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2023: a primeira grande entrevista do ano. Cordeiro Filho conversa com João Pedro Borges
Músico exímio e produtor por excelência, participou de capítulos fundamentais da música no país, como a "Camerata Carioca."
31/12/2022
Por: Mhario Lincoln / Fonte: Cordeiro Filho/Editoria do Facetubes
Do Facetubes
Nota da Editoria: a plataforma do facetubes.com.br está agradecida por publicar hoje um grande trabalho do artista Cordeiro Filho, nesta entrevista com o renomado e respeitado violonista mundialmente aplaudido, João Pedro Borges. A matéria é exclusiva e conta detalhes dantes nunca revelados na imprensa nacional. Convido, pois, nossos leitores a se deliciarem com esta conversa. Deveras agradecido, Cordeiro e Pedro Borges.
Um abraço, Mhario Lincoln.
A ENTREVISTA
PERGUNTA 01
Cordeiro Filho - Como e quando o violão chegou às suas mãos?
João Pedro Borges: No final dos anos 50, de 11 para 12 anos de idade. Nessa época, eu demonstrava muito interesse para acompanhar as rodas de choro e canções que o meu padrinho José Silva, violonista amador e pintor de profissão, organizava com seus amigos em nossa casa. Um dia ele me perguntou se eu queria aprender a tocar violão e ao ver meu entusiasmo começou a me ensinar as primeiras notas. Em seguida me comprou um pequeno violão e dedicou-se a compor pequenas valsas e choros que eu aprendia rapidamente, ao mesmo tempo em que começava a acompanhar algumas canções.
PERGUNTA 02
Cordeiro Filho - Nesta época o violão já era aceito nos salões, nas casas e onde mais se ouvia o som das cordas de um violão?
João Pedro Borges: Nos anos 50, o violão já vinha sendo aceito, e se tornando cada vez mais, um instrumento da Cultura Popular, graças aos programas de Rádio e especialmente aos Programas de Guilhermano Reis na, Rádio Nacional do Rio de Janeiro. Pela mesma época, já existia o Violão de Garoto, já com precursor da "Bossa Nova", da Moderna Música que se tocaria no Brasil. Garoto teve uma influência muito grande na obra do Maestro Radamés Gnattali, que é o grande arranjador da Rádio Nacional, sendo primeiro a colocar Orquestra para acompanhar a voz, a pedido do cantor Orlando Silva e de outros cantores. E aqui no Maranhão, na década de 50, já pontilhavam figuras como Custódio Zaqueu Coelho - O Custodinho, com quem eu tive a oportunidade de ter aulas, por conta de um parentesco de afinidade com meu Padrinho José Silva, apesar das dificuldades que ele enfrentava com o alcoolismo, mas mesmo assim era uma figura respeitada. Nos anos 60, logo depois do 1° Concerto de Turíbio Santos no Teatro Artur de Azevedo, Custodinho também realizou um Concerto, inclusive eu tenho as fotos dos Programas dele, que foram impressas na Tipografia Borges (meus avós) tendo o meu pai, que era amante da música do violão e gostava de Serestas, dos Choros fazia companhia ao seu Padrinho José Silva e ajudou na elaboração destes Programas, realizado pelo grande Custódio Zaqueu Coelho. Isso confirma também uma tradição na música, aqui no Maranhão, patrocinada pelas Associações, principalmente a Sociedade de Cultura Artística do Maranhão, que já tinha trazido grandes nomes da música mundial, a exemplo de Nicanor Zabaleta, que pouca gente sabe que ele era um dos melhores artistas do mundo e que aqui se apresentou.
Existem trabalhos também que mostram presenças de artistas importantes em São Luís do Maranhão, como o grande violonista Paraguaio Agustin Barrios - um dos maiores compositores para instrumento, que também se apresentou aqui em São Luís, tendo tocado no Teatro Artur de Azevedo. Turíbio Santos conta que o pai dele teve que arrebanhar amigos pra levá-los a fazer público na apresentação do Augustin Barrios. O curioso é que quando comecei apreender violão com o meu padrinho e com Custodinho, eles também foram me informando, me atualizando, com isso eu tive bom contexto de informações a respeito da música brasileira, dos grandes compositores e dos grandes violonistas. Isaías Chaves esteve também em São Luís. Foi um dos responsáveis pela implantação do violão clássico no Brasil, chegou a ser professor do também maranhense Turíbio Santos. O meu professor Luís Almeida, com quem estudei (depois das aulas com meu padrinho), pela necessidade de lê partituras e me familiarizar com o repertório clássico do violão.
PERGUNTA 03
Cordeiro: A partir destas aulas, desses estudos e experiências todas, como se deu a sua ida para o Rio de Janeiro?
João Pedro Borges - A minha ida ao Rio de Janeiro se deu mais ou menos em circunstâncias inesperadas, a bem da verdade o Regente do Coral do Maranhão que substituía Bruno Visio, mais o Gregório Neto já tinham me incentivado a participar do Festival na Bahia, mas está viagem acabou não acontecendo porque as passagens terminaram não saindo a tempo por falta de dinheiro pra financiar a viagem. Entretanto fiquei aqui mantendo as minhas atividades, cantando no Coral. Além disso, tinha programas na televisão Difusora Canal 4, isso já na década de 60, mas em 1970, por uma situação premeditada, eu terminei participando do Primeiro Festival Estudantil da Música Popular Maranhense, onde eu ganhei em primeiro lugar com a canção" Prelúdio da Paz que Vai Voltar", com letra de Souza Neto (irmão do violonista Ubiratan Souza) e música de minha autoria Além da notoriedade que o Festival me trouxe, no júri estavam Nonato Buzar, João do Vale, Chico Maranhão, entre outras personalidades com isso o evento chamou a atenção do então Prefeito de São Luís Dr. Haroldo Tavares, que reuniu todos estes compositores na sua casa, na qual promoveu uma noite de música e uns comes e bebes.
Nesta ocasião, por intermédio de Ubiratan Souza, ele fez contato com uma figura que também estava lá, que era o então Governador José Sarney, e ele sabendo que Sarney tinha organizado concertos de Turíbio no Palácio dos Leões,ele chamou atenção do governador para o fato de que eu também tocava Violão Clássico, e isto despertou uma grande curiosidade, fazendo com que eu tocasse a A CATEDRAL de Agustin Barrios, que eu uma peça muito exuberante e impressionou o governador que logo que eu terminei a de tocar, ele me perguntou se eu não queria estudar fora daqui? No que eu respondi que sim, mas não tinha condições! Então ele chamou imediatamente o Joaquim Itapary, que era o Superintendente da SUDEMA – Superintendência de Desenvolvimento do Maranhão, e falou pra ele me conceder uma Bolsa de Estudos, igual a que ele tinha concedido para as Irmãs Nascimento.
Joaquim Itapary anatou os meus dados e marcou para a segunda-feira seguinte ir na SUDEMA. A ideia teve apoio do Governador José Sarney que ressaltou para ser feito o processo da bolsa o mais rápido possível, pois ele iria se desincompatibilizar na semana seguinte para concorrer ao Senado Federal. E foi nessas circunstâncias que eu consegui esta Bolsa de Estudos.
PERGUNTA 04
Cordeiro Filho: Como foi sua chegada no rio de Janeiro?
João Pedro Borges: Em lá chegando, o primeiro contato que eu tive, foi com o Turíbio Santos que estava dando um curso de extensão no Conservatório Brasileiro, de passagem, pois ainda morava em Paris, e foi lá que eu conheci o meu professor Judaci Damasceno, que Turíbio imediatamente me recomendou a ele, dizendo que eu devia estudar violão.
PERGUNTA 05
Cordeiro Filho: E sua carreira fora do Brasil, quando começou?
João Pedro Borges – Já sobre minha carreira no exterior, em 1973, contratado pelo Itamaraty como professor no Senegal, que o Brasil estava oferecendo para trabalhar num Conservatório de Música e Arte Dramática que era vinculada a Universidade de Dakar e por isso não dei logo continuidade, após o meu contrato no Senegal para estender a minha ida para a Europa, porque eu tinha me comprometido com o Dr. José Martins que se ele criasse a Escola de Música daqui do Estado do Maranhão, eu voltaria pra dá aulas e foi isso que fiz e acho que num certo sentido foi muito bom porque me deu oportunidade de fortalecer minha carreia no nível nacional. Com Turíbio, continuou o nosso Projeto Choros do Brasil e o outro Choros e Valsas, que resultaram em dois discos - Choros e Valsas. Foram também lançados na França. Ainda fizemos concertos pela América do Sul. Os shows da Europa acabaram sendo adiado por diversas vezes e acabou não acontecendo.
Até que em 1993, eu recebi um telefonema de um amigo que era professor no Maranhão, Klemens Hubert me perguntando se eu não tinha interesse de me apresentar em Berlin porque ele estava retornando para Alemanha e achou que eu devia me apresentar de alguma forma por lá. Daí, renasceu o projeto da Europa. Nesse meio tempo com o adoecimento do meu pai, a minha irmã Gisele veio ao Brasil e na oportunidade conversando com ela, ela disse não, você vai direto pra França e de lá eu te levo pra Berlim. Foi isso que aconteceu, mas ao chegar na França, ela me apresentou uma pessoa que fazia gravações para grandes nomes francêses, a Família de Michel Le Grant e outros, e quando ele soube que eu havia trabalhado em produção e edição, se aproximou de mim e ao ver minha capacidade, então me ofereceu a possibilidade de fazer um disco, porque através deste disco, seria divulgo o meu trabalho aqui na França. Dito e feito. Desta forma, eu comecei a desenvolver meu trabalho. O disco, ele mandou para músicos amigos dele, que faziam parte de uma Associação de Violões. Aí está o segredo, na França: as organizações que promovem os Concertos. Daí foram abertas todas as possibilidades.
PERGUNTA 05
Cordeiro Filho: E na sua volta para o Brasil, após a Europa, o que se sucedeu?
João Pedro Borges: Quando eu voltei para o Brasil definitivamente em 1995/1996, ainda passei uns três meses em São Paulo, mas logo vim de vez para o Maranhão. Primeiro, vim implantar um Projeto de Música no Centro Universitário do Maranhão – CEUMA em 2000, depois fui trabalhar na Prefeitura de São Luís, onde mais tarde ocupei a Diretoria de Eventos da Fundação Municipal de Cultura. Mas foi na Prefeitura que eu ajudei a realizar o Primeiro Festival Internacional de Música – um evento de repercussão Internacional, a convite do Maestro Artur Moreira Lima, com quem havia trabalhado na TV Manchete, como Diretor Musical do Programa “Um Toque de Classe”. Já em 2002, a convite do então Prefeito Tadeu Palácio, eu o convenci a criar A Escola Municipal de Música, sendo seu primeiro Diretor. Neste mesmo ano eu fiz o concurso para professor da Escola Estadual de Música, me tornando efetivo.
PERGUNTA 06
Cordeiro Filho: Vamos agora falar sobre a retrospectiva de sua carreira vitoriosa. Pode?
João Pedro Borges - Antes de eu ir pra França em 1994, antes, na década 80, eu tive um volume muito grande de concertos desde o final dos anos 70. Foi nessa época que eu gravei o meu primeiro disco de forma independente. A década de 80, foi profícua em termos de trabalho, culminando com a minha ida pra Nova Iorque em 1982, em 86 fui pra Martinica, depois dei muitos concertos pelo Brasil todo, participando de festivais, mas nunca perdi o contato com São Luís do Maranhão, porque todos os anos e até mais de uma vez por ano, nós organizávamos concertos em São Luís, pois aqui sempre tive um time de apoio, inclusive tinha um Agente de Produção, o Pierre Barroso, além de você, meu amigo, na época vereador Cordeiro Filho.
Esta foi uma época muito produtiva em que eu não perdi contato com o público Maranhense e ocasionalmente eu estreava concertos aqui, e que depois eu tocava em outras partes do Brasil, tanto que eu tenho até vídeo com gravação de concertos no Sul do País, e alguns estão na minha página do Youtube. Isso tudo serviu de preparação para minha ida pra França.
Quando eu voltei da França em 1996, eu continuei com meus contatos lá e mesmo sem morar lá, viajei várias vezes para realizar concertos em 2000/2001/2002, tanto que quando estávamos montando a Escola de Música do CEUMA, tivemos que adiar a inauguração por um mês, porque eu tinha um concerto na França. E foi assim que mantive a carreira na Europa e no Brasil com Turíbio ou mesmo sozinho, isso tudo culminou numa grande Tournê pelo Brasil através de um projeto do SESC – Sonora Brasil onde fizemos 83 concertos do Iapóque ao Chuí em 82 cidades brasileiras em 3 meses e meio nos deslocando de avião ou de Van.
A partir dos anos 2000, quando houve a oportunidade da realização do Festival Internacional de Música em São Luís e como eu já tinha experiência em produção, apostamos todas as nossas fichas neste festival com artistas de várias partes do mundo, inclusive com a presença da Orquestra Filarmônica da Romênia, se transformando num sucesso espetacular. Em seguida, o Prefeito Tadeu Palácio me convidou para fazer parte da direção da Fundação Municipal de Cultura – FunC, que tinha nos seus quadros, você Cordeiro Filho, meu amigo, dessa feita, como ex-vereador. Terminada a nossa participação na FunC, o Prefeito Tadeu me convidou pra ajudar na criação da Escola Municipal de Música, da qual fui o primeiro Diretor. Inicialmente as matrículas foram dirigidas ao público das escolas municipais do Ensino Fundamental, chegando a ter mais de 600 alunos matriculados.
Todavia, os governos seguintes não deram a devida atenção ao Projeto da escola de Música, sendo que esteve parada por um período e quando ia recomeçar o Secretário Municipal de Educação Moacir Feitosa me demitiu. Neste intervalo, ocupei a direção da Escola de Estadual de Música "Lilah Lisboa" por três meses, a mesma escola que eu ajudei a fundar em 1974. A carreira de todos os músicos instrumentais a partir deste momento, sofreu grande baque na produção de Concertos em todo mundo, e ai surgiram as carreiras virtuais. É de se observar que depois deste período, as carreias sofreram com a diminuição de concertos e festivais. No entanto com início da era digital, das "Lives", muitos músicos formados em escolas perderam os concertos presenciais, mas se tornaram músicos digitais, aproveitando as novas tecnologias. De todo modo, a minha carreira aqui no Maranhão, sempre foi vinculada com a música, enfim, chegamos aos dias atuais, não pensamos em “guardar a viola no saco” porque depois de por os pés no caminho, só resta Vencer ou Morrer, mas ainda estou querendo vencer (rsrsrs).
LIVRO "João Pedro Borges: violonista por excelência".
Autor: Wilson Marques/Clara Editora.
Sobre o livro: "João Pedro Borges a homenagem é mais do que justa. Artista talentoso, João Pedro deixou São Luís ainda muito jovem para estudar no Rio de Janeiro. Ali, construiu uma sólida amizade com outra fera da música maranhense e nacional, o também violonista Turíbio Santos, e rapidamente envolveu-se com a nata do movimento da música instrumental carioca. João Pedro foi produtor musical. Participou de capítulos fundamentais da música no país, a exemplo do fenômeno conhecido como Camerata Carioca. Artista do Brasil e do mundo, João Pedro não esqueceu, no entanto, sua terra natal. Pelo contrário, sempre que foi possível, se fez presente em São Luís para oferecer sua contribuição, mais marcadamente como o professor que sempre foi. Em 1974, regressando do continente africano, o músico instalou-se na capital para ensinar violão na então recém-criada Escola de Música da Fundação Cultural do Maranhão, mais tarde Escola de Música Lilah Lisboa. Desempenhando um papel vital no desenvolvimento musical das novas gerações da época, ele foi decisivo na formação de artistas como Josias Sobrinho, Giordano Mochel, César Teixeira, Sérgio Habibe, entre outros, que iriam ser os protagonistas de uma verdadeira revolução musical da qual emergiria a moderna música maranhense".
Do Facetubes
(Recuperado da página da AMEI/São Luís).


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