quarta-feira, 13 de setembro de 2023

A ALMA DO MUNDO - do poeta Luís Augusto Cassas


A ALMA DO MUNDO

Luís Augusto Cassas



Tenho três milhões de anos

e carrego o peso da eternidade

Resplandece o ouro em meus poemas

e habita a prata nos cabelos

mas é o chumbo que prende

meus pés ao solo

Cegam-me as manhãs ensolaradas

Agasalham-me as noites frias

Volteia Mercúrio o Demiurgo

em paisagens do quintal íntimo

lá onde sou condenado

ao exílio e à distância

Minha companhia – o horizonte

Silêncio e recolhimento

eis os nomes da minha pátria

Não há mais campinas acesas

nem pássaros em minha alma

a não ser a árvore da vida

que sustenta a queda do seu fruto

e o distante chamado do sino

de uma igrejinha desbotada

Os guindastes das vértebras

arqueiam-me aos ventos da rua

Meus passos sonham países

de distâncias interrompidas

A sabedoria orquestrada

e a loucura rediviva

misturam-se ao rio dos nervos

e ofertam cálice à serenidade

Quem sou senão uma nuvem

pregada contra o céu plúmbeo?

Suplico a Quíron um tempo de paz

distribuo pães às ondas

oferto pétalas ao sol

Em mim floresce

o irresistível charme

dos que vão morrer:

a lâmpada de cicatrizes

e a fuligem do sol

Súbito irrompe a poesia transfigurada

e atravessa-me com força sutil e alada:

“– Sou a alma do mundo”!

 

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