Fonte – CNBB
“A misericórdia foi para ela o ‘sal’, que dava sabor a
todas as suas obras, e a luz que iluminava a escuridão de todos aqueles que nem
sequer tinham mais lágrimas para chorar pela sua pobreza e sofrimento”, disse o
papa Francisco na missa de canonização de Madre Teresa de Calcutá, neste
domingo, 4, na Praça São Pedro, no Vaticano. Participaram da celebração cerca
de 120 mil fiéis de diversos lugares do mundo.
Em sua homilia, Francisco disse que madre Teresa
“inclinou-se sobre as pessoas indefesas, deixadas moribundas à beira da
estrada, reconhecendo a dignidade que Deus lhes dera; fez ouvir a sua voz aos
poderosos da terra, para que reconhecessem sua culpa diante dos crimes e da
pobreza criada por eles mesmos”.
Madre Teresa
Agnes Gonxha Bojaxhiu, o verdadeiro nome da Madre Teresa,
que recebeu o Prêmio Nobel da Paz em 1979, nasceu no dia 26 de agosto de 1910
em Skopje, capital da atual república da Macedônia. Foi a fundadora das
Missionárias da Caridade.
Sua beatificação ocorreu em 2003 depois que o Vaticano reconheceu como
milagre a cura de um tumor no abdômen de uma mulher indiana após colocar uma
fotografia da religiosa em um relicário.
A canonização acontece após o reconhecimento, em julho de
2015, pelo Vaticano, de mais um milagre atribuído a ela. No caso, foi
constatada a cura imediata de um brasileiro que sofria de grave doença
cerebral.
Leia, abaixo, a íntegra da homilia do papa Francisco.
SANTA MISSA E CANONIZAÇÃO DA BEATA
MADRE TERESA DE CALCUTÁ
JUBILEU DOS OPERADORES E DOS VOLUNTÁRIOS DA MISERICÓRDIA
HOMILIA DO PAPA FRANCISCO
Praça São Pedro
Domingo, 4 de setembro de 2016
«Qual o homem que conhece os desígnios de Deus?» (Sab
9,13). Esta interrogação do Livro da Sabedoria, que escutamos na primeira
leitura, apresenta-nos a nossa vida como um mistério, cuja chave de
interpretação não está em nossa posse. Os protagonistas da história são sempre
dois: Deus de um lado e os homens do outro. A nossa missão é perceber o chamado
de Deus e aceitar a sua vontade. Mas para aceitá-la sem hesitar,
perguntemo-nos: qual é a vontade de Deus na minha vida?
No mesmo trecho do texto sapiencial encontramos a
resposta: «Os homens foram instruídos no que é do Vosso agrado» (v 18). Para
verificar a chamada de Deus, devemos perguntar-nos e entender o que Lhe agrada.
Muitas vezes, os profetas anunciam o que é agradável ao Senhor. A sua mensagem
encontra uma síntese maravilhosa na expressão: «Misericórdia quero, e não
sacrifício» (Os 6,6; Mt 9,13). Para Deus todas as obras de misericórdia são
agradáveis, porque no irmão que ajudamos, reconhecemos o rosto de Deus que ninguém
pode ver (cf. Jo 1,18). E todas as vezes em que nos inclinamos às necessidades
dos irmãos, demos de comer e beber a Jesus; vestimos, apoiamos e visitamos o
Filho de Deus (cf. Mt 25,40). Em definitiva, tocamos a carne de Cristo.
Estamos chamados a pôr em prática o que pedimos na oração
e professamos na fé. Não existe alternativa para a caridade: quem se põe ao
serviço dos irmãos, embora não o saibamos, são aqueles que amam a Deus (cf. 1
Jo 3,16-18; Tg 2,14-18). A vida cristã, no entanto, não é uma simples ajuda
oferecida nos momentos de necessidade. Se assim fosse, certamente seria um belo
sentimento de solidariedade humana, que provoca um benefício imediato, mas
seria estéril, porque careceria de raízes. O compromisso que o Senhor pede,
pelo contrário, é o de uma vocação para a caridade com que cada discípulo de
Cristo põe ao seu serviço a própria vida, para crescer no amor todos os dias.
Escutamos no Evangelho que «seguiam com Jesus grandes
multidões» (Lc 14,25). Hoje, a “grande multidão” é representada pelo vasto
mundo do voluntariado, aqui reunido por ocasião do Jubileu da Misericórdia.
Sois aquela multidão que segue o Mestre, e que torna visível o seu amor
concreto por cada pessoa. Repito-vos as palavras do apóstolo Paulo: «Tive
grande alegria e consolação por causa do teu amor fraterno, pois reconfortaste
os corações dos santos» (Flm 7). Quantos corações os voluntários confortam!
Quantas mãos apoiam; quantas lágrimas enxugam; quanto amor é derramado no
serviço escondido, humilde e desinteressado! Este serviço louvável dá voz à fé
– dá voz a fé! - e manifesta a misericórdia do Pai que se faz próximo daqueles
que passam por necessidade.
Seguir Jesus é um compromisso sério e ao mesmo tempo
alegre; exige radicalidade e coragem para reconhecer o divino Mestre no mais
pobre e descartado da vida e colocar-se ao seu serviço. Para isso, os
voluntários que servem os últimos e necessitados por amor de Jesus não esperam
nenhum agradecimento ou gratificação, mas renunciam tudo isso porque
encontraram o amor verdadeiro. E cada um pode dizer: “Como o Senhor veio até
mim e se inclinou sobre mim na hora da necessidade, assim vou ao seu encontro e
me inclino sobre aqueles que perderam a fé ou vivem como se Deus não existisse,
sobre os jovens sem valores e ideais, sobre as famílias em crise, sobre os
enfermos e os prisioneiros, sobre os refugiados e imigrantes, sobre os fracos e
desamparados no corpo e no espírito, sobre os menores abandonados à própria
sorte, bem como sobre os idosos deixados sozinhos. Onde quer que haja uma mão
estendida pedindo ajuda para levantar-se, ali deve estar a nossa presença e a
presença da Igreja, que apoia e dá esperança”. E fazê-lo com a memória viva da
mão do Senhor estendida sobre mim quando eu estava por terra.
Madre Teresa, ao longo de toda a sua existência, foi uma
dispensadora generosa da misericórdia divina, fazendo-se disponível a todos,
por meio do acolhimento e da defesa da vida humana, dos nascituros e daqueles
abandonados e descartados. Comprometeu-se na defesa da vida, proclamando
incessantemente que «quem ainda não nasceu é o mais fraco, o menor, o mais
miserável». Inclinou-se sobre as pessoas indefesas, deixadas moribundas à beira
da estrada, reconhecendo a dignidade que Deus lhes dera; fez ouvir a sua voz
aos poderosos da terra, para que reconhecessem a sua culpa diante dos crimes -
diante dos crimes!- da pobreza criada por eles mesmos. A misericórdia foi para
ela o “sal”, que dava sabor a todas as suas obras, e a luz que iluminava a
escuridão de todos aqueles que nem sequer tinham mais lágrimas para chorar pela
sua pobreza e sofrimento.
A sua missão nas periferias das cidades e nas periferias
existenciais permanece nos nossos dias como um testemunho eloquente da
proximidade de Deus junto dos mais pobres entre os pobres. Hoje entrego a todo
o mundo do voluntariado esta figura emblemática de mulher e de consagrada: que
ela seja o vosso modelo de santidade! Parece-me que, talvez, teremos um pouco
de dificuldade de chamá-la de Santa Teresa: a sua santidade é tão próxima de
nós, tão tenra e fecunda, que espontaneamente continuaremos a chamá-la de
“Madre Teresa”. Que esta incansável agente de misericórdia nos ajude a entender
mais e mais que o nosso único critério de ação é o amor gratuito, livre de
qualquer ideologia e de qualquer vínculo e que é derramado sobre todos sem
distinção de língua, cultura, raça ou religião. Madre Teresa gostava de dizer:
«Talvez não fale a língua deles, mas posso sorrir». Levemos no coração o seu
sorriso e o ofereçamos a quem encontremos no nosso caminho, especialmente
àqueles que sofrem. Assim abriremos horizontes de alegria e de esperança numa
humanidade tão desesperançada e necessitada de compreensão e ternura.
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