sábado, 23 de setembro de 2023

O QUE FAZER COM AS TERRAS INDÍGENAS - artigo de Ney Lopes, jornalista, advogado, ex-deputado federal



OPINIÃO: O QUE FAZER COM AS TERRAS INDÍGENAS

23 / 09 / 2023

Ney Lopes*

O STF rejeitou a tese do marco temporal para a demarcação de terras indígenas.

Decidiu que a data da promulgação da Constituição Federal - 5 de outubro de 1988 - não pode ser utilizada para definir a ocupação tradicional da terra por essas comunidades.

O marco temporal previa, que os povos indígenas só tinham direito a permanecer nas terras que já ocupavam ou disputavam, até a data citada.

Agora, não haverá tempo determinado.

Respeito as decisões do STF, mas o julgamento conflita com a Constituição, ao invés de acatá-la.

Inevitavelmente, tornará a demarcação de terras indígenas objeto de disputas intermináveis e talvez até com uso de violência.

A Constituição de 1988 estabelece que “são reconhecidos aos índios (...) os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens” (art. 231).  

A regra é peremptória e não deixa dúvidas: os indígenas não têm direito sobre qualquer terra que eventualmente venham a ocupar, e sim “as terras que tradicionalmente ocupam”.

A Constituição é claríssima, ao estabelecer no artigo 67 das Disposições Constitucionais Transitórias, que “a União concluirá a demarcação das terras indígenas no prazo de cinco anos a partir da promulgação da Constituição”.

Portanto, se o texto constitucional estabeleceu um prazo de cinco anos para a demarcação, não há como negar que foi fixada uma data (marco temporal), agora negada na decisão do STF.

O futuro dos índios no Brasil dependerá de várias opções estratégicas, tanto do Estado brasileiro e da comunidade internacional, quanto das diferentes etnias.

O que está em causa é o modelo que o país deseja para si mesmo e o papel dos indígenas nesse modelo

As populações nativas têm direito a seus territórios por motivos históricos.

Estes direitos não devem constituir obstáculos para o crescimento do resto do Brasil.

A exemplo do que ocorreu no Canadá, Estados Unidos e outros países, o futuro dos índios brasileiros dependerá de parcerias estratégicas.  

O que se deve procurar são os meios para que não se perca a riqueza, ainda desconhecida, da biodiversidade (conjunto de todas as espécies de seres vivos existentes em determinada região) e os conhecimentos das populações tradicionais sobre as espécies naturais (medicamentos).

A floresta amazônica e a biodiversidade interessam ao mundo e o mundo está disposto a pagar por elas.

Por isto, a forma será a convergência dos direitos dos índios com os interesses da sociedade brasileira, como meio até de evitar a pressão externa sobre madeiras, minérios e outras riquezas, além da cooptação e divisão das lideranças nativas.

Hoje, os índios lidam com múltiplos problemas de saúde, educação, habitação e os mais baixos índices de serviço de saneamento básico, água tratada e energia elétrica, mesmo sendo proprietários de 13% do território nacional.

Isto prova que não é a imensidão de territórios a solução da pobreza dos indígenas.

Existem cerca de 680 territórios indígenas regularizados e quase 900 mil indígenas, distribuídos em 305 etnias.

O estado do RN foi um dos últimos a assumir a existência de povos indígenas, podendo ocorrer disputas de "terra" no território potiguar.

No município de Baía Formosa está situada a comunidade indígena “Sagi-Trabanda”, autodeclarados Potiguara.

Outras comunidades indígenas localizadas no RN:  Satu (Canguaretama e Goianinha/RN); Tapará (Macaíba/RN); Lagoa do Mato (Macaíba/RN); Ladeira Grande (Macaíba e São Gonçalo do Amarante); Amarelão (João Câmara/RN); Assentamento Santa Terezinha (João Câmara/RN) e Serrote de São Bento (João Câmara/RN)

A questão indígena resume-se na ampliação dos espaços de discussão, sem idéias fixas  ou submetidas a ortodoxia ideológica.

Após a demarcação das terras indígenas impõe-se a execução de políticas de inclusão social de largo alcance.

Isto significará respeito à tradição daqueles que nos legaram o país onde vivemos.

O contrário será estimular o conflito e a desarmonia social, além de sepultar o potencial de riquezas inexploradas, que poderiam contribuir para o desenvolvimento do país..

*Ney Lopes – jornalista, advogado, ex-deputado federal; ex-presidente do Parlamento Latino-Americano, procurador federal 


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