Uma pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
(Ipea) revela que 23% dos jovens brasileiros não trabalham e nem estudam
(jovens nem-nem), na maioria mulheres e de baixa renda, um dos maiores
percentuais de jovens nessa situação entre nove países da América Latina e
Caribe. Enquanto isso, 49% se dedicam exclusivamente ao estudo ou capacitação,
13% só trabalham e 15% trabalham e estudam ao mesmo tempo.
As razões para esse cenário, de acordo com o estudo, são
problemas com habilidades cognitivas e socioemocionais, falta de políticas
públicas, obrigações familiares com parentes e filhos, entre outros. No mesmo
grupo estão o México, com 25% de jovens que não estudam nem trabalham, e El
Salvador, com 24%. No outro extremo está o Chile, onde apenas 14% dos jovens
pesquisados estão nessa situação. A média para a região é de 21% dos jovens, o
equivalente a 20 milhões de pessoas, que não estudam nem trabalham.
O estudo Millennials na América e no Caribe: trabalhar ou
estudar? sobre jovens latino-americanos foi lançado hoje (3) durante um
seminário no Ipea, em Brasília. Os dados envolvem mais de 15 mil jovens entre
15 e 24 anos de nove países: Brasil, Chile, Colômbia, El Salvador, Haiti,
México, Paraguai, Peru e Uruguai.
Nem-nem
De acordo com a pesquisa, embora o termo nem-nem possa
induzir à ideia de que os jovens são ociosos e improdutivos, 31% dos deles
estão procurando trabalho, principalmente os homens, e mais da metade, 64%,
dedicam-se a trabalhos de cuidado doméstico e familiar, principalmente as
mulheres. “Ou seja, ao contrário das convenções estabelecidas, este estudo
comprova que a maioria dos nem-nem não são jovens sem obrigações, e sim
realizam outras atividades produtivas”, diz a pesquisa.
Apenas 3% deles não realizam nenhuma dessas tarefas nem
têm uma deficiência que os impede de estudar ou trabalhar. No entanto, as taxas
são mais altas no Brasil e no Chile, com aproximadamente 10% de jovens aparentemente inativos.
Para a pesquisadora do Ipea Joana Costa, os resultados
são bastante otimistas, pois mostra que os jovens não são preguiçosos. “Mas são
jovens que têm acesso à educação de baixa qualidade e que, por isso, encontram
dificuldade no mercado de trabalhos. De fato, os gestores e as políticas
públicas têm que olhar um pouco mais por eles”, alertou.
Políticas públicas
A melhora de serviços e os subsídios para o transporte e
uma maior oferta de creches, para que as mulheres possam conciliar trabalho e
estudo com os afazeres domésticos, são políticas que podem ser efetivadas até
no curto prazo, segundo Joana.
Com base nas informações, os pesquisadores indicam ainda
a necessidade de investimentos em treinamento e educação e sugerem ações
políticas para ajudar os jovens a fazer uma transição bem-sucedida de seus
estudos para o mercado de trabalho.
Considerando a incerteza e os níveis de desinformação
sobre o mercado de trabalho, para eles [jovens] é essencial fortalecer os
sistemas de orientação e informação sobre o trabalho e dar continuidade a
políticas destinadas a reduzir as limitações à formação de jovens, com
programas como o Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec). “Os
programas de transferências condicionadas e bolsas de estudo obtiveram sucesso
nos resultados de cobertura”, diz o estudo.
De acordo com o Ipea, o setor privado também pode
contribuir para melhorar as competências e a empregabilidade dos jovens, por
meio da adesão a programas de jovens aprendizes e incentivo ao desenvolvimento
das habilidades socioemocionais requeridas pelos empregadores, como
autoconfiança, liderança e trabalho em equipe.
No Brasil, por exemplo, segundo dados apresentados pelo
Ipea, há baixa adesão ao programa Jovem Aprendiz. De 2012 a 2015, o número de
jovens participantes chegou a 1,3 milhão, entretanto esse é potencial anual de
jovens aptos para o programa.
É preciso ainda redobrar os esforços para reduzir mais
decisivamente a taxa de gravidez de adolescentes e outros comportamentos de
risco fortemente relacionados com o abandono escolar entre as mulheres e uma
inserção laboral muito precoce entre os homens.
Conhecimento e habilidades
As oportunidades de acesso à educação, os anos de
escolaridade média, o nível socioeconômico e outros elementos, como a
paternidade precoce ou o ambiente familiar, são alguns dos principais fatores
que influenciam a decisão dos jovens sobre trabalho e estudo, de acordo com a
pesquisa. Em todos os países, a prevalência de maternidade ou paternidade
precoce é maior entre os jovens fora do sistema educacional e do mercado de
trabalho.
A pesquisa traz variáveis menos convencionais, como as
informações que os jovens têm sobre o funcionamento do mercado de trabalho,
suas aspirações, expectativas e habilidades cognitivas e socioemocionais. Para
os pesquisadores, os jovens não dispõem de informações suficientes sobre a
remuneração que podem obter em cada nível de escolarização, o que poderia
levá-los a tomar decisões erradas sobre o investimento em sua educação. No caso
do Haiti e do México, essa fração de jovens com informações tendenciosas pode
ultrapassar 40%.
A pesquisa aponta ainda que 40% dos jovens não são
capazes de executar cálculos matemáticos muito simples e úteis para o seu dia a
dia e muitos carecem de habilidades técnicas para o novo mercado do trabalho.
Mas há também resultados animadores. Os jovens analisados, com exceção dos
haitianos, têm muita facilidade de lidar com dispositivos tecnológicos, como
também têm altas habilidades socioemocionais. Os jovens da região apresentam
altos níveis de autoestima, de autoeficácia, que é a capacidade de se organizar
para atingir seus próprios objetivos, e de perseverança.
De acordo com a pesquisa, os atrasos nas habilidades
cognitivas são importantes e podem limitar o desempenho profissional dos
jovens, assim como a carências de outras características socioemocionais
relevantes, como liderança, trabalho em equipe e responsabilidade. Soma-se a
isso, o fato de que 70% dos jovens que trabalham são empregados em atividades
informais. Entre aqueles que estão dentro do mercado formal há uma alta
rotatividade de mão de obra, o que desmotiva o investimento do empregador em
capacitação.
Realidade brasileira
No Brasil há cerca de 33 milhões de jovens com idade
entre 15 e 24 anos, o que corresponde a mais de 17% da população. Segundo a
pesquisadora do Ipea Enid Rocha, o país vive um momento de bônus demográfico,
quando a população ativa é maior que a população dependente, que são crianças e
idosos, além de estar em uma onda jovem, que é o ápice da população jovem.
“É um momento em que os países aproveitam para investir
na sua juventude. Devemos voltar a falar das políticas para a juventude, que já
foram mais amplas, para não produzir mais desigualdade e para que nosso bônus
demográfico não se transforme em um ônus”, disse.
Além das indicações constantes no estudo, Enid também destaca
a importância de políticas de saúde específica para jovens com problemas de
saúde mental, traumas e depressão.
A pesquisa foi realizada em parceria do Ipea com a
Fundación Espacio Público, do Chile, o Centro de Pesquisa para o
Desenvolvimento Internacional (IRDC), o Banco Interamericano de Desenvolvimento
(BID), com apoio do Centro Internacional de Políticas para o Crescimento
Inclusivo (IPC-IG).

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