Julia Affonso e Luiz
Vassallo/SÃO PAULO e Fabio Serapião e Breno Pires/BRASÍLIA
No pedido de prisão do ex-presidente Michel Temer (MDB), a
força-tarefa da Lava Jato afirmou que o esquema atribuído ao emedebista 'se
valeu de poder político para transformar os mais diversos braços do Estado
brasileiro em uma máquina de arrecadação de propinas'. Michel Temer e seu
aliado e ex-ministro Moreira Franco (Minas e Energia) foram presos nesta
quinta-feira, 21.
TUDO SOBRE A PRISÃO DE TEMER E A OPERAÇÃO DA LAVA JATO
"Michel Temer é o líder de uma organização criminosa,
que ocupou durante ao menos quase duas décadas muitos dos cargos mais
importantes da República, e se valeu de tal poder político para transformar os
mais diversos braços do Estado brasileiro em uma máquina de arrecadação de
propinas", afirmou a Lava Jato.
"O posto de liderança de Michel Temer perante a
organização criminosa é facilmente identificável por diversos aspectos. Ele se
comportava como quem tem o controle da atividade criminosa dos demais
integrantes, de maneira que, mesmo sem ter o conhecimento específico de como
cada um deles está praticando seus crimes, mantém o controle geral do que ou
não ser feito na atividade criminosa da organização. Assim ele é consultado
pelos outros integrantes em momentos críticos e estratégicos dos rumos a serem
tomados pela organização, bem como em eventuais embates internos entre
integrantes subalternos."
A Lava Jato afirmou ainda. "Michel Temer, como líder
da organização criminosa, possuía ascendência sobre todos os núcleos,
especialmente o político e o financeiro, se relacionando ainda com a cúpula do
núcleo empresarial, isto é, com os donos de grandes empresas dispostos a
pagarem propina. Reforça essa liderança de Michel Temer perante a organização
criminosa os cargos de chefia tanto sem seu partido, como cargos
políticos."
Segundo o Ministério Público Federal, 'por quase 40 anos a
parceria criminosa atua de forma estável, perpetuando-se por décadas'.
"Há demonstração concreta de que Michel Temer acumulou
um "crédito" de propina para receber no presente e no futuro, durante
anos, pois os seus atos que beneficiaram o setor empresarial permitiram a
barganha de uma "poupança de propina" com resgate quase que
vitalício", declararam os procuradores.
Entenda a investigação contra Michel Temer
O ex-presidente recebeu voz de prisão da Polícia Federal
quando saía de sua residência logo no início da manhã, na rua Bennet, no Jardim
Universidade, zona oeste da capital paulista. A PF fez buscas na casa de Temer
e também em seu escritório.
A Polícia Federal cumpre um total de oito mandados de
prisão preventiva e dois de custódia temporária, 26 de busca e apreensão nos
Estados do Rio de Janeiro, de São Paulo e do Paraná e no Distrito Federal.
O juiz Marcelo Bretas, da 7.ª Vara Criminal Federal do Rio,
mandou custodiar por tempo indeterminado o coronel reformado da Polícia Miliar
João Baptista Lima Filho - o coronel Lima -, de sua mulher de Maria Rita
Fratezi, dos empresários Carlos Alberto Costa, Carlos Alberto Costa Filho,
Vanderlei de Natale e Carlos Alberto Montenegro Gallo. O juiz ainda decretou as
custódias temporárias de Rodrigo Castro Alves Neves e Carlos Jorge Zimmermann.
O magistrado ordenou busca e apreensão nos endereços desses
investigados, assim como da filha do ex-presidente Maristela Temer, do
almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva, de Ana Cristina da Silva Toniolo e de
Nara de Deus Vieira. Também foram realizadas buscas nas empresas vinculadas aos
investigados.
A ação que prendeu Temer e seus aliados é decorrente da
Operação Radioatividade, que mirou um esquema de cartel, corrupção ativa e
passiva, lavagem de capitais e fraudes à licitação que atuou na construção da
usina nuclear de Angra 3.
A nova investigação apura pagamentos ilícitos feitos por
determinação do empreiteiro José Antunes Sobrinho, ligado à Engevix, para 'o
grupo criminoso liderado por Michel Temer, bem como de possíveis desvios de
recursos da Eletronuclear para empresas indicadas pelo referido grupo'.
A Lava Jato identificou um 'sofisticado esquema criminoso
para pagamento de propina na contratação das empresas Argeplan, AF Consult Ltd
e Engevix para a execução do contrato de projeto de engenharia eletromecânico
01, da usina nuclear de Angra 3'. O Ministério Público Federal afirmou que a
Argeplan, de coronel Lima, 'participou do consórcio da AF Consult LTD, vencedor
da licitação para a obra da Usina Nuclear de Angra 3, apenas para repassar
valores a Michel Temer'.
Segundo a Procuradoria, a AF Consult do Brasil e a Argeplan
não tinham pessoal e expertise suficientes para a realização dos serviços, e,
por isso, houve a subcontratação da Engevix. No curso do contrato, conforme a
investigação, coronel Lima solicitou ao sócio da empresa Engevix o pagamento de
propina, em benefício de Michel Temer.
A Lava Jato destaca que a propina foi paga no final de 2014
com transferências totalizando R$ 1,91 milhão da empresa da Alumi Publicidades
para a empresa PDA Projeto e Direção Arquitetônica, controlada pelo coronel
Lima.
Para justificar as transferências de valores foram
simulados contratos de prestação de serviços da empresa PDA para a empresa
Alumi.
O empresário que pagou a propina afirma ter prestado contas
de tal pagamento para o coronel Lima e para Moreira Franco.
As investigações apontaram que os pagamentos feitos à
empresa AF Consult do Brasil ensejaram o desvio de R$ 10, 859 milhões, 'tendo
em vista que a referida empresa não possuía capacidade técnica, nem pessoal
para a prestação dos serviços para os quais foi contratada'.
De acordo com a Lava Jato, o esquema 'praticou diversos
crimes envolvendo variados órgãos públicos e empresas estatais, tendo sido
prometido, pago ou desviado para o grupo mais de R$ 1,8 bilhão.
A investigação aponta que diversas pessoas físicas e
jurídicas usadas de maneira interposta na rede de lavagem de ativos de Michel
Temer continuam recebendo e movimentando valores ilícitos, além de permanecerem
ocultando valores, inclusive no exterior.
Os procuradores afirmam que 'quase todos os atos comprados
por meio de propina continuam em vigência e muitos dos valores prometidos como
propina seguem pendentes de pagamento ao longo dos próximos anos'.
Segundo a força-tarefa, as apurações também indicaram uma
espécie de braço da organização, especializado em atos de contrainteligência, a
fim de dificultar as investigações, tais como o monitoramento das investigações
e dos investigadores, a combinação de versões entre os investigados e,
inclusive, seus subordinados, e a produção de documentos forjados para
despistar o estado atual das investigações.
O Ministério Público Federal requereu a prisão preventiva
de alguns dos investigados, pois, todos esses fatos somados apontam para a
existência de uma organização criminosa em plena operação, envolvida em atos
concretos de clara gravidade.
COM A PALAVRA, O CRIMINALISTA ANTONIO CLAUDIO MARIZ DE
OLIVEIRA
"A decretação da prisão preventiva de Michel Temer
surpreendeu o mundo jurídico e a sociedade brasileira com certeza tendo em
vista a sua flagrante desnecessidade. Não se tem conhecimento de nenhum fato
que autorizasse essa medida de força uma vez que Michel Temer, desde que saiu
da Presidência está, como sempre esteve, pronto a responder a qualquer
intimação da Justiça ou da polícia, não tendo sido, no entanto, procurado por
nenhuma autoridade policial ou judiciária."
O presidente estava levando uma vida de inteiro
conhecimento público, diariamente em seu escritório e em sua casa à noite. Não
estava programando nenhuma viagem, estando, portanto, isento de qualquer medida
que cerceasse a sua liberdade. Por tais razões sua prisão nos parece
absolutamente desnecessária."
COM A PALAVRA, O ADVOGADO EDUARDO CARNELÓS, QUE DEFENDE
MICHEL TEMER
O advogado Eduardo Carnelós, que defende Michel Temer,
afirmou que a prisão do ex-presidente 'é uma barbaridade'.
A prisão do ex-Presidente Michel Temer, que se deu hoje,
constitui mais um, e dos mais graves!, atentados ao Estado Democrático e de
Direito no Brasil.
Os fatos objeto da investigação foram relatados por delator,
e remontam ao longínquo 1° semestre de 2014. Dos termos da própria decisão que
determinou a prisão, extrai-se a inexistência de nenhum elemento de prova
comprobatório da palavra do delator, sendo certo que este próprio nada
apresentou que pudesse autorizar a ingerência de Temer naqueles fatos.
Aliás, tais fatos são também objeto de requerimento feito
pela Procuradora-Geral da República ao STF,
e o deferimento dele pelo Ministro Roberto Barroso, para determinar
instauração de inquérito para apurá-los, é objeto de agravo interposto pela
Defesa, o qual ainda não foi julgado pelo Supremo.
Resta evidente a total falta de fundamento para a prisão
decretada, a qual serve apenas à exibição do ex-Presidente como troféu aos que,
a pretexto de combater a corrupção, escanecem das regras básicas inscritas na
Constituição da República e na legislação ordinária.
O Poder Judiciário, contudo, por suas instâncias recursais,
haverá de, novamente, rechaçar tamanho acinte.
Eduardo Pizarro Carnelós
COM A PALAVRA, O ADVOGADO ANTÔNIO SÉRGIO MORAES PITOMBO,
QUE DEFENDE MOREIRA FRANCO
"A defesa de Wellington Moreira Franco vem manifestar
inconformidade com o decreto de prisão cautelar. Afinal, ele encontra-se em
lugar sabido, manifestou estar à disposição nas investigações em curso, prestou
depoimentos e se defendeu por escrito quando necessário. Causa estranheza o
decreto de prisão vir de juiz de direito cuja competência não se encontra ainda
firmada, em procedimento desconhecido até aqui."
COM A PALAVRA, O MDB
NOTA DO MDB
O MDB lamenta a postura açodada da Justiça à revelia do
andamento de um inquérito em que foi demonstrado que não há irregularidade por
parte do ex-presidente da República, Michel Temer e do ex-ministro Moreira
Franco. O MDB espera que a Justiça restabeleça as liberdades individuais, a
presunção de inocência, o direito ao contraditório e o direito de defesa.
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