Sebastião Nery
RIO – Nos primeiros dias depois do golpe militar de 1964,
os governadores de todos os Estados (exceto Miguel Arraes e Seixas Dória, de
Pernambuco e Sergipe, logo presos), vieram ao Rio para o beija-mão ao general
Costa e Silva, chefe do tal “Comando Supremo da Revolução”.
O encontro foi no Ministério da Guerra, no Rio. Magalhães
Pinto, governador de Minas, ia apresentando um a um. Costa e Silva, de pé,
cumprimentava, não dizia nada. Chegou a vez de Petrônio Portela:
– General, governador Petrônio Portela, do Piauí.
Costa e Silva, assustado, arregalou os olhos, fechou a
cara:
– Mas o senhor aqui? O senhor não ficou contra nós?
– Eu me pronunciei pela legalidade, general.
E saiu. Ficou o constrangimento coletivo. Acabada a
cerimônia, desceram todos. Lá embaixo, Petrônio chamou Magalhães:
– Estou liquidado. Ele vai me derrubar.
– Petrônio, para onde você vai? perguntou Magalhães.
– Para a casa do José Cândido Ferraz (senador da UDN do
Piauí).
– Telefono para você daqui a pouco.
Magalhães voltou ao gabinete de Costa e Silva:
– General, percebi que o senhor se surpreendeu com a
presença do governador Petrônio Portela. De fato, no primeiro instante, ele
ficou em dúvida, fez um pronunciamento pela legalidade. Mas é um companheiro
nosso, da UDN, um homem correto, podemos confiar nele.
– Governador, é difícil para a minha gente aceitar isso.
Ele vai ficar em observação e sob a sua responsabilidade. O senhor será o
responsável.
– Obrigado, general. Pode estar tranquilo.
Magalhães foi para a casa de José Cândido. Petrônio tomou
alguns uísques e foi dormir salvo. Mas nunca perdoou Costa e Silva.
Anos depois Magalhães me contou essa historia. Mas, e o
documento? Onde estaria a nota oficial de Petrônio? O escritor Zózimo Tavares,
o mais brilhante jornalista no Piauí, publicou, pela editora do Senado, um
livro-documento: “Petronio Portella”. Com seu texto limpo, exato,Zózimo abre
vida e alma de Petrônio:
– “Na manhã de 31 de março de 64, as rádios anunciavam o
início do movimento armado que sacudiria o país. No dia 1º de abril, Petrônio
surpreendeu com a declaração de que iria publicar nota de apoio à legalidade
constitucional. Resistia aos apelos de amigos, correligionários e familiares.
Se tivesse seguido, poderia ter ficado na espreita, aguardando o desenrolar dos
acontecimentos. Mas ele relutava em adotar uma postura pusilânime diante de
fatos políticos e institucionais tão graves. Tratou de se manifestar logo,
comprometendo o próprio futuro e o da família. Sua formação jurídica e sua
consciência falavam mais alto. Fez a nota oficial”.
– “No momento em que a Nação se encontra a braços com
ameaças de sedição; no instante em que do Sul do País chegam notícias
inquietantes, demonstrativas da possibilidade de vir o nosso país a ser
engolfado pela subversão ameaçadora das instituições democráticas, cumpro o
inarredável dever de levar ao conhecimento dos piauienses que o Governo do
Piauí permanece hoje, como ontem, no firme propósito de defender, sem medir
sacrifícios e indo às últimas consequências, a ordem democrática, os poderes
constituídos, em suma o império da Constituição.
Confio em que o povo colaborará com o Poder Público na
preservação da ordem constitucional” (a) Governador Petrônio Portella.
Petrônio Portela era um profissional. E os profissionais
sabem que o hoje já é o ontem. O que conta é o amanhã. Um oportunista? Não. Os
oportunistas quebram as patas na primeira esquina.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Este blog só aceita comentários ou críticas que não ofendam a dignidade das pessoas.