quinta-feira, 29 de junho de 2017

JULIÃO AMIM, A VOZ E O ECO DE JACKSON


Nonato Reis










Julião Amim Castro carrega consigo um pedaço da história recente. Poucos políticos no Maranhão construíram um currículo amparado em sólidos alicerces sociais. Desde a década de 70 já militava nas lutas de classes. Em 1980 ajudou a fundar o PT, legenda pela qual tentou e perdeu sua primeira eleição, resultado que se repetiria em 1985, na eleição de prefeito de São Luís, fazendo dobradinha com Jackson Lago. A ungida das urnas, como se sabe, foi Gardênia Gonçalves, que conquistou a simpatia do eleitor com um jingle de campanha que fazia referência a signos delicados como “amor e flor”.

Conheci-o em plena atividade de líder sindical. Eu dava os primeiros passos na profissão, como repórter do jornal O Debate. Ele presidia o poderoso Sindicato dos Bancários, organizando passeatas, conduzindo greves, batendo de frente com o aparato repressor de uma época ainda dominada pelo regime fardado.

Gostava de ver seus discursos inflamados à porta das agências bancárias e sobre carros de som, expondo a revolta dos trabalhadores ante à exploração da classe patronal.

Fiquei tomado de contentamento quando seu nome fora indicado para compor com Jackson Lago a chapa alternativa de 1985 à sucessão de Mauro Fecury, na Prefeitura de São Luís. Era o coroamento de anos de luta em favor dos oprimidos e marginalizados pelo sistema.

Porém o Julião que ingressou na seara parlamentar em 1994 como deputado estadual, reelegendo-se seguidamente em 1998 e 2002; em 2006 para deputado federal e novamente em 2015, assumindo o segundo mandato para a Câmara dos Deputado, após intensa batalha judicial, parecia mais uma caricatura do sindicalista que eu conheci.

O discurso perdeu peso, assumiu um tom morno, repetitivo. Em nada lembrava o sindicalista que incendiava as assembleias dos bancários e as portas das agências bancárias. Ao invés do brilho diante das câmeras e das plateias, Julião optou por atuar nos bastidores, onde desenvolveu a habilidade de bom articulador. Ali foi eficiente, discreto, indispensável. Aproximou-se de Jackson e de tal modo o admirava que acabou por incorporar o tom de voz grave e arrastado do comandante.

Quando Julião fala nos microfones de rádio é Jackson que se tem a impressão de ouvir, tal a semelhança de estilos de narração e de abordagem. Julião Amim não foi apenas um discípulo de Jackson, foi seu confidente e até conselheiro. Junto com Aziz e Mauro Bezerra formou uma espécie de triunvirato do poder, que agia ao redor de Jackson, sugerindo decisões, filtrando reações, controlando o acesso. Ninguém chegava a Jackson se não por eles.

Na Assembleia Legislativa, mesmo sem a luminosidade das ruas, procurou atuar em favor do interesse público. Presidiu a importante Comissão de Defesa do Consumidor e comprou briga com o cartel dos combustíveis. Viajou pelo interior, inspecionando os postos de gasolina, comparou os preços praticados lá com os da capital, e concluiu que aquilo era uma desfaçatez. “Não pode, são mais de 20 centavos de diferença por litro, um absurdo”. 

Fez audiência pública, discutiu a relação desigual que existe entre o preço cobrado e a qualidade de determinado produto. “As empresas se instalam aqui para sugarem a economia do nosso Estado. Não investem para melhorar seus produtos”.

Deputado federal, mesmo atuando em Brasília, era presença constante no palácio e em toda a estrutura do governo Jackson. Suas declarações eram interpretadas como o próprio eco das mensagens do chefe. Aparentemente calmo, às vezes saía da zona de controle e rasgava o verbo. Em entrevista ao jornalista Djalma Rodrigues, para a Rádio Capital, extrapolou. O governo mergulhara em denúncias de irregularidades, Jackson se desgastava perante a opinião pública, Julião propôs que todos os secretários se demitissem e dessem a Jackson a chance de reconstruir o governo, formar uma equipe afinada com suas ideias e projetos.

A entrevista ganhou destaque nos jornais, repercutiu fortemente na base de sustentação de Jackson, Julião se viu sob pressão por criar um mal estar danando no governo, mas aguentou firme e não se retratou.

A política, como sabemos, é a arte de criar e contornar conflitos. Eu a vejo na gênese da democracia. Ambas se alimentam do confronto de ideias e pensamentos. Julião, um corajoso líder sindical, que sofreu as agruras do regime de exceção e contra ele lutou bravamente, deixou lado o pudor, quando precisou ser pragmático.

Em 2006, levado pela necessidade de fortalecer o seu projeto político, Jackson Lago aproximou-se de Castelo e com ele selou a aliança que o levaria ao poder. Julião não apenas apoiou a união, como ajudou a costurá-la.

No evento que sacramentaria aquela coalizão, Julião assumiu o microfone para saudar Castelo como um “grande companheiro”, que se juntava ao PDT, “para resgatar o Maranhão do atraso e da pobreza”. Eu, espremido a um canto no meu trabalho de repórter, pensei comigo: “quem te viu, quem te vê.

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