A ALMA DO MUNDO
Luís Augusto Cassas
Tenho três milhões de anos
e carrego o peso da eternidade
Resplandece o ouro em meus poemas
e habita a prata nos cabelos
mas é o chumbo que prende
meus pés ao solo
Cegam-me as manhãs ensolaradas
Agasalham-me as noites frias
Volteia Mercúrio o Demiurgo
em paisagens do quintal íntimo
lá onde sou condenado
ao exílio e à distância
Minha companhia – o horizonte
Silêncio e recolhimento
eis os nomes da minha pátria
Não há mais campinas acesas
nem pássaros em minha alma
a não ser a árvore da vida
que sustenta a queda do seu fruto
e o distante chamado do sino
de uma igrejinha desbotada
Os guindastes das vértebras
arqueiam-me aos ventos da rua
Meus passos sonham países
de distâncias interrompidas
A sabedoria orquestrada
e a loucura rediviva
misturam-se ao rio dos nervos
e ofertam cálice à serenidade
Quem sou senão uma nuvem
pregada contra o céu plúmbeo?
Suplico a Quíron um tempo de paz
distribuo pães às ondas
oferto pétalas ao sol
Em mim floresce
o irresistível charme
dos que vão morrer:
a lâmpada de cicatrizes
e a fuligem do sol
Súbito irrompe a poesia transfigurada
e atravessa-me com força sutil e alada:
“– Sou a alma do mundo”!

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