Sebastião Nery
RIO – Uma semana depois da posse de Jânio Quadros na
presidência da República, em 1961, o jornalista Raul Ryff, secretário de
imprensa do vice-presidente João Goulart, ligou para o jornalista José
Aparecido, secretário particular de Jânio:
– Aparecido, durante o governo do Juscelino, o Jango, como
vice-presidente, sempre teve um avião da FAB à sua disposição. Agora, no
governo do Jânio, o ministro Grum Moss, da Aeronáutica, tirou o avião do
vice-presidente. Acontece que ele está esperando a mãe dele, que chega ao Rio
às 17 horas, e depois não haverá mais nenhum avião de carreira para Brasília. E
ele tem uma reunião política em Brasília à noite. Você poderia conseguir um
avião para levar o vice-presidente a Brasília?
Aparecido falou com o general Pedro Geraldo, chefe da Casa Militar, pediu para ele providenciar o avião, e comunicou a providência a Jânio, que aprovou. Às quatro da tarde, Ryff ligou de novo para Aparecido:
– Como é, tchê? E o avião?
– Já está à disposição do vice-presidente aí no Rio.
Não estava. Aparecido foi ao general Pedro Geraldo, que
acabava de receber um telex do ministro da Aeronáutica lamentando não poder
atender porque a FAB não tinha nenhum avião disponível. Aparecido foi a Jânio.
Os dois tinham entendido tudo. Jânio arregalou os olhos:
– Foi bom que tivesse acontecido logo na primeira semana.
Você vai ver que não ficaremos aqui um minuto sem autoridade.
Janio mandou chamar o general Pedro Geraldo:
– General, faça-me um favor. Volte a comunicar-se com o
senhor ministro da Aeronáutica e lhe transmita a seguinte instrução: faça
descer o primeiro avião que sobrevoar o Rio de Janeiro, nacional ou
estrangeiro, desembarque os passageiros e ponha-o à disposição do senhor
vice-presidente da República.Trata-se de uma ordem do presidente da República
Em cinco minutos a Aeronáutica pôs um avião à disposição de
Jango.
A Aeronáutica, naqueles tempos, e tantos anos seguidos, era
um partido político, uma sublegenda da UDN. E de armas na mão. Só no governo de
Juscelino, no começo e no fim, fez dois levantes armados, imediatamente
sufocados pela autoridade e energia do marechal Lott.
No segundo governo de Vargas (1951 a 54), não era só a
Aeronáutica. A maioria das Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica) era
inteiramente encoleirada pela ininterrupta pregação golpista de Carlos Lacerda
e da Banda de Musica da UDN, até desaguar afinal no golpe
americano-udenista-militar de 1964.
Quando Getúlio assumiu em 1951, depois da segunda derrota
do brigadeiro Eduardo Gomes (em 45 e em 50), a UDN viu que no voto não chegaria
ao governo: havia perdido para Dutra em 45 e para Vargas em 50 e certamente
perderia em 55 para os herdeiros de Vargas, Juscelino e Jango.
E começou a conspirar freneticamente nos quartéis.
O primeiro passo seria inviabilizar João Goulart, o filho
político de Vargas. Presidente nacional do PTB e ministro do Trabalho a partir
de junho de 1953, Jango tinha estudos da Fundação Getúlio Vargas mostrando que o aumento salarial de 14%,
dado em dezembro de 1951, era ridículo diante do aumento do custo de vida, que
tinha sido de 100%.
E Jango negociou com os sindicatos um projeto de aumento de
100% do salário mínimo, igual ao da inflação: de 1.200 para 2.400 cruzeiros.
– “Em fevereiro de 1954, 82 coronéis e tenentes-coronéis
assinaram um memorial afirmando que possíveis aumentos de salários provocariam
a elevação do custo de vida, agravando a situação dos baixos vencimentos nos
quadros no Exército, que veria dificultado o recrutamento de oficiais. Vargas exonerou Goulart e o general Espírito
Santo Cardoso… E no dia 1º de maio anunciou o aumento de 100% do salário
mínimo” (DHBB-FGV).
Em quatro meses, Vargas era empurrado para o suicídio.
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