O Brasil tem 790 barragens de rejeitos de minérios, e mais
de 300 delas não foram classificadas em relação ao seu risco de rompimento e ao
potencial dano que poderia causar ao ambiente e à sociedade.
Um mapa criado pela BBC News Brasil (veja abaixo) com dados
compilados em 2017 pela Agência Nacional de Águas (ANA), com informações da
Agência Nacional de Mineração (ANM), mostra as barragens, sua localização e
classificação, além das empresas responsáveis por elas.
A ANM é o órgão responsável pela fiscalização das
estruturas. O site da agência tem uma lista de barragens que teria sido
atualizada no dia 23 de janeiro, dois dias antes do rompimento da Barragem I da
Vale em Brumadinho, que deixou ao menos 99 mortos, 259 desaparecidos e mais de
170 desalojados.
No entanto, a lista oficial da ANM apresenta um número
menor de barragens do que o divulgado no relatório de segurança de barragens da
ANA no ano passado.
Questionada pela BBC News Brasil, a agência não explicou
por que sua lista atualizada contém 80 barragens a menos, e afirmou que os
funcionários do setor que podem responder às perguntas estão atarefados em
campo, após o desastre de Brumadinho.
Como explorar o mapa?
Entre as 790 barragens que aparecem, cerca de 320 não se
enquadram na Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB), lei federal
aprovada em setembro de 2010.
Para que sejam fiscalizadas, precisam obedecer a critérios
como capacidade acima de 3 milhões de metros cúbicos, 15 metros ou mais de
altura, resíduos perigosos e dano potencial médio ou alto.
A Barragem I de Brumadinho, por exemplo, tinha 86 metros de
altura e armazenava quase 12 milhões de metros cúbicos de rejeitos.
No Brasil, as barragens são categorizadas cruzando a
probabilidade de um rompimento ocorrer - ou seja, o risco e o impacto que
causarão nas comunidades próximas e no meio ambiente se o incidente de fato
acontecer -, o que é chamado de "dano potencial".
Clicando para aproximar o mapa, é possível ver, em amarelo,
as barragens classificadas como de baixo risco. Algumas, no entanto, têm
potencial de dano médio ou alto, como era o caso de Brumadinho.
Em laranja, estão as estruturas consideradas de risco médio
de rompimento. Em vermelho, aparecem as poucas classificadas como alto risco.
Por fim, em cinza, estão todas as que ainda não possuem
classificação. Estas não atendem aos critérios da PNSB. Mas, mesmo assim, a ANM
também não informa qual o seu risco ou dano potencial.
Fonte: Agência Nacional de Águas (confira a lista original)
Mapa feito usando Carto
"Em geral, as barragens sem classificação são menores
e consideradas de risco baixo, mas toda barragem que se rompe tem um dano,
mesmo que seja só para os trabalhadores que estão ali todos os dias. Isso, de
fato, precisa ser analisado", disse à BBC News Brasil Fabio Reis,
presidente da Federação Brasileira de Geólogos e professor da Unesp de Rio
Claro.
"Mas é natural que o foco principal das equipes sejam
as estruturas maiores, que já se sabe que possuem mais risco e mais dano
potencial."
Segundo a lista da ANA, o Brasil tem 13 barragens de
mineração com risco de rompimento médio e dano potencial alto.
Outras 185 represas estão na mesma situação de Brumadinho,
com risco considerado baixo, mas dano potencial alto.
Questionada pela BBC News Brasil, a ANA disse que, em
alguns casos, é possível que algumas das barragens que ainda estão sem
classificação ofereçam risco maior do que se imagina - caso a conservação delas
não esteja sendo feita e informada corretamente.
Como ocorre a fiscalização?
O risco de rompimento nas barragens é medido considerando
características técnicas e de conservação. Estas informações devem ser
fornecidas pelas empresas para o órgão fiscalizador, assim como os planos de
ação em caso de uma emergência e relatórios periódicos de monitoramento e de
conservação.
Mas, nos casos das barragens que obedecem aos critérios da
PNSB, elas também devem receber visitas periódicas de agentes fiscalizadores.
Segundo geólogos e engenheiros ouvidos pela BBC News
Brasil, a fiscalização de barragens no Brasil ainda é limitada e muito
dependente do monitoramento das próprias mineradoras - o que aumenta ainda mais
os riscos da exploração de minério.
A ANM, responsável pela fiscalização, tem apenas 35 fiscais
capacitados para atuar nas barragens de rejeitos de minérios.
Considerando que cerca de 400 barragens precisam de
fiscalização presencial, segundo a PSNB, o número de fiscais é considerado
pequeno por especialistas.
"Se formos olhar, no Brasil, acontece de um deputado
ter (de assessores) a quantidade de fiscais que a ANM tem pra fiscalizar
barragens no país inteiro. Isso é um absurdo. E eles têm muita coisa para
fazer, não é só ir nas barragens", disse Fabio Reis.
De acordo com a ANM, os fiscais também são responsáveis por
monitorar as minas, não apenas as barragens de rejeitos, além de fazer pesquisa
mineral e conferir os relatórios de segurança enviados pelas empresas.
Quantas barragens existem no Brasil?
De acordo com a ANA, que tem a responsabilidade de
consolidar o Relatório de Segurança de Barragens, o Brasil tem pelo menos
24.092 barragens, com diferentes usos.
Elas podem ser usadas para a produção de energia elétrica,
contenção de rejeitos de mineração, disposição de resíduos industriais ou usos
múltiplos da água.
A ANA, no entanto, afirma que esse número pode ser maior.
Sua compilação depende de que os órgãos responsáveis pela fiscalização das
barragens cadastrem as estruturas no sistema de dados do governo.
"O número de barragens com certeza é maior. A maior
parte dessas 24 mil são barragens de pequeno porte, em propriedades
rurais", diz Fabio Reis, da Febrageo.
Destas mais de 24 mil barragens, cerca de 4,5 mil obedecem
aos critérios da PNSB e, portanto, devem ser fiscalizadas regularmente. Mas, de
acordo com a ANA, sobre muitas delas não há informações suficientes para saber
se também deveriam receber agentes.
"Barragens com finalidades diferentes geralmente
também são construídas com métodos diferentes. Há regras que valem para todas,
mas, em geral cada órgão responsável também têm seus critérios para avaliar o
risco de deterioração e os danos que um problema nelas poderia causar",
afirma Reis.
Neste mapa, apenas as barragens de mineração são mostradas.
Minas Gerais possui a maior concentração de barragens de minérios - são 357. Em
segundo lugar vem o Pará, com 109.
Nem todas as barragens da lista continuam recebendo
minérios, mas os dados não informam quais são as inativas.
Mesmo sem receber rejeitos - como era o caso da barragem de
Brumadinho, inativa desde 2015 - elas precisam ser monitoradas constantemente.
A barragem que se rompeu, inclusive, aparece no mapa.
Na última segunda-feira, o governo federal anunciou uma
portaria que recomenda a fiscalização de todas as barragens com alto dano
potencial associado e cobra os órgãos fiscalizadores para que exijam das
empresas responsáveis a atualização dos seus planos de segurança — no entanto,
tudo isso já está previsto na PNSB.


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