Jorge Oliveira
Cascais, Portugal - A Folha de S. Paulo descobriu a Dilma
em Porto Alegre e fez uma matéria chorosa com ela. Mostrou-a uma coitada,
desolada em um modesto apartamento de um prédio sem porteiro. Para os
desavisados, a ex-presidente, depois do impeachment, recolheu-se a um quarto e
sala sem móveis onde é atendida por uma diarista tão ou quanto singela como
ela. Atiçado pelo meu sentimento cristão, pensei, depois de ler o texto, em
mandar um dinheirinho para ela, uma coisinha que ajudasse no seu sustento
diário ou – quem sabe – ajudar no próprio aluguel. Mas logo me dei conta de que
a Dilma recebe gordas aposentadorias, portanto, a história contada pelo
repórter do jornal não passa de uma encenação de quem quer parecer honesta e
não ostentar para fugir da Lava jato.
Resisti à minha tentação de bom samaritano porque logo
lembrei como a Dilma foi nociva ao país. Como foi conivente com a organização
criminosa petista que assaltou os cofres públicos. Como foi dissimulada com
todas as falcatruas da sua equipe durante os seis anos de governo. Quanta
desordem administrativa, quanta desordem mental nas decisões, nos discursos e
nas conversas com líderes estrangeiros. Quanta roubalheira. Agora, querendo
esquecer o passado, ela abre o seu quarto e sala para se mostrar uma mulher
humilde, sem arrogância, pobre, mortal como a sua diarista. Quer passar a
impressão que deixou a presidência com uma mão na frente e outra atrás, que não
compactuou com a roubalheira que a envolveu quando autorizou a compra da
refinaria do Texas.
É difícil para o brasileiro engolir essa farsa, quando
sabe que ela passou na frente de milhares de contribuintes para conseguir outra
aposentadoria, motivo de um processo administrativo dentro do INSS. Que ao
deixar a presidência, agora tem direito a uma pensão vitalícia, segurança,
carro oficial e combustível. Que se acumpliciou com o Palocci, seu ex-ministro,
para captar milhões de reais de caixa dois para a sua campanha.
O repórter conta na matéria que a encontrou como uma
simples dona de casa. Ainda com os móveis desarrumados e a casa em desalinho,
em nada parecia aquela Dilma chique que vivia para cima e pra baixo no avião
presidencial visitando chefes de estados e às vezes desviando da rota oficial
para saborear um bacalhau em Lisboa. No meio da conversa, a Dilma ofereceu-lhe
um café. Por falta de mesa, as xícaras ficaram sobre uma cadeira. Ela falou que
ainda pedala e mostrou os punhos doloridos pelo exercício continuado.
Disse que sai pouco de casa. E quando isso acontece
visita o ex--marido e alguns amigos antigos. Não é de badalação e, neste
momento, nem de conversas políticas. Queixou-se também do peso dos 68 anos. A
conversa descontraída entre os dois em nenhum momento é quebrada por perguntas
inconvenientes, tipo: a senhora não teme a Lava Jato? Acha que vai escapar de
depor na Polícia Federal, depois da descoberta do caixa dois na sua campanha?
Não, nada disso. A pauta do jornal era essa mesmo: uma matéria com a Dilma para
mostrar como vive a ex-presidente depois do impeachment. E o repórter a cumpriu
com competência.
É assim que acontece no Brasil. Esquece-se os malfeitos
rapidamente e procura-se recuperar a imagem, em pouco tempo, de personagens que
fizeram mal ao povo, a exemplo da Dilma. Se não fosse o juiz Sérgio Moro nada
disso estaria ocorrendo. Ninguém estaria na cadeia pelo assalto às empresas
estatais porque, pelo último levantamento, a média de tempo no STF para
finalizar um processar de um político é de 18 anos. É, isso mesmo o que você
leu: 18 anos!
Veja o exemplo do Maluf. Procurado em mais de 100 países
por corrupção, é deputado federal e até agora não foi condenado em nenhum de
seus processos, mesmo com as suas contas descobertas no exterior e uma parte do
dinheiro devolvido aos cofres da prefeitura de São Paulo. Os processos da Lava
Jato que apuram os crimes dos políticos estão na gaveta dos ministros. Parecem
uma chaleira quente, ninguém quer botar a mão. É assim que caminha a Justiça
brasileira: a passos lentos como um paquiderme a caminho do cemitério.
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