Jorge Oliveira
Cascais, Portugal - Nada como um arranca rabo entre
doutos da justiça para os brasileiros saberem o que há muito já se sabe em
Brasília: a Justiça brasileira está podre por dentro e por fora. O bate boca
entre o procurador Janot e o ministro Gilmar Mendes deveria ser louvado com
aplausos porque escancara os bastidores desses homens de preto até então
intocáveis. O desentendimento, a roupa suja, mostra os interesses econômicos
que há por trás do arroubo desses dois senhores. Janot insinua que a mulher de
Mendes, advogada, recebe dinheiro de Eike Batista por trabalhar no escritório
de advocacia de Sérgio Bermudes, que defende o milionário. Chacoalhado,
Bermudes chama Janot de inescrupuloso, mentiroso, ignorante, leviano e
sicofanta (caluniador). E como não bastasse, aponta o dedo na ferida: a filha
de Janot, Letícia Ladeira Monteiro de Barros, defende a OAS, a Braskem e outras
empreiteiras em acordos de leniência envolvidas na Lava Jato.
Janot quer impedir Gilmar de se envolver no processo de
Eike por motivos óbvios, segundo ele, e pede seu afastamento do STF. Esse
também é o pensamento de mais de 500 mil brasileiros em movimento pela rede
social. Mas, e quanto a sua filha? Com a lama que jogou no ventilador, Sérgio
Bermudes agora espera a reação de Janot. Seja qual for, o procurador sai menor
na briga. A partir de agora virou alvo fácil para seus adversários. E não são
poucos. Só de políticos, mais de 200. Se juntar empreiteiras e envolvidos na
Lava Jato enche um caminhão e ainda sobra. Dentro do Ministério Público a
notícia não caiu bem. Procuradores acham que revelações como essas minam o
trabalho da Lava Jato e depõem contra os investigadores isentos que trabalham
para limpar o país dos corruptos.
A virulência com que Bermudes atacou Janot para defender
a mulher do Gilmar é cosia rara no meio jurídico. Normalmente os advogados
temem criticar juízes, procuradores, desembargadores e ministros do STF com
receio de terem seus processos boicotados quando analisados nessas cortes. Não
é o caso de Bermudes que se mostrou muito seguro quando apontou seus mísseis em
direção a Janot, destratando-o com insultos e impropérios típicos de briga de
rua. Esqueceu-se, por um tempo, que o procurador é que está à frente da maior
investigação sobre corrupção da história do país e que em torno dele gravita
homens sérios e honrados que não estão envolvidos em maracutaias.
Espera-se que Janot responda à altura os desaforos de
Bermudes. Mas, para isso, terá que explicar antes por que a sua filha – não se
discute aqui o talento da doutora – aceitou defender os interesses de empresas
envolvidas na Lava Jato que tem o seu pai como principal acusador. Parece-me um
contrassenso. Depois disso bem explicado, o procurador, pelos insultos que
sofreu, não deveria apenas ficar na defensiva. Se quiser ainda levantar a
moral, terá que provar que a mulher de Gilmar, a doutora Guiomar Mendes,
realmente estaria na caixinha de Eike Batista, solto pelo seu marido. Se
convencer, admite-se que pode até permanecer à frente da procuradoria. Caso
contrário, infelizmente, ele teria que entregar o cargo para não deixar seus
auxiliares a duvidarem da sua honradez.
O certo é que os podres da Justiça começam a aparecer. A
trombada entre procuradores, juízes e ministros do STF envolvidos no processo
da Lava Jato já mostra frutos benéficos para a população. O primeiro deles é a
revelação dos bastidores do STF. Como funciona a engrenagem. Sabe-se em
Brasília – e isso não é novidade – que muitos dos ministros do STF não vivem
apenas dos salários, por sinal, fartos. Alguns deles instalam escritórios e ali
alojam filhos, sobrinhos e até amigos para defender causas, muitas delas dentro
dos seus próprios tribunais. Não se sabia, portanto, pelo menos até agora, que
procuradores também tinham adotado esse método, uma espécie de caixa dois para
reforçar o orçamento da família. Ou quem sabe, uma sobra de campanha, como
diria alguns políticos maldosos.
Há quem diga que, por causa dessa idiossincrasia, ser
julgado no STF é a mesma coisa que chegar ao céu sem passar pelo purgatório.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Este blog só aceita comentários ou críticas que não ofendam a dignidade das pessoas.