Onde o Brasil chora e o STF não vê
Por Simplício Araújo
Uma epidemia silenciosa e altamente destrutiva tomou conta de boa parte dos lares maranhenses e brasileiros — e poucos estão percebendo. Somente quando um parente perde o salário, abandona o trabalho, entra em depressão ou tenta o suicídio, é que a família acorda. Mas, às vezes, já é tarde demais.
É a jogatina digital — legalizada e incentivada — que está devastando silenciosamente a vida de milhões de brasileiros, especialmente nos estados mais pobres, como o Maranhão. Um estado onde já faltam empregos, assistência, escolas e políticas públicas, agora vê crescer um novo inimigo: o vício em apostas online.
Esses jogos, que começaram tímidos com esportes e cassinos virtuais, hoje são empurrados goela abaixo da população por meio de mensagens SMS, WhatsApp, vídeos no YouTube, anúncios em redes sociais e influenciadores pagos. Não há mais escapatória: estão em todos os cantos. E o que antes era passatempo de poucos, hoje virou vício de massa, atingindo trabalhadores, donas de casa, jovens estudantes(em escolas publicas e privadas) e até idosos.
Muitos acham que estão só “tentando a sorte”. Mas o que está por trás são algoritmos poderosos, programados para extrair ao máximo o dinheiro do usuário — seja ele pobre ou rico. Esses sistemas foram criados para garantir lucro total para as chamadas “bancas digitais”, muitas delas com sede em paraísos fiscais, intocáveis para a Justiça brasileira.
Em 2020, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que os estados e a iniciativa privada poderiam explorar serviços lotéricos, quebrando o monopólio da União (ADI 4986). Em dezembro de 2023, o Congresso Nacional aprovou a Lei 14.790, sancionada pelo Governo Federal, regulamentando as chamadas apostas de quota fixa — aquelas feitas em eventos esportivos reais ou virtuais, com odds predeterminadas. A nova lei criou o ambiente perfeito para a explosão das “bets” no Brasil.
Na prática, o Brasil legalizou um novo sistema de vício digital em escala nacional, com potencial de devastação comparável ao álcool e às drogas. Só em 2023, segundo o Instituto Brasileiro Jogo Legal, as casas de apostas movimentaram mais de R$ 120 bilhões no país. E esse valor cresce mês a mês.
No Maranhão, onde mais de 60% da população está em situação de vulnerabilidade social, o efeito é devastador. Pessoas que vivem de auxílio emergencial, do Bolsa Família ou de salários mínimos estão gastando tudo em promessas ilusórias de enriquecimento rápido.
E o impacto vai além do bolso: crescem os casos de ansiedade, depressão, abandono escolar e violência doméstica ligados diretamente ao vício em apostas. A Organização Mundial da Saúde (OMS) já classificou esse comportamento como transtorno mental relacionado a jogos eletrônicos, e especialistas brasileiros alertam que não há estrutura pública hoje para tratar a crescente demanda de dependentes digitais.
Enquanto isso, o Congresso faz de conta que não vê. A maioria dos parlamentares prefere manter o lucro das plataformas — que financiam shows, campeonatos e influencers — a encarar o problema de frente. E o STF, que censura redes sociais em nome da “saúde democrática”, ignora o verdadeiro colapso familiar promovido pelas plataformas de jogos online.
Pior: parte da grande mídia, cooptada pelos anúncios milionários das “bets”, também prefere o silêncio. Os únicos que falam são as famílias devastadas — e mesmo assim, quando já perderam tudo.
Enquanto o Brasil legaliza vícios, famílias maranhenses afundam no desespero. Legalizamos a destruição disfarçada de entretenimento. A tecnologia, quando usada sem responsabilidade, se torna veneno. E a jogatina digital é hoje o veneno mais lucrativo e mais letal no cotidiano da nossa gente.
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