quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Um mês da tragédia de Santa Maria

Procurei o que escrever... Um mês hoje da tragédia de Santa Maria... Aqui no meu canto, faltavam palavras. Mentalmente, em orações!... No início da tarde de hoje, a oração silenciosa é a saida que tenho... Não sou de Santa Maria, mas parece que estou lá, solidário...
Não sei como, abri as páginas da internet e - por intuição, talvez! - achei este texto no jornal A Razão... Leiam!... O título: "Pelas Nossas Filhas"... Leiam!... Hoje não escreverei mais nada no blog - são 15 horas!... Leiam!  

"Pelas nossas filhas"

Do Jornal A Razão - de Santa Maria

A união, a força e a amizade de dois pais, um mês após a tragédia que vitimou 239 pessoas na Boate Kiss

Pedro H. Pavan
Gabriela Perufo/ Especial

Adherbal Ferreira (à esquerda) e Leo Becker, representantes da Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia em Santa Maria (Foto: Gabriela Perufo / Especial / A Razão)
Adherbal Ferreira (à esquerda) e Leo Becker, representantes da Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia em Santa Maria (Foto: Gabriela Perufo / Especial / A Razão)

O silêncio do abraço acima foi quebrado pela seguinte frase: “pelas nossas filhas”. Adherbal Ferreira e Leo Carlos Becker, dois pais que perderam suas filhas na tragédia da Boate Kiss, amigos de longa data, assim como as suas meninas Jennefer Ferreira e Érika Becker, simbolizam toda a força que Santa Maria deve ter para seguir adiante. Hoje, 27 de fevereiro, um mês após aquele fatídico domingo do dia 27 de janeiro, o jornal A Razão mostra a união dos pais que, agora, representam a Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia em Santa Maria (AVTSM), e traz essa história como forma de homenagear todos os familiares e amigos de vítimas.
Em mais de uma hora de conversa com A Razão, ambos intercalavam lembranças de suas filhas, em um misto de indignação, fé e muita força de vontade para retomar a rotina e lutar pela vida. “A minha filha tinha amor por mim, pela família, pelos animais. Tínhamos uma cumplicidade muito grande, talvez ela tenha sido a minha alma gêmea. Tínhamos um apego muito grande”, recordou Adherbal.
Ao longo de um mês, eles contam que a primeira semana de luto foi a mais difícil de suportar. “Na primeira semana senti um aperto no corpo. O corpo dói, é uma dor na carne. As pessoas falavam que isso acontecia quando se perde alguém, mas jamais pensei que fosse tão forte assim”, lembrou o pai da Érika, segurando as lágrimas. Assim como todos os outros familiares das vítimas, o dia-a-dia de Adherbal e Leo, nunca mais será o mesmo. “A minha vida está uma confusão enorme. Eu estou atrasado no meu trabalho, tentando passar adiante as coisas que eu tenho para fazer”, relata Adherbal.
Nos últimos dias, depois da tragédia, Adherbal se divide entre o trabalho, atender aos pais e toda imprensa que o procura. “Na primeira semana eu não me consolava e chorava o dia inteiro, fiquei muito revoltado com a situação. Depois procurei entender isso de uma forma positiva, e não negativa. Infelizmente, minha filha não está mais aqui. Foi um pedaço do meu coração que foi perdido”, lamenta.

“Serendipidade” – As vidas dos amigos se cruzaram no ano de 1995, quando Adherbal abriu uma loja e fez uma parceria comercial com o então bancário Leo. A partir dessa parceria foi constituída uma amizade. Então, os caminhos de Érika e Jennefer também se entrelaçaram, quando as duas foram colegas na 3ª série do colégio Sant’Anna. Formou-se a partir da infância uma amizade, que só fora interrompida aos 27 dias de 2013.
Leo conta que aproximadamente duas semanas antes da tragédia, uma foto dele e da filha, abraçados, apareceu no meio da bíblia. “A foto apareceu lá, no meio da bíblia. Pensei que tinha sido a minha esposa que tivesse colocado a foto. Ela disse que não, me falou que quem colocou a foto lá foi a Érika”.
Uma história semelhante também aconteceu na família Ferreira. Segundo Adherbal, Jennefer teria escrito uma carta, um agradecimento por tudo que ela teve na vida, sem o conhecimento de ninguém. “Por coincidência, a Jennefer agradeceu por toda a vida dela, desde as unhas, os cabelos, a família, os amigos, os bichinhos. E a carta estava no meio da bíblia, no salmo 31, que tem um trecho que diz ‘a ti entrego meu espírito, Senhor’. A carta possivelmente foi escrita em dezembro, e foi encontrada pelo irmão dela, dias depois da tragédia”, acredita o pai.

E, sem citar qualquer tipo de crença, talvez a palavra “serendipidade” seja a mais adequada para explicar todo o envolvimento das duas famílias em torno do que aconteceu. Serendipidade não existe em nosso dicionário e é um termo da língua inglesa (serendipity) que se refere às descobertas feitas, aparentemente, por acaso. A palavra surgiu para expressar quem encontra uma coisa que não estava procurando. Pode ser o acaso, pode ser coincidência. Mas a história dos dois pais, e de suas filhas, se cruzaram em vários momentos. Para quem acredita, pode ser destino, ou no mínimo, coincidência.

A Associação – Foi no sétimo dia de luto, durante a missa, que Adherbal e Leo tiveram o “empurrão” que faltava para tomar frente a uma futura associação de pais e vítimas da tragédia. Durante a cerimônia, realizada na Catedral Metropolitana, o padre Xiko, em conversa com diversos familiares, sugeriu que fosse criado um grupo de apoio entre eles. A grande maioria dos pais, apesar de muito abalados, concordou com a criação de um grupo de ajuda mútua. No entanto, no dia seguinte, nenhum pai ou parente de vítima teria assumido a responsabilidade ou procurado outros familiares. “O defensor público tinha planos de esperar 30 dias após a tragédia para organizar uma audiência pública, que marcaria o início da Associação. Aí o Leo pegou e disse: ‘não, vamos começar agora!’. Com isso, assim que completasse um mês já conseguiríamos alcançar várias famílias e ter uma diretoria organizada. Muita gente diz que não sabe como a gente conseguiu, e nem mesmo eu sei como estamos conseguindo. Mesmo de luto, com sofrimento, nós conseguimos”, comentou Adherbal.
A partir disso, ambos ligaram para os pais de vítimas que conheciam e sugeriram um primeiro encontro. Após a iniciativa, a associação tomou forma e ganhou novos membros, sempre com algum tipo de ajuda externa e motivados pela solidariedade dos santa-marienses. Como, por exemplo, do professor da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) Sérgio Madruga, responsável pela Incubadora Social da UFSM, que ajudou com algumas questões administrativas. Hoje, segundo informações do presidente (Adherbal) e vice-presidente (Leo), eleitos em reunião oficial no último sábado, mais de 235 famílias já fazem parte da Associação. “Estamos recém começando. Foi distribuída uma ficha por família para a realização de um cadastro. Por isso, não temos o número certo de quantas pessoas fazem parte da Associação”, informou Adherbal, que projeta um aumento no número de participantes. “Muitos pais ainda nem conseguiram sair de casa. Esperamos a adesão de mais gente”, relatou.
Adherbal e Leo lembram que em nenhum momento quiseram liderar qualquer tipo de grupo ou associação. “Não queríamos essa função, mas muitas pessoas pediram. Mas, ficou acertado no estatuto da Associação que teremos novas eleições daqui a seis meses”, explicou o presidente, que acrescentou: “infelizmente, somos presidente, de uma situação que nós não queríamos. Acho que essa força vem de Deus. Deve ter sido planejado lá em cima, para estarmos à frente. Nunca, nunca na minha vida, imaginei, nem o Leo, que isso iria acontecer. E também nunca imaginamos montar uma associação. Fomos articulando e isso aconteceu”.
Sem demagogias, ambos disseram que, em um segundo momento, o grupo servirá também para definir futuras indenizações, e afirmam que ainda não foi conversado nada nesse sentido. “Nosso objetivo não é esse. Nenhum valor vai trazer nossas filhas de volta. Queremos dar apoio uns aos outros e impedir que tragédias semelhantes aconteçam novamente”, destacou o vice-presidente da Associação.


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