Jorge Oliveira
Rafina, Grécial – Quando Lula soube que o Palocci iria
fazer delação premiada, saiu-se com essa: “O Palocci é muito esperto vai dar um
nó nesses caras”, referindo-se aos procuradores do Ministério Público que
investigam a Lava Jato. Não deu outra. Condenado a doze anos de prisão, o
ex-ministro da Fazenda cumpriu apenas dois. O ano passado voltou para casa para
administrar os R$ 45 milhões que restaram do seu patrimônio.
A Lava Jato descobriu que Palocci e seus familiares
ocultavam bens no valor de R$ 80 milhões. Como ele foi condenado a pagar R$ 35
milhões de multa restaram, portanto, R$ 45 milhões para uma vida confortável
até o final de seus dias. O crime compensa? Compensa, sim, para aqueles que
como Palocci saquearam os cofres públicos e hoje estão soltos. Eles viram na
delação premiada o caminho mais curto para deixar a cadeia, mesmo que não
sustentem boa parte das acusações que fazem diante dos procuradores da Lava Jato,
prova disso é que nenhum dos nomes apontados por Palocci foi condenado até
hoje.
Palocci é um caso clássico de um beneficiário dessas
benesses que a justiça oferece àqueles que se arrependem e topam puxar o fio do
novelo para que se chegue aos chefes da máfia. A deleção premiada existe em
vários países do mundo. Ela é usada para que a justiça identifique os cabeças
do crime oferecendo o benefício da pena aos que cometem delitos menores.
Mas, aqui, no Brasil, a deleção foi desvirtuada: os
pequenos estão na cadeia e os criminosos poderosos estão em casa. Chamar-se-ia
isso de “deleção à brasileira”, única no mundo, com suas peculiaridades
tupiniquins. No afã de mostrar serviço ou responder ao clamor da sociedade,
alguns procuradores se perderam no meio do caminho. Outros, de alguma forma,
movidos pela vaidade excessiva, deixaram-se ser atraídos, como mariposas, pelos
refletores.
Assim, para atender o clamor das ruas, o MP judicializou a
política como se a política estivesse desassociada da sociedade, como uma coisa
imprestável, perversa, que devesse ser varrida do mapa por estar contaminada
por representantes carcomidos pela corrupção.
Dessa forma, os procuradores deixaram os autos processuais
de lado para se pronunciarem politicamente, apresentando-se como os paladinos
de uma sociedade que clama por justiça. Foram complacentes com os corruptores,
os grandes empresários, e generalizaram os políticos e a política, renegando-os
como filhos malditos como se a política não fosse intrínseca à arte de
governar, de administrar, na sua essência.
Esqueceram de apurar a corrupção quando ela bateu à porta
da própria Procuradoria-Geral da República e envolveu auxiliares próximos de
Rodrigo Janot, a exemplo dos procuradores Ângelo Goulart Villela e Marcelo
Miller, cuja denúncia caiu no esquecimento. Faltou vassoura para varrer a
sujeira para fora.
Aos poucos, gente importante, condenada na Lava Jato, foi
deixando a cadeia mais cedo do que os políticos, como se a balança da Justiça
pendesse apenas para um lado. Nessa esteira do perdão e da benevolência,
Palocci é um caso que chama a atenção. Suas delações até hoje não levaram
ninguém à prisão.
Uma de suas revelações tão esperada seria a do esquema dos
bancos na engrenagem da corrupção, como colaboradores do PT em todas as
campanhas. Iria colocar sobre a mesa, enfim, a máfia financeira e apontar os
banqueiros envolvidos na patifaria. Bazófia pura. Mais uma vez levou os
procuradores na conversa. Pelo menos, que se saiba, até agora nada aconteceu. E
se revelou, as informações estão sob sigilo.
Palocci sabe mais do que disse até agora. Ele foi o Capo di
tutti capi do partido desde que foi prefeito de Ribeirão Preto, onde deixou um
imenso rastro de corrupção. Mesmo assim, assumiu todos os cargos relevantes do
governo e manteve com ele a chave do cofre para promover os negócios escusos.
Espertamente, ao fazer as delações, concentrou-se em vazar algumas historinhas
do Lula e da Dilma, nada que os comprometessem mais do que já estavam
comprometidos. Fez da sua desfiliação partidária um estardalhaço danado para
mostrar que a partir dali ele seria o homem mau do PT.
Em um dos seus depoimentos, Palocci tentou chamar a atenção
para uma conversa entre Emílio Odebrecht e Lula no Palácio do Planalto, que ele
teria testemunhado. Falou que Lula e Dilma tinham uma conta secreta no exterior
de R$ 300 milhões à disposição para movimentar as campanhas do PT. Para
impressionar os procuradores, sacou da sua fértil imaginação uma frase de
efeito que virou as manchetes dos jornais: “Pacto de Sangue”. Isso mesmo, foi
assim que ele denominou o acordo diabólico entre a Odebrecht propineira e Lula.
Aliás, a delação premiada no Brasil virou um bom negócio.
Manda de volta para suas mansões aqueles que encheram os bolsos com os milhões
de reais roubados das empresas públicas e permite que eles vivam cercados de
mordomos usufruindo do dinheiro que surrupiaram. Difundiu-se entre os
envolvidos na Lava Jato que bastava soltar alguns nomes importantes para
receber os benefícios do MP. Assim, muitos fizeram delações seletivas e foram
gozar dos prazeres que o dinheiro roubado lhes proporcionam.
No caso do Palocci a coisa é ainda mais séria, pois nada do
que ele disse virou pista para recuperar os bilhões roubados ou serviu para
aprofundar as investigações em torno dos nomes revelados por ele na delação. O
Lula está preso pelo apartamento duplex do Guarujá e condenado pelo sítio de
Atibaia. Dilma continua solta, intocável. E o mais terrível de todos os
empresários, Emílio, o homem do pacto de sangue, continua dando as cartas na
Odebrecht.
A delação premiada, na verdade, virou um passe livre para
tirar da cadeia os espertos. Advogados renomados e astutos desses clientes
endinheirados vão enrolando os procuradores igualzinho o Rolando Lero, aquele
personagem do Chico Anísio, que leva o professor no papo logo no início da
conversa: “Amado mestre…”
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