Precisamos repensar o mundo das leis
Pedro Valls Feu Rosa
O sistema legal da raça humana não funciona bem. É lento. É
caro. É confuso. Aliás, sempre foi. Nunca, durante a caminhada do homem,
existiu um sistema judicial que funcionasse a contento. Sem exceções.
Na Inglaterra, por exemplo, é popular o dito “everything
but the judge” (tudo menos o juiz), dada a lentidão extrema dos tribunais. Na
França, segundo pesquisa do conceituado “Le Monde”, 78% da população reclamam
da lentidão da justiça. O Japão estuda a introdução do “fast track case” para
tentar reduzir a morosidade. Nos EUA os erros judiciários já são parte do
anedotário mundial. Aqui no Brasil Mem de Sá, ainda nos tempos da colônia,
criou um tosco precursor dos Juizados Especiais, buscando agilizar os julgamentos.
Mem de Sá morreu, o Brasil já conquistou sua independência e o nosso sistema
judicial ainda não funciona bem.
O fato é que nunca tivemos e não temos, em nenhum lugar
deste planeta, um sistema judicial simples e eficiente. O homem já foi à Lua, quer
ir a Marte, mas nunca conseguiu conceber um aparato legal que funcione bem. Eis
aí um problema que precisamos discutir – afinal, o mundo mudou.
Nossas empresas já dependem, pela primeira vez na história,
de decisões rápidas em litígios envolvendo milhões, por vezes bilhões de
dólares, sob pena de sucumbirem. Um planeta que gira em torno de uma rede
financeira mundial totalmente informatizada já não é mais compatível com a
lentidão e os formalismos de um direito acorrentado ao passado.
Ao falarmos de criminalidade, pior ainda. Apenas 2,5% dos
crimes cometidos em nossas ruas chegam ao sistema legal e somente 1% dos
condenados cumprem suas penas até o fim. Os prejuízos decorrentes de crimes
eletrônicos já superam os primitivos assaltos a mão armada e a impunidade é
praticamente total, dado não dispor a humanidade de sistemas legais ágeis –
continuamos presos a formalidades, jurisdições, competências etc. Globalizou-se
o crime, mas não a justiça!
Vamos aos números. O Brasil tem uma perda acumulada de 20%
ao ano no crescimento da economia devido à ineficiência do denominado “mundo
das leis”. Um outro estudo, feito pelo IDESP, trouxe um resultado simplesmente
chocante: nosso país deixa de gerar US$ 100 bilhões por ano devido à
ineficiência do sistema legal. Esse cálculo aproximado é a conclusão de ampla
pesquisa realizada junto a cerca de 800
empresas. O impacto estimado do aumento da eficiência nesta área seria: no
volume anual de investimentos, 13,7%; no volume de negócios, 18,5%; no número
de empregados, 12,3%; no investimento em outros estados, 6,2%; no volume de
negócios em outros estados, 8,4%; na proporção de atividades terceirizadas,
13,9%; e, no volume de negócios com o setor público, 13,7%.
Há poucos meses tive a oportunidade de ler, em um jornal
australiano, uma interessante frase do parlamentar David Weisbrot: “o
funcionamento do sistema legal ditará o ritmo e a forma do desenvolvimento
econômico dos países”. Complementaria este pensamento com uma outra
constatação: não existe receita melhor para o desenvolvimento econômico do que
aquela baseada na estabilidade jurídica, e esta é incompatível com a
ineficiência decorrente de um sistema legal projetado há séculos, cada vez mais
complexo e claramente em descompasso com as necessidades deste início de
milênio.
Roberto Campos costumava dizer que o mundo será salvo muito
mais pela eficiência do que pela caridade. Que tal meditarmos sobre isso?
Pedro Valls Feu Rosa é desembargador do Tribunal de Justiça
do Espírito Santo.
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