SÃO PAULO - E-mails apreendidos pela Polícia Federal (PF) nas buscas realizadas na sede da Odebrecht em junho deste ano, em São Paulo, mostram uma relação de influência e intimidade da empresa junto ao Palácio do Planalto, durante os governos Dilma e Lula. Nas mensagens, o presidente da empresa, Marcelo Odebrecht, tenta influenciar diretamente o que o será dito pelos presidentes a chefes de estados de outros países em agendas oficiais, sugerindo a postura presidencial nos encontros. A pressão surte efeito. Em mensagem para executivos da construtora, o então ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Miguel Jorge, escreveu que Lula fez lobby pela empresa em um dos encontros com líderes estrangeiros, em 2007.
Nos e-mails, a Odebrecht atua para evitar a escolha de um
secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia que ele considerava
prejudicial à Odebrecht. Os documentos mostram, pela primeira vez, que o chefe
de gabinete de Lula, Gilberto Carvalho, era um dos elos entre a empreiteira e o
presidente, de acordo com a interpretação da PF. Carvalho nega. Para os
investigadores, o ex-chefe de gabinete é o "seminarista" a quem
Marcelo se refere em mensagens. No governo Dilma o papel do “seminarista”
passou a ser cumprido por Giles Azevedo, chefe de gabinete da presidente, e Anderson
Dorneles, assistente pessoal de Dilma. Os dois recebiam mensagens enviadas
diretamente por Marcelo Odebrecht, em nome dos interesses da empresa.
Em 5 de junho de 2012, quatro dias antes do encontro de
Dilma com o presidente da República Dominicana, Danilo Medina, Marcelo
encaminhou para Giles e Anderson uma nota com sugestões para a pauta da
reunião. No documento, ele diz "ser importante" Dilma
"reforçar" dois pontos na conversa: "a confiança que tem na
Organização Odebrecht em cumprir os compromissos assumidos" e "a
disposição de, através do BNDES, continuar apoiando as exportações de bens e
serviços do Brasil, dando continuidade aos projetos de infraestrutura
prioritários para o país".
O GLOBO verificou que o encontro com Medina consta da agenda
oficial da presidente. Em entrevista para jornalistas depois do encontro, o
presidente da República Dominicana disse ter recebido aceno do governo
brasileiro para obter financiamento para construção de duas usinas no país. O
projeto seria contemplado dois anos depois, ao custo de US$ 656 milhões. De US$
2,5 bilhões emprestados pelo BNDES a empresas brasileiras entre 2003 e 2015
para contratos na República Dominicana, US$ 2 bilhões foram desembolsados em
favor da Odebrecht.
"MEIO CAMINHO ANDADO"
As mensagens de Marcelo para Lula eram enviadas por meio de
Alexandrino Alencar, diretor da empresa mais próximo ao petista, preso na
operação Lava-Jato. As recomendações eram dadas por meio de documentos que
tinham o mesmo título, "ajuda memória". Na véspera de uma visita do
presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, ao Brasil, em 2 de maio de 2005,
Marcelo Odebrecht pediu a Lula que reconhecesse o papel de Santos como
"pacificador e líder regional", e fizesse menção às ações realizadas
por empresas brasileiras em Angola, com destaque para a Odebrecht.
"Dr. Alex, aqui está o documento. Dr. Marcelo pede-lhe
a gentileza de encaminhar ao seminarista", escreveu Darci Luz, secretária
de Marcelo, a Alexandrino Alencar. No dia seguinte, Lula receberia Santos com
discurso mencionado a forma como ele "soube liderar Angola na conquista da
paz" , e saudando-o por sua "perseverança e visão de futuro". No
discurso, o então presidente citou o projeto da hidrelétrica de Capanda,
mencionado no mesmo e-mail de Marcelo Odebrecht como um exemplo da cooperação
entre os dois países:
"Reforçamos, assim, um mecanismo financeiro que tem
sido o grande motor da expansão dos investimentos brasileiros em Angola. A
hidrelétrica de Capanda, símbolo maior da presença econômica brasileira em Angola,
não teria sido possível sem a linha de crédito (do BNDES)", discursou
Lula.
Ao ser convidado pelo presidente petista para almoço com o
presidente da Namíbia, em Brasília, em fevereiro de 2009, Marcelo respondeu com
cópia para seus diretores: "Pode ser uma boa oportunidade em função de
nossa hidrelétrica (Capanda). Seria importante enviar uma nota memória antes
via Alexandrino com eventualmente algum pedido que Lula deve fazer por
nós".
Horas antes do almoço, o executivo da Odebrecht Marcos
Wilson escreveu ao então ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio,
Miguel Jorge, pedindo que manifestasse ao presidente Lula "sua confiança
na capacidade da Odebrecht" assumir o projeto de uma hidrelétrica
binacional (Namíbia e Angola) na África. Miguel Jorge respondeu:
"Estive e o PR (presidente) fez o lobby. Aliás, o PR
(presidente) da Namíbia é quem começou - disse que será licitação, mas que
torce muito para que os brasileiros ganhem, o que é meio caminho andado".
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