Dom José Alberto Moura
Arcebispo Metropolitano de Montes Claros
Diz o livro do Eclesiastes: “Tudo é vaidade... um homem que
trabalhou com inteligência, competência e sucesso vê-se obrigado a deixar tudo
em herança a outro que em nada colaborou” (Eclesiastes 1,2.21). O que diríamos
mais ainda de quem rouba, aproveitando-se de cargos públicos, acumula fortunas
em imóveis, jóias, dinheiro até em bancos de outros países! Muitos não pensam
que vão morrer. No mínimo, quem tem altivez de caráter, gostaria de ser
lembrado como gente do bem, de ética, de moral, de honestidade e de trabalho
intenso pelo bem comum, sem lesar o público, principalmente o mais carente. Até
os herdeiros de fortuna e qualquer dinheiro desonesto deveriam ter a grandeza
moral de restituir o que sabe desse legado podre. A justiça deveria fazer o
seqüestro do dinheiro roubado.
A formação do caráter para o respeito ao outro e ao que lhe
pertence deveria ser regra de ouro das famílias, das escolas e dos meios de
comunicação. O rito dos processos judiciários deveria dar sim, o direito de
defesa, mas com limites. Atualmente os recursos são quase infinitos. Quem sofre
injustiça é ainda mais injustiçado com a demora do veredicto judicial.
Dentro da realidade dos extremos de riqueza e pobreza, em
que uns têm demais e grandes parcelas têm de menos, é muito importante a
formação para o cultivo da simplicidade. Isso exige vida menos luxuosa de elites,
que quase não pagam impostos em comparação com os assalariados. A hipoteca
social da riqueza deveria incluir a exigência de mais tributos por parte de
quem recebe muito em relação à maioria.
Abusos de salários e aposentadorias de determinados grupos privilegiados
de vários poderes gritam por justiça.
Quem assume a vida com valores transcendentes deveria olhar
para o objetivo da mesma. Em agradecimento ao Criador pelo dom da vida e pelas
oportunidades de realizar o bem da comunidade, tais pessoas poderiam contribuir
mais com uma convivência de promoção real da inclusão social dos mais
fragilizados. A recompensa virá, não somente de Deus na eternidade, mas também
já na terra, com sua respeitabilidade e reconhecimento de seu bom exemplo. A
vida vale e recompensa por si mesma quando se usam os talentos para o serviço
ao semelhante.
Nada é mais seguro na vida do que realizar o bem ao outro
por causa daquele que nos criou para isso. As seguranças terrenas são
importantes, mas não são objetivo de vida. São instrumentos a serem bem usados.
Distorcidos, corrompem o coração, a mente e o convívio social. Assim são as
coisas materiais, os prazeres e o poder. Tudo tem seus valores e suas normas
objetivas. Se as normas forem apenas o desejo pessoal e os instintos, ficamos
no chão da vida sem olhar para o objetivo mais elevado. A natureza criada por
Deus já o revela. O que dirá o Filho de Deus (Cf.
Colossenses 3,1-2)! Ele não tinha nem onde reclinar a cabeça. Deu tudo de si,
mostrando que a vida vale para darmos vida de sentido aos outros!
Jesus lembra que a ganância não realiza a pessoa humana. A
felicidade não está na abundância de bens. Ele narra a estória de um homem que
fez grande armazenamento do que colheu da plantação, pensando que ia ter vida
cômoda por muitos anos. Mas, de repente, morreu e não usufruiu do que acumulou
(Cf. Lucas 12,13-21). Quem mais tem coisas e exagerado bem estar materiais, em
geral não se contenta com o que tem. Muitos não têm paz na vida, preocupados em
administrar suas riquezas materiais. Outros têm pouco e são felizes por
realizarem o bem. É justo ter o necessário para se viver dignamente e fazer o
bem, mesmo tendo bastante, para servir a comunidade. Os bens sem hipoteca
social são ilusão e vaidade inútil.
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