quarta-feira, 27 de fevereiro de 2019

Palocci, o esperto, agora vai gastar os R$45 milhões


Jorge Oliveira


Rafina, Grécial – Quando Lula soube que o Palocci iria fazer delação premiada, saiu-se com essa: “O Palocci é muito esperto vai dar um nó nesses caras”, referindo-se aos procuradores do Ministério Público que investigam a Lava Jato. Não deu outra. Condenado a doze anos de prisão, o ex-ministro da Fazenda cumpriu apenas dois. O ano passado voltou para casa para administrar os R$ 45 milhões que restaram do seu patrimônio.

A Lava Jato descobriu que Palocci e seus familiares ocultavam bens no valor de R$ 80 milhões. Como ele foi condenado a pagar R$ 35 milhões de multa restaram, portanto, R$ 45 milhões para uma vida confortável até o final de seus dias. O crime compensa? Compensa, sim, para aqueles que como Palocci saquearam os cofres públicos e hoje estão soltos. Eles viram na delação premiada o caminho mais curto para deixar a cadeia, mesmo que não sustentem boa parte das acusações que fazem diante dos procuradores da Lava Jato, prova disso é que nenhum dos nomes apontados por Palocci foi condenado até hoje.

Palocci é um caso clássico de um beneficiário dessas benesses que a justiça oferece àqueles que se arrependem e topam puxar o fio do novelo para que se chegue aos chefes da máfia. A deleção premiada existe em vários países do mundo. Ela é usada para que a justiça identifique os cabeças do crime oferecendo o benefício da pena aos que cometem delitos menores.

Mas, aqui, no Brasil, a deleção foi desvirtuada: os pequenos estão na cadeia e os criminosos poderosos estão em casa. Chamar-se-ia isso de “deleção à brasileira”, única no mundo, com suas peculiaridades tupiniquins. No afã de mostrar serviço ou responder ao clamor da sociedade, alguns procuradores se perderam no meio do caminho. Outros, de alguma forma, movidos pela vaidade excessiva, deixaram-se ser atraídos, como mariposas, pelos refletores.

Assim, para atender o clamor das ruas, o MP judicializou a política como se a política estivesse desassociada da sociedade, como uma coisa imprestável, perversa, que devesse ser varrida do mapa por estar contaminada por representantes carcomidos pela corrupção.

Dessa forma, os procuradores deixaram os autos processuais de lado para se pronunciarem politicamente, apresentando-se como os paladinos de uma sociedade que clama por justiça. Foram complacentes com os corruptores, os grandes empresários, e generalizaram os políticos e a política, renegando-os como filhos malditos como se a política não fosse intrínseca à arte de governar, de administrar, na sua essência.

Esqueceram de apurar a corrupção quando ela bateu à porta da própria Procuradoria-Geral da República e envolveu auxiliares próximos de Rodrigo Janot, a exemplo dos procuradores Ângelo Goulart Villela e Marcelo Miller, cuja denúncia caiu no esquecimento. Faltou vassoura para varrer a sujeira para fora.

Aos poucos, gente importante, condenada na Lava Jato, foi deixando a cadeia mais cedo do que os políticos, como se a balança da Justiça pendesse apenas para um lado. Nessa esteira do perdão e da benevolência, Palocci é um caso que chama a atenção. Suas delações até hoje não levaram ninguém à prisão.

Uma de suas revelações tão esperada seria a do esquema dos bancos na engrenagem da corrupção, como colaboradores do PT em todas as campanhas. Iria colocar sobre a mesa, enfim, a máfia financeira e apontar os banqueiros envolvidos na patifaria. Bazófia pura. Mais uma vez levou os procuradores na conversa. Pelo menos, que se saiba, até agora nada aconteceu. E se revelou, as informações estão sob sigilo.

Palocci sabe mais do que disse até agora. Ele foi o Capo di tutti capi do partido desde que foi prefeito de Ribeirão Preto, onde deixou um imenso rastro de corrupção. Mesmo assim, assumiu todos os cargos relevantes do governo e manteve com ele a chave do cofre para promover os negócios escusos. Espertamente, ao fazer as delações, concentrou-se em vazar algumas historinhas do Lula e da Dilma, nada que os comprometessem mais do que já estavam comprometidos. Fez da sua desfiliação partidária um estardalhaço danado para mostrar que a partir dali ele seria o homem mau do PT.

Em um dos seus depoimentos, Palocci tentou chamar a atenção para uma conversa entre Emílio Odebrecht e Lula no Palácio do Planalto, que ele teria testemunhado. Falou que Lula e Dilma tinham uma conta secreta no exterior de R$ 300 milhões à disposição para movimentar as campanhas do PT. Para impressionar os procuradores, sacou da sua fértil imaginação uma frase de efeito que virou as manchetes dos jornais: “Pacto de Sangue”. Isso mesmo, foi assim que ele denominou o acordo diabólico entre a Odebrecht propineira e Lula.

Aliás, a delação premiada no Brasil virou um bom negócio. Manda de volta para suas mansões aqueles que encheram os bolsos com os milhões de reais roubados das empresas públicas e permite que eles vivam cercados de mordomos usufruindo do dinheiro que surrupiaram. Difundiu-se entre os envolvidos na Lava Jato que bastava soltar alguns nomes importantes para receber os benefícios do MP. Assim, muitos fizeram delações seletivas e foram gozar dos prazeres que o dinheiro roubado lhes proporcionam.

No caso do Palocci a coisa é ainda mais séria, pois nada do que ele disse virou pista para recuperar os bilhões roubados ou serviu para aprofundar as investigações em torno dos nomes revelados por ele na delação. O Lula está preso pelo apartamento duplex do Guarujá e condenado pelo sítio de Atibaia. Dilma continua solta, intocável. E o mais terrível de todos os empresários, Emílio, o homem do pacto de sangue, continua dando as cartas na Odebrecht.

A delação premiada, na verdade, virou um passe livre para tirar da cadeia os espertos. Advogados renomados e astutos desses clientes endinheirados vão enrolando os procuradores igualzinho o Rolando Lero, aquele personagem do Chico Anísio, que leva o professor no papo logo no início da conversa: “Amado mestre…”

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