemos as coisas. E mais ainda, a nossa estrutura moral também interferirá, pois poderemos buscar apenas satisfazer os nossos desejos, e assim veremos o mundo com os limites dessa ótica.

            Durante séculos fomos substituindo Deus. Começamos dominando a natureza, depois chegaram as máquinas que nos encantaram, e agora nos entregamos à internet. Metade do mundo hoje vive soterrada na abundância material e outra metade na linha da pobreza. Metade do mundo hoje é viciada em alguma coisa enquanto a outra deprime. Falhamos nas promessas de paz e salvação, e a maioria de nós não encontra sentido em nada do que faz.

            Como conhecimento e sabedoria são coisas distintas, o problema retorna sempre: nós não sabemos que não sabemos, ou seja, não somos conscientes daquilo que estamos inconscientes. Não apreendemos aquilo que se encontra além da nossa capacidade de apreensão. Perdemos a curiosidade sobre as coisas, as conhecemos e não nos tornamos sábios, não sabemos que não sabemos, fomos perdendo pouco a pouco o contato com o mistério. Nos transformamos em uma sociedade que parece inteligente, mas que na verdade é vazia.

            A maioria dos mitos referentes à criação tentou explicar como fomos criados, mas acredito que o importante ficou escondido: por que e para que fomos criados?

Marco Aurélio disse com sabedoria, dois milênios atrás:

“Devo me queixar por ter de fazer o que nasci para fazer, e por cujo motivo fui trazido ao mundo? Você não sente um amor verdadeiro por si mesmo; se sentisse você amaria sua natureza, e a vontade da sua natureza”.

            É vontade da nossa natureza que sejamos criaturas comprometidas com a criação, conectadas com o espírito, conscientes da transcendência. O ato da criação é encenado em todos os momentos, independente da nossa vontade, e só quando nos disponibilizamos a descobrir a nós mesmos nos veremos como seres espirituais no meio de um teatro mortal, mas acima de tudo filhos de Deus.

            Você já parou para pensar que existe algo no mundo que precisa se realizar através de você?

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