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Texto - Marcella Fernandes
Após deputados conservadores dominarem o debate sobre a
Escola sem Partido nos últimos anos na Câmara, a oposição decidiu adotar uma
nova estratégia. Na primeira semana de legislatura, PT e PSol apresentaram dois
projetos de lei para se contrapor a propostas que limitam a atuação dos
professores. O PL 7180/14, defendido por parlamentares de direita e extrema
direita foi arquivado após não ter sido votado na comissão especial sobre o
tema, em 2018.
Chamado de Escola sem Mordaça, a proposta apresentada pela
deputada Talíria Petrone (PSol-RJ) e demais deputadas da sigla nesta
quarta-feira (6) estabelece que “todos os professores, estudantes e
funcionários são livres para expressar seu pensamento e opinião nos termos do
artigo 206, incisos I e III da Constituição”.
O Projeto de Lei nº 502/2019 prevê o respeito à laicidade e
à liberdade religiosa e uma educação “contra o preconceito, a violência, a
exclusão social e a estigmatização das pessoas pela cor da pele, origem ou
condição social, deficiência, nacionalidade, gênero, orientação sexual,
identidade e/ou expressão de gênero”.
O texto também reforça que a gravação de vídeos e áudios de
atividades de ensino só são permitidos com consentimento de quem será filmado
ou gravado e prevê a fixação de cartazes nas escolas com a lei, além de um
canal para denúncias de eventuais descumprimentos da norma.
O Escola Livre, apresentado por Alexandre Padilha (PT-SP),
tem finalidade semelhante. Além de vetar vídeos sem consentimento, o PL 375/2019 proíbe atos de incitação ao ódio
em sala de aula e a possibilidade de atores externos e pais interferirem em
material escolar já regulado pelo artigo 14 da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (LDB).
A proposta apresentada nesta terça-feira (5) também prevê
campanhas de divulgação sobre as garantias da diversidade e liberdade de cátedra
nas escolas. ”É um dos pontos principais para não permitir de forma nenhuma um
clima de incitação à violência em sala de aula”, afirmou Padilha ao HuffPost
Brasil.
Comissão da Escola sem Partido
Pelas normas de tramitação da Câmara, todo projeto de lei
deve passar pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça). No caso do PL
7180/14, arquivado com o início da nova legislatura, além da CCJ, o texto foi
discutido em uma comissão especial.
A intenção da oposição é que as novas propostas sigam o rito comum, em que são analisadas por comissões temáticas como Educação ou Direitos Humanos, nesse caso, além da CCJ.
Parlamentares do PT e PSol reconhecem que o conteúdo das
duas novas propostas já está previsto na legislação atual e que os PLs são uma
estratégia para ampliar a participação no debate e evitar retrocessos.
‘Novo Escola sem Partido’
Do outro lado, a deputada Bia Kicis (PSL-DF) propôs uma
versão mais rigorosa do que o PL da Escola sem Partido arquivado em 2018.
Apresentado na última segunda-feira (4), o PL 246/2019 permite alunos gravarem
aulas sem consentimento, cria um canal para denúncias anônimas sobre o descumprimento
da lei que deverão ser apuradas pelo Ministério Público e proíbe grêmios
estudantis de fazerem “atividade político-partidária”.
Uma das bandeiras das bancadas católica e evangélica e da
campanha presidencial de Jair Bolsonaro, o PL arquivado no ano passado altera a
Lei de Diretrizes e Bases da Educação para proibir o desenvolvimento de
políticas de ensino e adoção de disciplinas no currículo escolar “nem mesmo de
forma complementar ou facultativa, que tendam a aplicar a ideologia de gênero,
o termo ‘gênero’ ou ‘orientação sexual’”, segundo parecer.
A proposta também estabelece que professores não poderão
usar sua posição para cooptar alunos para qualquer corrente política,
ideológica ou partidária e prevê que as escolas deverão afixar cartazes com o
conteúdo da lei.
Oposição quer enterrar Escola sem Partido
Os projetos de lei do PT e PSol fazem parte da estratégia
da oposição para se contrapor à proposta da ala conservadora. “As questões
colocadas no nosso projeto são garantidas, inclusive constitucionalmente. Mas
no momento em que a gente tem tramitando projetos de lei que ferem a
Constituição, marginalizando setores e pautas centrais para a escola, a gente
acha necessário reafirmar o óbvio para evitar um retrocesso”, afirmou Talíria
Petrone à reportagem.
De acordo com a parlamentar, a intenção é fazer uma
articulação o mais ampla possível para garantir a diversidade no ambiente
escolar e o debate sobre questões centrais no País. “Muitas vezes a gente tem
pai que agride a mãe de um aluno. A escola precisa ser o lugar para discutir
violência doméstica”, completou.
Um dos nomes contra a Escola sem Partido na comissão
especial encerrada em 2018, Glauber Braga (PSol-RJ) reforça o argumento. “A
gente não vai insistir para que uma nova comissão especial seja instalada
porque o nosso projeto tem o objetivo de mostrar o absurdo que é o escola com
mordaça, que eles chamam de sem partido”, afirmou ao HuffPost.
Também atuante contra as mudanças defendidas pela bancada
conservadora, Maria do Rosário (PT-RS) defende que a CCJ defina uma súmula
geral para evitar textos inconstitucionais.
“A gente tem conversado com o presidente [Rodrigo Maia]
sobre o conjunto dos temas. Esse é flagrantemente inconstitucional. Acho que
vamos ter que retomar o debate sobre a constitucionalidade de algumas
matérias”, afirmou.
Reeleito presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ao
mesmo tempo em que permitiu o avanço de pautas conservadoras nas comissões,
atuou para segurar algumas bandeiras no plenário, devido ao apoio de
parlamentares de partidos de esquerda à sua eleição.
Até o momento, o democrata tem mantido a posição.
“Conversei com ele lá atrás quando a gente estava formando o bloco
[partidário]. Ele não vai segurar. Também não é uma pauta que ele apoie. A
gente vai tocar isso, mas a prioridade é a agenda econômica”, afirmou a
deputada Joice Hasselmann (PSL-SP) à reportagem.
A parlamentar do partido do presidente Jair Bolsonaro negou
que haja uma orientação do Palácio do Planalto para não priorizar a pauta de
costumes, mas disse que o foco é a reforma da Previdência. “A lógica é a pauta
econômica primeiro. Não tem orientação de cima para baixo, nada disso.”
Na avaliação de Padilha, apesar do esforço do governo em
temas econômicos, não é possível ter controle do Congresso. “O governo não
controla os obscurantistas.”



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