Percival Puggina
“Qualquer pessoa que tenha os jornais e a TV como sua fonte
principal de informações está excluída, in limine, da possibilidade de julgar
razoavelmente a veracidade e a importância relativa das notícias.” (Olavo de
Carvalho, em “Quem eram os ratos?”)
Em 2012, num excelente artigo que pode ser lido aqui, o
autor da frase acima discorreu sobre a distância que, em períodos soturnos da
história, se estabelece entre o conjunto de crenças (e incertezas) da parcela
pensante da sociedade e as inabaláveis convicções que marcam a opinião das
massas.
É diante disso que a frase em epígrafe amplia sua
importância como auxiliar de diagnóstico da situação nacional. De 2012 para cá,
ocorreu a explosão das redes sociais, que disponibilizou, à massa, o acesso a um
volume até então inconcebível de informações, conhecimentos (para os mais
dispostos a buscá-los) e capacidade de interpretação. O jornal impresso do dia
tornou-se um depósito de notícias de ontem, opiniões sobre os fatos de
anteontem e variedades. O noticiário dos canais tradicionais de TV perdeu sua
dimensão informativa e ampliou dedicação à tarefa de adequar os fatos à opinião
dos editores. Algumas emissoras de rádio e TV abriram canais e frequências
voltados exclusivamente às “news”. O jornalismo, enfim, se digitalizou.
Não foi por livre e espontânea vontade que o fizeram, mas
por exigência da força avassaladora de suas novas concorrentes: as redes
sociais, que, em muito pouco tempo, revolucionaram o mundo da comunicação. E o
da manipulação. É verdade que as redes sociais se prestam para a proliferação
das fake news, mas não parece sensato mencionar esse fato sem incluir a
tradicional manipulação das notícias pelos grandes veículos.
Voltando à frase do Olavo. A longa história do jornalismo
está ligada ao binômio notícia-opinião. Os jornais tinham colunas de opinião,
nas quais uns poucos analistas, presumivelmente qualificados, serviam aos
leitores suas interpretações dos fatos em curso.
Era um grupo restrito,
infinitamente menor do que o requerido pela dinâmica da vida social e, como
regra quase geral, orientado para servir ao alinhamento ideológico que buscava
o poder no Brasil. Foi assim que o PT e os partidos de esquerda conseguiram
crescer sob o beneplácito da mesma “grande mídia” da qual sempre tanto se
queixaram. E mesmo isso fez parte da estratégia. Só o referido beneplácito pode
explicar as longas décadas em que o criminoso trabalho do Foro de São Paulo
permaneceu oculto e protegido, enquanto toda menção a ele era tratada como
“teoria da conspiração”. Só esse beneplácito pode explicar que prosperasse a ideia
de que os partidos de esquerda eram incorruptíveis e poderiam passar o Brasil a
limpo, mesmo depois da morte de Celso Daniel e de tantas experiências de gestão
em Estados e municípios. Só esse beneplácito pode explicar que o PT chegasse ao
poder com um discurso contrário àquele que construiu seu caminho até ele. E
ficasse tudo por isso mesmo, inclusive quando reverteu sua marcha-ré. O que
hoje se vê é escala ampliada do que há muito se via.
A única disputa que a esquerda perdeu e sabe que perdeu, no
Brasil, nas últimas décadas, foi a das redes sociais. Elas tornaram visível a
existência de vida inteligente fora da esquerda. A derrota intelectual foi tão
acachapante que o petismo precisou mudar de ramo, criar uma seita e se
reinstituir como igreja... É a antipolítica pela falência do que se apresentava
como razão.
Percival Puggina, membro da Academia Rio-Grandense de
Letras, é arquiteto, empresário e escritor.
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