Carlos Chagas
De 1715 a 1723, depois da morte de Luís XIV, a França foi
governada por um Regente, tio de Luís XV, ainda uma criança.
Jovem afoito e estouvado, chegou a Paris François Marie
Arouet, para tornar-se um dos principais críticos dos costumes da realeza e do
clero. Apelidava-se de Voltaire.
O Regente vira-se obrigado a intenso programa de
contenção de gastos e despesas, determinando, entre outras medidas, que se
vendesse a metade das cavalariças reais.
Voltaire escreveu logo depois que melhor faria o Regente
se em vez das centenas de cavalos de raça, vendesse o monte de asnos que
evoluíam em torno do trono.
Num domingo, passeando pelo Bois de Boulogne, o Regente
deparou-se com Voltaire. Cumprimentando-o, disse que daria a Monsieur Arouet a
oportunidade de apreciar uma das mais bizarras vistas de Paris, que ele
certamente não conhecia.
Logo vieram os soldados e levaram Voltaire para a prisão
da Bastilha, onde ficou por quase um ano. Tinha liberdade para escrever, e lá
completou a peça “Édipo”, de amplo sucesso na capital francesa por conta das
alusões a tiranos, fidalgos e sacerdotes.
Amigos influentes conseguiram que o Regente revogasse a
prisão e fizesse mais, assinando decreto que concedia ao jovem autor uma pensão
vitalícia “para que enfrentasse as despesas com habitação e alimentação”.
De volta, Voltaire escreveu que aceitava a oferta, mas
apenas pela metade. Agradecia que o tesouro real cuidasse de sua alimentação,
mas quanto à sua habitação, deixasse que ele mesmo cuidaria…
Nova ordem de prisão foi expedida, mas o Regente tratou
de negociar: soltaria Voltaire se ele embarcasse imediatamente para a
Inglaterra, o que aconteceu. Ficou proibido de frequentar Paris, o que só fez
aos noventa anos de idade.
Esse episódio é pinçado da larga biografia do irreverente
gênio da literatura francesa, a propósito das dificuldades que o nosso Regente,
versão 2016, vem enfrentando. Seria
melhor que oferecesse para seus desafetos uma visão de Brasília, tomada da
Papuda. Depois, uma sinecura qualquer para que ninguém recomendasse dever livrar-se
dos asnos que evoluem no palácio do Planalto...
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Este blog só aceita comentários ou críticas que não ofendam a dignidade das pessoas.