O diretor-geral da Polícia Federal, Fernando Segovia,
afirmou nesta sexta-feira, em entrevista exclusiva à Reuters, que a tendência é
que a corporação recomende o arquivamento da investigação contra o presidente
Michel Temer no chamado inquérito dos portos.
Segundo o chefe da PF, até o momento as investigações não
comprovaram que houve pagamento de propina por parte de representantes da
empresa Rodrimar, que opera áreas do porto de Santos (SP), para a edição do
decreto que prorrogava contratos de concessão e arrendamento portuários,
assinado por Temer em maio do ano passado.
Essa é a única apuração formal contra o presidente ainda em
curso perante o Supremo Tribunal Federal (STF), requerida ainda pelo então
procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
Segovia disse à Reuters nesta sexta-feira que, nas
apurações feitas, não há quaisquer indícios de que o decreto editado pelo
presidente beneficiou a Rodrimar. Ele destacou que a empresa não era atingida
pelo decreto, que mudou regras de concessão posteriores a 1993, o que não seria
o caso dela.
"O que a gente vê é que o próprio decreto em tese não
ajudou a empresa. Em tese se houve corrupção ou ato de corrupção não se tem
notícia do benefício. O benefício não existiu. Não se fala e não se tem notícia
ainda de dinheiro de corrupção, qual foi a ordem monetária, se é que houve, até
agora não apareceu absolutamente nada que desse base de ter uma
corrupção", disse Segovia.
O diretor-geral da PF também afirmou que a "principal
prova obtida no inquérito", a interceptação de uma conversa entre o
ex-deputado Rodrigo Rocha Loures, ex-assessor especial de Temer, e o subchefe
de Assuntos Jurídicos da Casa Civil, Gustavo Rocha, não mostra concordância de
Temer com o suposto benefício.
Segundo ele, o próprio Gustavo Rocha fala no diálogo que
não há como fazer ou mudar a questão do decreto e que o próprio presidente não
aceitou a mudança que poderia beneficiar a empresa.
"Então, assim, os indícios são muito frágeis, na
realidade, de que haja ou que houve algum tipo de influência realmente, porque
em tese o decreto não foi feito para beneficiar aquela empresa", disse
Segovia.
A suspeita era que o presidente teria recebido propina, por
intermédio de Rocha Loures, para favorecer a Rodrimar. Tanto o ex-assessor
especial quanto Temer já prestaram depoimento no inquérito e negaram
irregularidades. O presidente se manifestou por escrito.
Rocha Loures chegou a ser preso depois que foi filmado pela
PF saindo de um restaurante com uma mala de dinheiro pago por um executivo da
processadora de carnes JBS JBSS3.SA) no âmbito de uma outra investigação. Foi
posteriormente solto e agora é monitorado com uso de tornozeleira eletrônica.
Ele é réu acusado de corrupção no caso envolvendo a mala de dinheiro.
Para Segovia, que assumiu o posto em novembro do ano
passado, durante o governo Temer, a empresa não se beneficiou diretamente
porque o decreto não atingiu o contrato da Rodrimar, ou seja, o "objeto em
tese da corrupção não foi atingido". "Então ficou muito difícil de
ter uma linha de investigação numa corrupção que em tese não ocorreu",
reforçou.
O chefe da PF afirmou que outros depoimentos colhidos na
instrução do inquérito também não conseguiram comprovar o cometimento de crime
pelos investigados.
"No final a gente pode até concluir que não houve
crime. Porque ali, em tese, o que a gente tem visto, nos depoimentos as pessoas
têm reiteradamente confirmado que não houve nenhum tipo de corrupção, não há
indícios de realmente de qualquer tipo de recurso ou dinheiro envolvidos. Há
muitas conversas e poucas afirmações que levem realmente a que haja um
crime", disse.
Segundo ele, ainda há algumas diligências a serem feitas,
mas ele avalia que em no máximo três meses a apuração será concluída.
O diretor-geral disse que, durante a instrução do
inquérito, também foram requisitadas informações de outra investigação
arquivada contra o presidente sobre suposto crime cometido por Temer em um
suposto esquema de cobrança de propina de empresas detentoras de contratos no
porto de Santos, em São Paulo. A intenção seria saber se haveria ligação da
apuração antiga com a atual, uma vez que Temer era líder da bancada do MDB e
poderia ter atuado na indicação de uma das pessoas envolvidas em delitos.
Segovia, entretanto, disse que o envolvimento de Temer se
deu a partir de uma citação em uma audiência de uma pensão alimentícia da
esposa de um ex-diretor da Cia Docas, e isso "caiu por terra" duas
vezes, arquivada pelo Supremo, destacando ainda que a indicação da pessoa teria
sido feita por "várias lideranças políticas", não apenas por Temer.
"Então o inquérito (arquivado) na verdade não se
demonstra aproveitável para qualquer tipo de questionamento. Até porque o que
está sendo apurado e que o Supremo está investigando e tem autorização é
justamente a questão da corrupção na construção desse decreto",
argumentou.
Em respostas a perguntas formuladas pela PF no inquérito,
Temer disse em janeiro que "depositava confiança" em Rocha Loures
quando ele exercia o cargo de assessor especial da Presidência, mas destacou
que nunca pediu-lhe para receber recursos ilícitos em seu nome.
Afirmou ainda que a Rodrimar não foi beneficiada com a
edição dos decretos e que o assunto foi tratado no âmbito de uma comissão do
Ministério dos Transportes.
"MUITO ABERTO"
Segovia criticou a forma de investigação instaurada por
Janot contra Temer. Formalmente, a apuração é por corrupção passiva e tráfico
de influência. O diretor-geral afirma que o ex-chefe do Ministério Público
Federal "deixou o troço muito aberto porque tem um espectro muito maior
para ver se pega alguma coisa".
"É para ver se cata alguma coisa, corrupção, tráfico
de influência... vai que cai em alguma coisa?", questionou. "Aí você
enquadra depois", completou.
Questionado se o inquérito está próximo de ser concluído, o
chefe da PF afirmou que o delegado responsável pelo caso, Cleyber Malta Lopes,
está voltando de um curso no exterior e devem conversar.
"Mas eu acredito que não dure muito mais tempo, não
tem muitas diligências mais a serem feitas. Acredito que em um curto espaço de
tempo deve ter a conclusão dessas investigações", disse.
Para o chefe da PF, há a necessidade de tirar o caso a
limpo, por isso é preciso se aprofundar na investigação, buscar provas em todos
os lugares porque "quando a gente concluir a investigação e não houver
realmente o fato a gente possa afirmar, 'olha não houve crime, não houve o
fato'".
Perguntado se a apuração exaustiva tem por objetivo evitar
questionamentos da imprensa, ele concordou. "Estamos fazendo nosso
trabalho, que é a investigação criminal. Então tudo que for indício que possa
reportar uma possibilidade que ache uma prova que sustente esse tipo de
acusação a gente vai ter que checar. É muito mais uma checagem de tudo que a
gente tem para que no final não dê um veredicto ‘olha checamos tudo e não tem
nada’. 'Ah, mas vocês checaram tudo mesmo?'. Sim, foi tudo verificado",
concluiu.
Caberá à atual procuradora-geral da República, Raquel
Dodge, decidir se eventualmente aceita a recomendação da PF e, se não houver
alguma reviravolta, pedir ao Supremo o arquivamento da apuração, requerer novas
diligências ou ainda, apesar da instrução feita pela PF, oferecer denúncia
contra o presidente.
Raquel Dodge -que é a responsável por conduzir as apurações
contra autoridades com foro privilegiado no STF- não é obrigada a seguir a
sugestão feita pela PF.
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