Jecé Freitas
Brandão*
Pesquisa divulgada
em junho pelo CFM mostrou que continua alta entre os brasileiros a percepção
negativa sobre a saúde no Brasil, tanto na esfera privada quanto pública. A
área é vista como péssima, ruim ou regular por 89% da população, e boa parte
dessa carga decorre da experiência vivenciada por 150 milhões de pessoas que
dependem exclusivamente da rede do SUS para fazer uma consulta, um exame ou uma
cirurgia.
Essa insatisfação decorre, sobretudo, do longo tempo de
espera para que o cidadão obtenha uma resposta do SUS para sua demanda. Essa é
a visão de 24% dos entrevistados. Além desse problema, a população entende que
contribuem para a má avaliação a falta de recursos financeiros para o SUS (15%)
e sua má gestão administrativa e operacional (12%), assim como a falta de
médicos (10%) e a dificuldade para marcar ou agendar consultas, cirurgias e
procedimentos (10%), entre outros pontos.
Ao avaliar, de modo específico, o tempo de espera que se
destaca nesse ranking, é fácil verificar que, para a população, esse é o maior
gargalo na rede pública. Ele é o principal vilão para 82% dos entrevistados que
buscam uma consulta, 80% dos que precisam de um exame de imagem e para 79% dos
que aguardam uma cirurgia. Infelizmente, a situação tende a se agravar.
No período de coleta dos dados, em maio de 2018, do total
de 2.087 entrevistados, 34% aguardavam para fazer uma cirurgia, 32% buscavam
uma consulta médica, e 31%, exames. Porém, chama a atenção que o SUS está
levando cada vez mais tempo para responder às solicitações.
Em 2014, uma pesquisa do mesmo tipo identificou que 29%
dos que haviam pedido exame, cirurgia ou consulta ainda aguardavam um desfecho
após seis meses. Em 2018, esse percentual passa a ser de 45%. O mesmo ocorreu
com o índice dos que aguardam há mais de 12 meses, que passou de 16%, em 2014,
para atuais 29%, praticamente duas vezes mais.
No entanto, um estudo do Datafolha feito a pedido do CFM
revela que apesar de ter uma avaliação negativa pela maioria dos entrevistados,
o SUS é visto como uma política que deve ser mantida e aperfeiçoada. Ou seja, o
brasileiro reconhece sua importância e, se lhe dá nota ruim, não significa que
o rejeite.
A valorização do SUS como política social relevante
aparece com ênfase na pesquisa. Para 88% dos entrevistados, o Sistema deve ser
mantido no País como modelo de assistência de acesso universal, integral e
gratuito para os brasileiros, conforme previsto em seus princípios e diretrizes
legais. Contudo, a população está atenta e sabe que há um longo caminho a ser
percorrido para colocá-lo nos trilhos.
Em primeiro lugar, acredita-se ser necessário fortalecer
o financiamento do SUS, conforme explicitam 53% dos entrevistados, que alegam
que não há recursos suficientes para atender bem a todos. Contudo, a própria
população sabe que o dinheiro renderá apenas se houver boa gestão: 83% acham
que as verbas públicas destinas ao Sistema não são bem administradas.
Essa é a opinião da maioria. Para 62%, o SUS não tem
gestores eficientes e bem preparados, o que revela uma percepção de
incompetência administrativa decorrente, em grande parte, de questões sentidas
no cotidiano das unidades de saúde, em todos os níveis de complexidade.
Por exemplo, os brasileiros relatam grande dificuldade de
acesso a atendimento e serviços no âmbito do SUS, sobretudo para consultas com
médicos especialistas (74%), cirurgias (68%), internação em leitos de UTI
(64%), exames de imagem (63%), atendimento com profissionais não médicos, como
psicólogos, nutricionistas e fisioterapeutas (59%) e procedimentos específicos
(diálises, quimioterapia, radioterapia etc.), com 58%.
Esses altos percentuais apenas materializam o impacto na
vida das pessoas da pouca oferta de leitos para internação e UTI, da falta de
insumos nas unidades básicas de saúde e da desmotivação dos médicos e outros
profissionais da área, que sofrem, tanto quanto os pacientes, com as lacunas em
termos de infraestrutura e de inexistência de planejamento nas ações
empreendidas.
Como forma de oferecer pistas aos que se apresentam nas
eleições de 2018, a pesquisa CFM/Datafolha procurou identificar a expectativa
dos brasileiros a respeito da atuação desses candidatos após a posse, se forem
vencedores em seus pleitos.
O recado dado de modo assertivo indica que, para fazer
frente aos problemas na área, os cidadãos querem medidas que: combatam a
corrupção na área da saúde (26%); reduzam o tempo de espera por consultas,
exames, cirurgias e outros procedimentos (18%); aperfeiçoem a fiscalização dos
serviços na rede pública (13%); fomentem a construção de mais postos e
hospitais (11%); e garantam a oferta de melhores condições de trabalho e de
remuneração para médicos e outros profissionais da área (9%).
Diante dessa declaração dos brasileiros, o bom candidato
– conectado aos interesses coletivos – assumirá compromissos públicos com a
defesa do SUS, um dos mais importantes avanços alcançados pela sociedade e que,
em 2018, completa 30 anos. Essa é nossa esperança para que melhores dias
cheguem.
Evidentemente, esse compromisso não impedirá que o SUS,
enquanto política social, passe por um democrático e amplo processo de
avaliação. Contudo, ao contrário do que defendem alguns segmentos, esse debate
terá um objetivo: desatar os nós da assistência, sem trazer ameaças de extinção
ou de mudanças que eliminem o que o SUS oferece de mais moderno: acesso
universal, integral e com equidade à assistência.
Atentos aos problemas que afetam a saúde e o bom exercício
da medicina, é importante reconhecer o que os números revelam: a saúde não pode
ser ignorada pelos candidatos e, para atender os anseios legítimos da
população, deve ser tratada com seriedade. É tempo de abandonar os anúncios
midiáticos e dar o que os brasileiros cobram: planejamento, mais recursos e boa
gestão. Só assim o País terá a saúde que merece, conforme prevê a lei.
* 2º vice-presidente do Conselho Federal de Medicina.
(Fonte: Conselho Federal de Medicina)
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