Dom Jaime Spengler
Arcebispo de Porto Alegre
O ser humano pode se encontrar numa situação histórica de
não ver nenhum motivo para continuar a esperar. No entanto, os cristãos, para
além de todos os desafios, não podem permitir que lhe roubem a esperança.
O Brasil vive uma crise política e ética que preocupa
parcela considerável da sociedade. Torna-se sempre mais clara a necessidade de
urgente promoção e defesa da ética na política. A vigilância e a participação
efetiva de todas as forças da sociedade nesse processo há de contribuir para
resgatar a confiança nessa nobilíssima atividade humana, a qual cuida do bem
comum.
Diante das recentes e contínuas denúncias de corrupção
envolvendo alguns homens públicos brasileiros, o sentimento de muitos é de
espanto e indignação. Os valores manipulados pela prática da corrupção alcançam
cifras que a maioria da população não consegue imaginar. Os números tornados
públicos indicam frieza e cálculos orientados por princípios aéticos. Trata-se
de uma calculabilidade que não é capaz de colher a medida justa e plena da ação
ética.
A corrupção política trai os princípios da moral e as
normas da justiça social. Ela distorce a função das instituições
representativas de um estado de direito, porque usa tais instituições como
terreno de barganha política entre solicitações clientelares e favores dos
governantes. Por isso, as denúncias apresentadas exigem certamente exemplar,
rigorosa e rápida apuração pelas competentes instituições da sociedade
organizada, observado o princípio do estado de direito.
“Na vida pública, na política, se não houver a ética, uma
ética de referimento, tudo é possível e tudo se pode fazer”, disse o Papa
Francisco. A nação precisa encontrar saídas para a atual crise que respeitem e
fortaleçam o estado democrático de direito.
A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil publicou na
última semana uma nota, na qual afirma que “a superação da grave crise vivida
no Brasil exige o resgate da ética na política que desempenha papel fundamental
na sociedade democrática. Urge um novo modo de fazer política, alicerçado nos
valores da honestidade e da justiça social”. A nota continua, recordando o que
fora afirmado durante a Assembleia Geral da Conferência Nacional dos Bispos do
Brasil, celebrada recentemente em Aparecida: “O desprezo da ética leva a uma
relação promíscua entre os interesses públicos e privados, razão primeira dos
escândalos da corrupção”.
Diante do quadro político brasileiro, pode ser de auxílio
recordar o que diz a Doutrina Social da Igreja: “Para os fiéis leigos, o
compromisso político é uma expressão qualificada e exigente do compromisso
cristão ao serviço dos outros. A persecução do bem comum em um espírito de
serviço; o desenvolvimento da justiça com uma atenção particular para com as
situações de pobreza e sofrimento; o respeito pela autonomia das realidades
terrenas; o princípio de subsidiariedade; a promoção do diálogo e da paz no
horizonte da solidariedade; são estas as orientações em que os cristãos leigos
devem inspirar sua ação política. Todos os que creem, enquanto titulares de
direitos e deveres de cidadãos, estão obrigados a respeitar tais orientações;
aqueles que tem encargos diretos e institucionais na gestão das complexas
problemáticas da coisa pública, seja nas administrações locais, seja nas
instituições nacionais e internacionais, deverão tê-las especialmente em
conta”.
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