Quem vai pagar pelo desastre de Mariana?
RIBAMAR FONSECA
Jornalista e escritor
Os responsáveis pelo desastre ambiental em Mariana, Minas Gerais, continuam palitando os dentes em suas confortáveis residências, enquanto as milhares de famílias prejudicadas lutam para sobreviver, sem água, sem casa e sem ter de onde tirar o seu sustento. A lama tóxica que desceu pelo rio Doce até o mar, espalhando destruição e morte à sua passagem, não sepultou apenas casas, pessoas e animais: acabou com a vida naquele rio e, também, com a história e os sonhos da gente humilde que vivia às suas margens. Não há dinheiro no mundo que pague o prejuízo causado principalmente à natureza, que precisará de décadas para se recuperar, mas a empresa Samarco, subsidiária da Vale, até agora foi punida apenas com uma multa de R$ 250 milhões, uma piada, considerando os bilhões de dólares de lucros que arrecada todos os anos. Se multa realmente punisse não haveria desmatamento nem infrações de trânsito.
Na verdade, no cerne dessa tragédia está a privatização da
Vale, no governo de Fernando Henrique Cardoso que, sem nenhuma justificativa,
entregou ao capital estrangeiro as riquezas do nosso subsolo, toda a estrutura
da empresa, inclusive as ferrovias, sem obrigá-la a desenvolver tecnologias
necessárias à proteção da natureza e da população em suas áreas de atuação,
deixando a exploração do minério brasileiro à mercê dos seus interesses nos
lucros. "A mineração brasileira é feita com base em tecnologia primária,
da forma mais arcaica possível, como no século passado", disse o deputado
Rogério Correa, do PT de Minas, ao denunciar as atividades predatórias da
Samarco. E acrescentou: "A privatização da Vale deixou o país sem nenhuma
estratégia nacional de exploração mineral".
Em outros países, segundo o parlamentar, desenvolveu-se
técnicas de mineração a seco ou com filtros, que eliminaram os lagos de
rejeitos. E a pouca água utilizada é tratada e devolvida limpa à natureza, o
que afastou os riscos de acidentes como o que aconteceu em Mariana. Rogério
disse ainda que a situação em Minas se agravou devido à negligência dos
governos tucanos com relação à exploração de minérios, informando que nesse
período foram expedidos alvarás para mineração no Estado sem nenhum controle. E
mais: denunciou que esta foi a quinta barragem que se rompeu, pois no governo
de Aécio Neves ocorreram mais quatro rompimentos – nos municípios de Itabirito,
Cataguases, Espera Feliz e Miraí – que não chegaram a ser divulgados devido a
cumplicidade da mídia com o silêncio imposto pelo hoje senador presidente do
PSDB. Isso talvez explique o silêncio dele diante da tragédia em seu Estado.
A julgar pela timidez das ações destinadas a punir a
Samarco/Vale pelo crime ambiental, as autoridades brasileiras ainda não se
deram conta do tamanho do desastre. Além de 12 mortos e 11 desaparecidos,
comunidades inteiras destruídas, famílias destroçadas e a matança da vida
animal dentro do rio e às suas margens, a natureza sofreu um duro golpe numa
extensão de cerca de 700 quilômetros em dois Estados. E o mar, para onde a lama
tóxica se dirigiu, foi transformado mais uma vez em penico. Quem vai pagar por
isso? Os responsáveis na Vale e na Samarco vão continuar palitando os dentes e
contabilizando seus lucros, enquanto milhares de brasileiros sofrem a perda de
tudo e mais de 20 famílias choram seus mortos? Será que esse crime não é maior
do que os homicídios ou roubo de dinheiro público? E por que os responsáveis
ainda não estão na cadeia?
Além de todos esses problemas, o perigo de novos rompimentos
continua rondando as 663 barragens de dejetos existentes no Brasil, porque ao
invés de discutir se há risco ou não em determinados lugares, o que os
controladores da mineradora deveriam fazer era reforçar todas as barragens,
independente de haver ou não ameaça de rompimento, antes de um novo desastre. E
os legisladores, por sua vez, deveriam estar mais preocupados em elaborar nova
legislação, mais rigorosa, para obrigar os exploradores de nossas riquezas a
serem mais cuidadosos na segurança dos brasileiros que moram às proximidades da
mineração. O senador mineiro Aécio Neves, por exemplo, ao invés de usar o seu
mandato para fazer intrigas e tentar derrubar um governo legitimamente eleito,
deveria ser o primeiro a empenhar-se em aperfeiçoar a legislação, de modo a
oferecer maior segurança aos seus conterrâneos. Até agora, porém, infelizmente
ele tem se mostrado indiferente ao drama dos seus patrícios.
O governo, por sua vez, precisa ser mais rigoroso na punição
dos responsáveis pelo desastre ambiental, para que o mineiro do interior não
venha a sofrer novamente com o descaso das mineradoras, interessadas, única e
exclusivamente, nos lucros. Afinal, no momento em que até senador e banqueiro
são presos no combate à corrupção, dentro do processo de higienização do país,
por que a complacência com os poderosos donos das mineradoras? Onde estão os
promotores? Onde está a Justiça?
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