Dom Walmor Oliveira de Azevedo - Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte - MG
A humanidade sofre sérias consequências quando deixa de
investir na unidade interior - ponto de equilíbrio e sustentação que permite a
cada pessoa agir de modo assertivo nos diversos campos da vida. Sem a unidade
interior, as muitas possibilidades oferecidas pela inteligência humana não são
suficientes para superar os obstáculos que pesam sobre a humanidade. E, muitas
vezes, o “progresso” desconsidera as estaturas humanitária e espiritual que
precisam permear as atitudes de cada pessoa. Percebe-se, frequentemente, um descompasso
entre a dimensão existencial e a posição que se ocupa, no campo profissional ou
no exercício de outras responsabilidades. Para além da competência técnica, da
experiência ou da força política, é preciso investir na unidade interior, o
ponto de equilíbrio.
Mas não se busca esse caminho. Concentra-se fortemente, e
até exclusivamente, nos projetos que resultam em conquistas de poder, nas
oportunidades que garantam ganhos financeiros. Tudo a partir de uma compreensão
equivocada do que é bem-estar, considerado apenas como a experiência de se
usufruir das coisas, das benesses. Esse modo de compreender obscurece o olhar
humano, que não consegue mais enxergar a necessidade do investimento na unidade
interior. Há uma exigência fundamental que deve desafiar todo indivíduo: o
cuidado com o próprio “poço”. Há um “poço interior” que alicerça a conduta de
cada pessoa e define os rumos de suas escolhas. Incide, determinantemente,
sobre a qualidade dos exercícios cidadãos, profissionais e familiares. A medida, portanto, não está “do lado de
fora”. Decisivo e mais importante é o “poço”, a interioridade de cada pessoa,
responsável pela consciência, pelos sentimentos e pela articulação humanística
dos valores.
A interioridade é que gera a competência para as ações
cidadãs. Sem investir nesse âmbito, os comprometimentos são muitos, a
mediocridade torna-se regra. Não basta ter alcançado um título, vencido
eleições, ocupar cargos e nem mesmo a convicção de se estar onde está por ser
merecido. Cada pessoa deve mensurar seus atos, considerando a qualidade de suas
intervenções e sua influência nos necessários processos de transformação. Tudo
temperado por uma simplicidade que forja um tecido cultural de respeito e de
unidade. Assim é possível superar
descompassos que estabelecem o caos na sociedade.
A humanidade perdida precisa, com mais velocidade,
reencontrar rumos. Por isso, a importância do empenho em buscar a unidade
interior, alicerce para condutas adequadas, balizadas por valores que podem
deter os problemas humanitários, a exemplo das guerras, migrações forçadas,
insensibilidade diante da dor dos pobres e crescimento incontrolável da
violência. Em busca da unidade interior, há um percurso a trilhar: é preciso e
urgente investir em uma espiritualidade que possibilite aprender a lidar com a
interioridade. E que contribua, assim, com o exercício diário de limpar o
próprio “poço”. A espiritualidade pode qualificar o sentir e o agir de cada
indivíduo, tornando-o instrumento de construção da solidariedade e da cultura da
paz.
Chega agora, mais uma vez, a oportunidade de ouro para se
investir na unidade interior e requalificar o tecido humano: a vivência da
Semana Santa, a Semana Maior. Não como um “feriadão”, mas reconhecendo nesse
tempo a chance de se fazer um fecundo retiro espiritual. Esse exercício é
fundamental para limpar a própria interioridade de tudo o que se origina nos
limites e fragilidades humanas. O segredo é fixar o olhar em Jesus Cristo. De modo silencioso e amoroso, deixar-se tocar
por seus gestos, por suas palavras e pelo acolhimento de suas indicações. Uma
experiência que não pode ser substituída por futilidades, pela fugacidade de
sensações.
Vale a pena vivenciar e engajar-se na celebração da
Semana Santa, no coração da própria família e na comunhão da comunidade de fé,
compreendendo o sentido de cada uma dessas celebrações. Um investimento forte e
determinante na ordem pessoal e social para renovar a unidade interior,
alicerce que sustenta as competências e a vida cidadã. Eis um remédio
indispensável.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Este blog só aceita comentários ou críticas que não ofendam a dignidade das pessoas.