O Brasil avança desenfreadamente em número de escolas
médicas – 256 até o momento –, constituindo uma realidade que coloca em sério
risco a formação, em detrimento à qualidade do ensino. A avaliação é do
presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), Carlos Vital, que nesta
sexta-feira (10) criticou o anúncio dos ministérios da Saúde e da Educação de
criação de novos cursos de Medicina em instituições privadas no Brasil. “É
fundamental compreender que essa interferência autoritária nos processos de
ensino e formação médica não resolve a crise da assistência à Saúde e de que a
persistência desses equívocos resultará em danos irreparáveis à sociedade, ao
prestígio da Medicina e ao bom conceito daqueles que a exercem”, alertou o
presidente.
“Ignora-se o impacto desse processo na segurança do paciente
e no ético desempenho da Medicina, surgindo um ciclo vicioso, onde alunos mal
preparados serão médicos e educadores com pouca formação e limitações inaceitáveis
no exercício das suas especialidades”. Ele defende que, ao invés de fomentar a
expansão de novos cursos, o governo assuma a responsabilidade de oferecer
condições de trabalho, equipe multiprofissional, rede de referência e
contrarreferência, possibilidade de progressão funcional e de acesso a cursos
de educação continuada.
“Argumenta-se que a abertura dessas escolas fixará futuros
médicos em áreas de difícil provimento. Essa é uma falácia populista e
demagógica, paradoxal à ética da responsabilidade social e que desrespeita ou
desconsidera a qualidade do ensino a ser oferecido”, contestou o presidente.
Para o médico, uma das principais soluções para a fixação é a criação de uma
carreira essencial de estado para a categoria dentro do SUS, que asseguraria
vínculo estável – por meio de concurso – e uma remuneração compatível com a
formação e a dedicação exclusiva.
Segundo um estudo elaborado em 2012 pelo ex-secretário de
Gestão do Trabalho do Ministério da Saúde e professor da Universidade de São Paulo,
Milton Arruda, feito com base nos tamanho da população brasileira e de médicos,
dentre outros aspectos, não seria necessário nenhuma nova medida além das que
já foram tomadas para ampliar o número de profissionais no País nos próximos
anos. “Ações que excedam este limite podem trazer preocupante desequilíbrio
nesta relação, com repercussões na qualidade dos futuros médicos e do
atendimento prestado. Sem qualquer nova medida, em aproximadamente 15 anos já
teríamos 4,4 médicos por mil habitantes, taxa superior a qualquer país no
mundo”, lamento.
Qualidade – Atualmente os 256 cursos de Medicina oferecem,
por ano, quase 23 mil novas vagas. No mundo, apenas a Índia supera essa
quantidade, com 381 escolas. “São dados que constituem uma realidade fática que
coloca em sério risco a formação profissional dos médicos no País”, disse
Vital.
Ele lembra ainda que, números divulgados no fim de 2014 pelo
próprio Ministério da Educação mostram que, de 154 cursos de Medicina já em
atividade e avaliados, 27 (17,5%) receberam nota “dois” no Conceito Preliminar
de Curso (CPC), indicador de qualidade das graduações, no qual são levados em
consideração fatores como titulação dos professores e infraestrutura. Em outras
palavras, tais cursos foram classificados como insatisfatórios.
Controle e avaliação – “Defendemos a adoção de eficiente
processo de avaliação progressiva dos discentes e dos cursos de graduação, sob
rígido controle social, bem como um sistema independente de governo, dotado de
credibilidade social, para acreditação das Escolas Médicas”, comentou Vital, ao
comentar o Sistema Nacional de Acreditação das Escolas Médicas (Saeme),
plataforma lançada pelo CFM em parceria com a Associação Brasileira de Educação
Médica (Abem).
“O País precisa de atitudes sérias e coerentes com o ensino
médico de qualidade e com uma política de Saúde que enfrente as deficiências do
sistema público, com efetivo controle e avaliação, aumento do financiamento,
melhor gestão administrativa e com o reconhecimento de que o acesso ao atendimento
eficaz passa pela valorização dos recursos humanos, com a criação de uma
carreira de Estado no SUS e com a promoção de dignas condições de trabalho”,
asseverou.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Este blog só aceita comentários ou críticas que não ofendam a dignidade das pessoas.