(13 / 11 / 2018)
Eu sou Hélcio, nascido na Ilha, aos pés das águas...
Vibrante, nascer aos pés das águas!
Verdadeiramente vibrante!
E eu nasci aos pés das águas... Vivo entre as ondas; e
faço das ondas o meu viver...
Noites por noites, e entre as noites, encontro Iemanjá...
Hoje, voei além do hoje!
Ah!
Viajei além do hoje: queria uma poesia!...
Encontrei uma crônica! Uma bela crônica da Martha; e quem gosta de crônicas, conhece a Martha!...
Livros e crônicas da Martha!
São texto encantadores!
E adorei a crônica da Martha..., que hoje encontrei!!!
Vamos ler!...
Vamos!
Crônica de um amor anunciado
Toda pessoa apaixonada é um publicitário em potencial.
Não anuncia cigarros, hidratantes ou máquinas de lavar, mas anuncia seu amor,
como se vivê-lo em segredo diminuísse sua intensidade.
O hábito começa na escola. O caderno abarrotado de regras
gramaticais, fórmulas matemáticas e lições de geografia, e lá, na última
página, centenas de corações desenhados com caneta vermelha. Parece aula de
ciências, mas é introdução à publicidade. Em breve se estará desenhando
corações em árvores, escrevendo atrás da porta do banheiro e grafitando a
parede do corredor: Suzana ama João.
A partir de uma certa idade, a veia publicitária vai
tornando-se mais discreta. Já não anunciamos nossa paixão em muros e bancos de
jardim. Dispensa-se a mídia de massa e parte-se para o telemarketing. Contamos
por telefone mesmo, para um público selecionado, as últimas notícias da nossa
vida afetiva. Mas alguns não resistem em seguir propagando com alarde o seu
amor. Colocam anúncios de verdade no jornal, geralmente nos classificados:
Kika, te amo. Beto, volta pra mim. Everaldo, não me deixe por essa loira de
farmácia. Joana, foi bom pra você também?
O grau máximo de profissionalismo é atingido quando o
apaixonado manda colocar sua mensagem num outdoor em frente a casa da pessoa
amada. O recado é para ela, mas a cidade inteira fica sabendo que alguém está
tentando recuperar seu amor. Em grau menor de assiduidade, há casos em que
apaixonados mandam despejar de um helicóptero pétalas de rosas no endereço do
namorado, ou gastam uma fortuna para que a fumaça de um avião desenhe as
iniciais do casal no céu. A criatividade dos amantes é infinita.
O amor é uma coisa íntima, mas todos nós temos a
necessidade de torná-lo público. É a nossa vitória contra a solidão. Assim como
as torcidas de futebol comemoram seus títulos com buzinaços, foguetório e
cantorias, queremos também alardear nossa conquista pessoal, dividir a alegria
de ter alguém que faz nosso coração bater mais forte. É por isso que, mesmo não
sendo adepta do estardalhaço, me consterno por aqueles que amam escondido, amam
em silêncio, amam clandestinamente. Mesmo que funcione como fetiche, priva o
prazer de ter um amor compartilhado.
Martha Medeiros é escritora
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