A vida de Paulo de Tarso é repleta de passagens exemplares e
ricas em ensinamentos para o nosso dia a dia, como o caso daquela ocorrida
imediatamente após o seu encontro com o Mestre Jesus na estrada de Damasco.
Paulo encontrava-se momentaneamente cego. Ananias, um servidor do Cristo, tem
uma visão com o Mestre na qual ele o convoca para ajudar o perseguidor dos
cristãos. Conhecedor dos seus atos, Ananias retruca, dizendo o quanto tem
ouvido acerca dos males que aquele homem estava fazendo aos irmãos de crença.
Mas Jesus simplesmente lhe diz: “Vai, porque este é para mim um vaso escolhido
para levar o meu nome diante dos gentios, e dos reis e dos filhos de Israel.”
Um vaso escolhido! Alguém muito especial para o Senhor! De fato, Paulo soube
fazer jus à confiança nele depositada naquela hora. Ele foi não somente o
convertido, mas também o redimido, tendo passado para a história do
cristianismo como exemplo de recuperação.
Nos dias atuais, quando nossas penitenciárias e cadeias
estão abarrotadas de pessoas condenadas a cumprir penas por delitos de toda
sorte, temos a impressão de que a maioria da população tem dúvidas sobre a
possibilidade de recuperá-las, de vê-las definitivamente afastadas dos caminhos
do erro.
A verdade é que programas eficazes de ressocialização e
reintegração de presos são escassos entre nós. Abandonados à própria sorte,
convivendo com outros criminosos, vivendo na ociosidade, desqualificados
profissionalmente, é de se esperar que essas pessoas, ao se verem livres,
continuem no crime, reforçando as estatísticas que confirmam serem os mesmos
irrecuperáveis.
Assim como o Mestre Jesus confiou na recuperação de Paulo de
Tarso, uma mulher extraordinária – Maria Ribeiro da Silva Tavares – também
apostou na ressocialização de presos tidos como irrecuperáveis. Viúva aos 24
anos, tendo herdado uma fortuna do marido, causou um verdadeiro rebuliço na sua
família quando decidiu levar presos de alta periculosidade para viver em sua
própria casa, ao lado do filho pequeno. Nessa época – 1936 – ela já trabalhava
como voluntária no Presídio Central de Porto Alegre, o que lhe deu
credibilidade para iniciar um projeto no qual empenhou toda a sua vida: o de
recuperar pessoas consideradas marginais. Começou abrigando 36 presos, aos
quais passou a tratar com dignidade e respeito. A semente frutificou e em 1942
idealizou e fundou, com recursos próprios e ajuda dos detentos, o Patronato
Lima Drumond, em Porto Alegre.
Para melhor realizar seu trabalho, formou-se pouco tempo
depois em Serviço Social. A monografia que apresentou como conclusão de curso
trazia a frase que sintetizou toda a sua crença: “Não existem criaturas
irrecuperáveis, mas métodos inadequados”.
E tem sido com essa filosofia de vida que, durante 72 anos
de atividades ininterruptas, a sua obra vem garantindo atendimento a grupos de
apenados dos regimes aberto e semiaberto, tornando-se referência na
ressocialização e reintegração social de presos. Instituição ímpar, sem grades
ou muros: as pessoas que lá estão, acolhidas com amor, sabem que a forma digna
com que são tratadas e os cursos de qualificação profissional que recebem as
habilitarão para enfrentar o mundo ao saírem da prisão.
Quando lhe perguntavam qual era o segredo de tamanho
sucesso, a assistente social respondia: um tratamento baseado em confiança,
diálogo e respeito. Prova disto era o seu jeito carinhoso de nominar os
residentes no patronato. Para ela todos eram “anjos”. Essa metodologia de ação
lhe permitiu receber em troca consideração e amizade.
Tendo chegado aos 102 anos, nessa época de grande exposição
nas redes sociais, sua imagem, em cadeira de rodas, sendo levada por um dos
seus “anjos” para um banho em uma praia gaúcha correu mundo.
A lição que nos fica é a da certeza de que o amor e a crença
no valor intrínseco da pessoa são capazes de operar milagres. Desde muito
jovem, D. Maria percebeu ser fruto de lares desajustados a maioria das pessoas
que acabaram nas prisões. Entendeu que elas foram crianças abandonadas à
própria sorte, sem a orientação de pais que as encaminhassem ao caminho do bem.
Por isso, também empreendeu campanhas preventivas de amparo à família,
reajustamento do lar e assistência à infância.
E nós fazemos coro com sua fala: precisamos estar atentos à
educação da criança, dando-lhe orientação segura, exemplificando a ética e a
boa moral para que se transformem em homens e mulheres de bem. Assim como Paulo
de Tarso, precisamos levar a mensagem de Jesus aos corações infantis.
*Lúcia Moyses é educadora e escritora espírita - Escreve semanalmente no Jornal Correio Espírita
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