José Sarney
Ao discursar nas Nações Unidas, em 1989, tive a oportunidade
de afirmar que “o caminho do desenvolvimento passa pela democracia”. A
definição mais simples e mais antiga dela é a grega, cujos princípios básicos
estão no discurso de Péricles, grande general e orador, aos mortos na guerra do
Peloponeso, entre Atenas e Esparta.
Ali ele define democracia pela junção de duas palavras
gregas: governo do povo. E define a obediência às leis (estado de direito, que
James Harrington, citando Aristóteles, sintetizou, milênios depois, como
governo das leis e não dos homens); igualdade de todos; democracia
representativa, isto é, não ser o governo de um só homem, mas de muitos, sempre
escolhidos pelo povo etc. Lincoln, na beleza com que escrevia, aprimorou sua
definição para: Governo do povo, pelo povo e para o povo; já Churchill, com
cruel realismo, disse: É a pior forma de governo, exceto todas as outras.
Esta introdução é para dizer que as eleições são a
essência da democracia. É por meio dela que o governo democrático se constitui.
Por isso tem que ser limpa, sem deformação da interferência do poder político,
econômico, militar e da fraude. Até hoje não conseguimos afastar essas ameaças,
embora contra elas lute-se sempre.
Tivemos uma eleição atípica no último dia 7. E o
resultado também foi assim. O país vive um caos institucional — como no
universo de Einstein, sempre em expansão, os poderes ocupando espaços veloz e
autoritariamente, um querendo engolir o outro. Por outro lado, tornou-se um
país dividido, marcado pelo ódio e pela pregação da divisão de classes, pela
insegurança jurídica — desapareceram a coisa julgada e o direito adquirido —,
por leis circunstanciais e casuísticas desintegrando o estado de direito. Nesse
clima, com trinta e nove partidos, uma Câmara de Deputados atomizada e o Senado
também, sem falar na qualidade da representação, é impossível governar.
Mas fico feliz, pois, esquecendo tudo isso, sei que o
País vai superar suas septicemias e vamos viver um Brasil que se contorce, mas
que vai ressurgir.
Muito pior vivi eu, em 1985, quando Tancredo morreu e
assumi a presidência da República. Mas comandei a transição, deixei a
Democracia restaurada e o país andando.
Infelizmente, a Constituição de 1988, feita com os olhos
no retrovisor, sem ver a sociedade do futuro, tornou o País ingovernável, e um
anarcopopulismo levou-nos ao caos que atravessamos.
Como dizia Machado de Assis: aos vencedores as batatas.
Mas que tenham sorte. São meus votos.
José Sarney
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Este blog só aceita comentários ou críticas que não ofendam a dignidade das pessoas.